A estreia de Michel Temer na política internacional é uma obra em três atos: a reunião do G-20, a Assembleia Geral das Nações Unidas e uma visita à Argentina, daqui a dez dias. Ao fim do périplo, o governo terá encerrado a longa transição.
Claro e direto, o discurso de Temer na ONU reafirmou pautas tradicionais da diplomacia brasileira, algumas das quais defendidas com vigor pelo PT. Da necessidade de compensar os perdedores da globalização à reforma do Conselho de Segurança, ele passou em revista toda a agenda diplomática.
Em seu melhor momento, o presidente bateu forte contra as mensagens do candidato republicano Donald Trump: Temer celebrou a abertura americana para Cuba, comemorou o acordo nuclear com o Irã, aplaudiu compromissos formais sobre mudança do clima, denunciou a xenofobia e a proliferação nuclear. Na sequência, encontrou-se com o vice de Obama.
As diferenças com o PT ficaram claras. Ao prometer uma "diplomacia com os pés no chão", Temer marcou distância do que vê como exuberância irresponsável na diplomacia petista. Naquele dia, sua imagem no púlpito da ONU contrastou com a de Lula na Lava Jato e a de Dilma na campanha municipal de Jandira Feghali.
Antes de Temer discursar, Venezuela, Equador e Nicarágua saíram do plenário. Tendo em vista o autoritarismo cleptocrata de seus presidentes, muitos acharam que o gesto depôs a favor do governo brasileiro. Costa Rica também saiu, mas sua chancelaria soltou nota minimizando o ocorrido.
Em Nova York, Temer ouviu seu colega uruguaio pedir a restauração das boas relações, depois da fricção. O presidente de Portugal afirmou que a Comunidade de Países de Língua Portuguesa quer um novo capítulo com o Brasil, tamanha a irritação com o tratamento dispensado ao grupo por Dilma.
A visita de Temer à ONU também teve silêncios. Na expectativa de baixar o fogo, ele nada disse sobre a situação na Venezuela. E, para perplexidade geral, o presidente nem sequer mencionou a palavra "corrupção", tema que chacoalha com vigor a sociedade que ele representa.
Sobre a crise global dos refugiados, não propôs nada. Pelo contrário, apresentou números inflados de quanta gente recebemos. A pedalada estatística é uma herança do governo Dilma, quando se fez uma gambiarra jurídica para receber milhares de haitianos sem violar a legislação sobre a matéria. Temer poderia ter dito que seu próprio líder no Senado apresentou um projeto de lei que, com apoio das principais organizações de direitos humanos, promete começar a modernizar o tratamento da questão. Buenos Aires é a próxima parada.
23 de setembro de 2016
Matias Spektor, Folha de SP
Claro e direto, o discurso de Temer na ONU reafirmou pautas tradicionais da diplomacia brasileira, algumas das quais defendidas com vigor pelo PT. Da necessidade de compensar os perdedores da globalização à reforma do Conselho de Segurança, ele passou em revista toda a agenda diplomática.
Em seu melhor momento, o presidente bateu forte contra as mensagens do candidato republicano Donald Trump: Temer celebrou a abertura americana para Cuba, comemorou o acordo nuclear com o Irã, aplaudiu compromissos formais sobre mudança do clima, denunciou a xenofobia e a proliferação nuclear. Na sequência, encontrou-se com o vice de Obama.
As diferenças com o PT ficaram claras. Ao prometer uma "diplomacia com os pés no chão", Temer marcou distância do que vê como exuberância irresponsável na diplomacia petista. Naquele dia, sua imagem no púlpito da ONU contrastou com a de Lula na Lava Jato e a de Dilma na campanha municipal de Jandira Feghali.
Antes de Temer discursar, Venezuela, Equador e Nicarágua saíram do plenário. Tendo em vista o autoritarismo cleptocrata de seus presidentes, muitos acharam que o gesto depôs a favor do governo brasileiro. Costa Rica também saiu, mas sua chancelaria soltou nota minimizando o ocorrido.
Em Nova York, Temer ouviu seu colega uruguaio pedir a restauração das boas relações, depois da fricção. O presidente de Portugal afirmou que a Comunidade de Países de Língua Portuguesa quer um novo capítulo com o Brasil, tamanha a irritação com o tratamento dispensado ao grupo por Dilma.
A visita de Temer à ONU também teve silêncios. Na expectativa de baixar o fogo, ele nada disse sobre a situação na Venezuela. E, para perplexidade geral, o presidente nem sequer mencionou a palavra "corrupção", tema que chacoalha com vigor a sociedade que ele representa.
Sobre a crise global dos refugiados, não propôs nada. Pelo contrário, apresentou números inflados de quanta gente recebemos. A pedalada estatística é uma herança do governo Dilma, quando se fez uma gambiarra jurídica para receber milhares de haitianos sem violar a legislação sobre a matéria. Temer poderia ter dito que seu próprio líder no Senado apresentou um projeto de lei que, com apoio das principais organizações de direitos humanos, promete começar a modernizar o tratamento da questão. Buenos Aires é a próxima parada.
23 de setembro de 2016
Matias Spektor, Folha de SP
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