A passagem da comitiva brasileira que acompanhou a 1ª participação do presidente Temer na abertura da Assembleia Geral da ONU em NY deixou boas impressões nos investidores, mas ainda falta o novo governo mostrar capacidade política e de organização para implementar seus programas de privatização e controle de gastos.
Temer, por sinal, foi quem mais surpreendeu positivamente, com posições firmes a respeito de temas polêmicos, como a capacidade de aprovar no Congresso as reformas estruturais que darão o norte do novo governo, como controle dos gastos.
Mas ficou ainda a sensação de que a realidade brasiliense pode ser mais forte do que as palavras e boas intenções do novo governo. As imprecisões e falhas de organização continuaram sendo marcas brasileiras. Nas reuniões sobre parcerias para infraestrutura, coordenadas pelo secretário Moreira Franco, que aconteceram em três grupos de 40 patrocinadas por Bank of America, Goldman Sachs e Citi, no Hotel Plaza Athénée, ficou a boa impressão, uma “excelente manifestação de novas intenções e princípios no nível da microeconomia”, na definição de um dos presentes.
Moreira Franco foi muito claro na autocrítica sobre erros passados, tanto do ponto de vista ideológico quanto processual. A reunião, contudo, foi pouco eficaz na opinião geral, porque deveria ter sido estruturada no nível “macro” com ministros, e outra mais específica com executivos do governo que conhecem (ou, pelo menos, deveriam conhecer) o tema.
A organização foi frágil porque, apesar do envolvimento dos bancos americanos, toda a orquestração ficou por conta de Apex e Brain (organização patrocinada pela Bovespa). Tudo funcionou, “ou não funcionou”, ao estilo brasileiro, a começar que nenhum dos três ministros fala inglês: além de Moreira Franco, participaram das reuniões o ministro das Minas e Energia, Fernando Bezerra, e o de Transportes, Mauricio Quintella.
Todos demonstraram conhecer a carta de princípios, mas pouco sobre a execução. Mesmo no nível de princípios há vícios do Estado brasileiro, segundo investidores — extrema dependência de Banco do Brasil, Caixa e BNDES —; falta de time competente de executivos para operacionalizar tudo e, principalmente, superficialidade e fragilidade quanto a financiamento.
Os investidores, ainda traumatizados com experiências nos governos petistas, tinham grande questão do ponto de vista de credibilidade, especialmente em infraestrutura, investimentos de longuíssimo prazo: qual a garantia de que em 2018 não volte Lula ou outro ideólogo de esquerda e repita o que Dilma fez com investimentos como energia, rodovias etc.
Esta, porém, é garantia que nenhum governo democrático pode dar, ou deve dar. Mas algumas mudanças que mostrem um novo caminho foram colocadas. É preciso nova estrutura de órgãos reguladores, com compromissos que sejam independentes do governo incumbente, segurança jurídica e política.
Apesar das ressalvas, a maioria considerou bom início, mas ficou a sensação de que precisam chegar de forma mais profissional e convincente. A reunião de Temer e ministros com 400 líderes, no hotel St. Regis, foi organizada por Council of the Americas e Brazilian Chamber of Commerce. Temer falou de improviso por 20 minutos. Foi preciso, assertivo, firme no que se refere à agenda econômica e de comércio internacional, na avaliação geral, deixando impressão “muito boa”.
Apesar disso, ficou em aberto o compromisso de Temer com a nova ordem ética do Brasil. Os investidores não parecem muito confiantes de que Temer e o PMDB representem garantia de que o esquema de corrupção encontrado pela Lava-Jato não vá continuar. Por isso Temer teve de apagar incêndio, desautorizando seu ministro Geddel Vieira Lima, que havia dado declaração a favor da anistia para os políticos que usaram caixa 2 em campanha, alegando que “não é crime”.
O ministro Meirelles foi o único que falou em inglês (além do chanceler José Serra) e agradou, como esperado: firme, claro, otimista quanto à aprovação das reformas no Congresso. Transmitiu muita credibilidade. Mas persiste a dúvida se Temer terá a mesma coragem em Brasília, e conseguirá fazer algo para mudar os trejeitos da capital, na definição de um participante, e do time do senador Renan Calheiros, a grande incógnita para os investidores após suas investidas contra a LavaJato, embora sub-reptícias e cheias de dubiedades.
Mesmo porque, apesar de todas as garantias que Temer deu sobre a aprovação da PEC de controle de gastos, diversos partidos da base já começam a se mexer para fazer alterações. E muitos relutam em fechar questão em torno do projeto do governo.
23 de setembro dee 2016
Merval Pereira, O Globo
Temer, por sinal, foi quem mais surpreendeu positivamente, com posições firmes a respeito de temas polêmicos, como a capacidade de aprovar no Congresso as reformas estruturais que darão o norte do novo governo, como controle dos gastos.
Mas ficou ainda a sensação de que a realidade brasiliense pode ser mais forte do que as palavras e boas intenções do novo governo. As imprecisões e falhas de organização continuaram sendo marcas brasileiras. Nas reuniões sobre parcerias para infraestrutura, coordenadas pelo secretário Moreira Franco, que aconteceram em três grupos de 40 patrocinadas por Bank of America, Goldman Sachs e Citi, no Hotel Plaza Athénée, ficou a boa impressão, uma “excelente manifestação de novas intenções e princípios no nível da microeconomia”, na definição de um dos presentes.
Moreira Franco foi muito claro na autocrítica sobre erros passados, tanto do ponto de vista ideológico quanto processual. A reunião, contudo, foi pouco eficaz na opinião geral, porque deveria ter sido estruturada no nível “macro” com ministros, e outra mais específica com executivos do governo que conhecem (ou, pelo menos, deveriam conhecer) o tema.
A organização foi frágil porque, apesar do envolvimento dos bancos americanos, toda a orquestração ficou por conta de Apex e Brain (organização patrocinada pela Bovespa). Tudo funcionou, “ou não funcionou”, ao estilo brasileiro, a começar que nenhum dos três ministros fala inglês: além de Moreira Franco, participaram das reuniões o ministro das Minas e Energia, Fernando Bezerra, e o de Transportes, Mauricio Quintella.
Todos demonstraram conhecer a carta de princípios, mas pouco sobre a execução. Mesmo no nível de princípios há vícios do Estado brasileiro, segundo investidores — extrema dependência de Banco do Brasil, Caixa e BNDES —; falta de time competente de executivos para operacionalizar tudo e, principalmente, superficialidade e fragilidade quanto a financiamento.
Os investidores, ainda traumatizados com experiências nos governos petistas, tinham grande questão do ponto de vista de credibilidade, especialmente em infraestrutura, investimentos de longuíssimo prazo: qual a garantia de que em 2018 não volte Lula ou outro ideólogo de esquerda e repita o que Dilma fez com investimentos como energia, rodovias etc.
Esta, porém, é garantia que nenhum governo democrático pode dar, ou deve dar. Mas algumas mudanças que mostrem um novo caminho foram colocadas. É preciso nova estrutura de órgãos reguladores, com compromissos que sejam independentes do governo incumbente, segurança jurídica e política.
Apesar das ressalvas, a maioria considerou bom início, mas ficou a sensação de que precisam chegar de forma mais profissional e convincente. A reunião de Temer e ministros com 400 líderes, no hotel St. Regis, foi organizada por Council of the Americas e Brazilian Chamber of Commerce. Temer falou de improviso por 20 minutos. Foi preciso, assertivo, firme no que se refere à agenda econômica e de comércio internacional, na avaliação geral, deixando impressão “muito boa”.
Apesar disso, ficou em aberto o compromisso de Temer com a nova ordem ética do Brasil. Os investidores não parecem muito confiantes de que Temer e o PMDB representem garantia de que o esquema de corrupção encontrado pela Lava-Jato não vá continuar. Por isso Temer teve de apagar incêndio, desautorizando seu ministro Geddel Vieira Lima, que havia dado declaração a favor da anistia para os políticos que usaram caixa 2 em campanha, alegando que “não é crime”.
O ministro Meirelles foi o único que falou em inglês (além do chanceler José Serra) e agradou, como esperado: firme, claro, otimista quanto à aprovação das reformas no Congresso. Transmitiu muita credibilidade. Mas persiste a dúvida se Temer terá a mesma coragem em Brasília, e conseguirá fazer algo para mudar os trejeitos da capital, na definição de um participante, e do time do senador Renan Calheiros, a grande incógnita para os investidores após suas investidas contra a LavaJato, embora sub-reptícias e cheias de dubiedades.
Mesmo porque, apesar de todas as garantias que Temer deu sobre a aprovação da PEC de controle de gastos, diversos partidos da base já começam a se mexer para fazer alterações. E muitos relutam em fechar questão em torno do projeto do governo.
23 de setembro dee 2016
Merval Pereira, O Globo
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