No depoimento prestado à força-tarefa da Lava-Jato, o ex-presidente do Conselho de Administração da OSX Eike Batista disse ter feito um depósito de US$ 2,3 milhões (ou R$ 5 milhões pelo câmbio da época) no exterior para as contas do marqueteiro João Santana e da mulher dele Monica Moura, em atenção ao espírito democrático. “Eu fazia isso constantemente como um brasileiro que achava que essa era minha contribuição política, (para) que a democracia flua e continue” — afirmou o empresário.
No depoimento, Eike disse ter realizado o pagamento a pedido do então ministro da Fazenda e presidente do Conselho de Administração da Petrobras, Guido Mantega. Durante uma de suas visitas a Brasília, Eike ouviu do então ministro que precisava de uma contribuição de R$ 5 milhões para o partido.
PEDIDO DO MINISTRO — “Quando você tem projetos desse vulto (e recebe) um pedido do ministro, como é que faz? Eu costumava participar (contribuindo com campanhas), mas nesse ano eu não havia contribuído nada. Era final de 2012, pós-campanha (…) Ele falou que havia débitos de campanhas, perguntou se eu queria colaborar” — disse Eike, repetindo narrativa feita por Monica Moura à Lava-Jato em tentativa de delação que foi recusada.
Ele assumiu o pagamento em depoimento espontâneo prestado à Lava-Jato no dia 20 de maio deste ano, 25 dias depois de ter sido procurado pela primeira vez pelo Globo para esclarecer revelação feita por Mônica Moura à Lava-Jato sobre pagamentos realizados por ele no exterior, durante tentativa de delação premiada.
“Não queria que uma (publicação na) mídia, errada, proporcionasse dificuldades para minha pessoa” — disse o empresário aos procuradores, ao explicar por que os procurava naquela ocasião. A reportagem foi publicada na mesma época.
ADVOGADO OPEROU – Um dos responsáveis pelo depoimento, o procurador federal Roberson Pozzobon, perguntou a que campanha o pagamento serviria, mas Eike informou não saber especificar. O empresário afirmou que ia esporadicamente a Brasília falar sobre seus projetos:
“Eu sempre ia visitar vários ministros para amostrar como estava o andamento dos projetos do grupo. (…) Me foi feito o pedido de contribuir para contas de campanha que já tinha terminado, num valor total de R$ 5 milhões. Não sei se foi no dia ou na semana seguinte, a Monica (Moura) procurou a empresa, não diretamente a mim” – afirmou, mencionando o advogado da OSX Flávio Godim como o responsável por “instrumentalizar a operação”.
Eike disse ter sido responsável por assinar a autorização para que uma de suas empresas no exterior, a Golden Rock, realizasse um pagamento diretamente para a empresa Polis, de João Santana e Monica Moura, em dezembro de 2012. No entanto, o pagamento voltou para sua conta.
CONTRATO FORJADO – A solução foi forjar um contrato no início do ano seguinte com a Shelbill, offshore do casal Santana, para viabilizar a transferência de US$ 2,3 milhões. O valor é equivalente aos R$ 5 milhões solicitados por Mantega.
Embora tenha associado o pagamento ao casal Santana a um pedido do então ministro da Fazenda a título de colaboração eleitoral, Eike afirmou aos Ministério Público Federal (MPF) que esperava que o publicitário prestasse algum serviço às suas empresas.
“Eu queria uma prestação de serviço para fazer esse pagamento. Eu não ia fazer uma simples doação. Eu queria algo em troca, que pudesse usar nos meus trabalhos” – disse o empresário, mencionando o bom relacionamento de João Santana com o governo da Venezuela e Angola, por exemplo, áreas onde afirma que tinha interesse em atuar. “Ele poderia me mostrar se valia à pena fazer investimentos nesses países. (…) Entendo que a empresa deles poderia ter expertise pelo nível de relacionamento com esses governos” – completou Eike.
RELATÓRIO – Depois que começaram a ter suas contas no exterior investigadas na Lava-Jato, o casal Santana chegou a encaminhar a Eike um relatório de atividades supostamente desenvolvidas por eles para o grupo EBX. O documento traz análises de conjuntura na Venezuela e em Angola e um estudo de marca do grupo para eventual atuação em países da África e da América do Sul.
– Se você ver o relatório, não vale o que paguei. Mas tem informação importante – afirmou o empresário, que entregou o documento aos investigadores.
Eike disse à força-tarefa que esta teria sido a única ocasião em que Mantega teria lhe solicitado recursos para o PT, e que não recebeu qualquer ameaça do então ministro. “Ele não fez ameaças, isso nunca existiu. Ele não tinha o que me dar. O capital era meu” – afirmou.
SEM PROPINAS – O empresário negou ter pagado propina em contratos da Petrobras: “Eu era carta fora do baralho (…) Era um cartel e o Eike Batista que trazia empresas estrangeiras e tinha capital próprio não se encaixava nesse clube. Eu não era parte nesse clube” – argumentou.
Em nota divulgada na tarde de quinta-feira, os advogados Ary Bergher, Raphael Mattos e Darwin Corrêa negaram haver qualquer relação entre o pagamento ao casal Santana e contratos na Petrobras. “Essa doação eleitoral não teve qualquer relação nem foi dada como contrapartida de qualquer negócio envolvendo a empresa OSX no âmbito do chamado Consórcio Integra ou qualquer outro. São fatos absolutamente desconexos”, afirma o texto dos advogados de Eike.
23 de setembro de 2016
Thiago Herdy
O Globo
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