Padilha demitiu Osório em maio, mas Temer recuou |
A poeira vai baixando, os jornalistas de Brasília começam a perceber que vinham sendo usados pela Casa Civil numa campanha difamatória para denegrir o então ministro Fábio Medina Osório, chefe da Advocacia-Geral da União (AGU) e a verdade dos fatos vai surgindo progressivamente. Já se sabe que Fábio Medina Osório, considerado o maior especialista do país em improbidade administrativa e leis sobre corrupção, chegou ao Ministério após brilhante atuação em defesa do impeachment na Comissão do Senado. E sua nomeação teve a finalidade de dar a entender que o governo de Michel Temer iria apoiar integralmente a Lava Jato, mas as aparências quase sempre nos enganam.
COBRANDO r$ 12 MILHÕES – Os problemas de Medina Osório com o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, começaram no dia 30 de maio, quando o jornalista André de Souza, de O Globo, noticiou que a AGU estava ingressando na Justiça Federal com duas ações de improbidade administrativa, para cobrar cerca de R$ 12 bilhões de empresas e pessoas investigadas na Lava-Jato.
Entre os alvos da AGU estão dez empreiteiras, como Odebrecht, OAS, UTC, Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, o doleiro Alberto Youssef, executivos e ex-diretores da Petrobras.
ATUAÇÃO DE OFÍCIO – As ações movidas pela AGU eram fruto de trabalho conjunto com a Procuradoria-Geral da República, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, a Receita Federal e o Tribunal de Contas da União. O ministro Medina Osório não informara a Presidência, por se tratar de cumprimento de obrigação funcional da AGU, não havia qualquer envolvimento político ou administrativo. Mas o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, não entendeu assim e decidiu demitir Fábio Medina Osório.
Imediatamente Padilha informou ao jornalista Jorge Bastos Moreno, de O Globo, que o presidente Temer decidira demitir Medina Osório, sob justificativa de que dera uma “carteirada” num jatinho da FAB e fizera uma barbeiragem na defesa do caso EBC, levando o governo a ser derrotado na fase inicial do julgamento no Supremo.
ERA TUDO MENTIRA – Surpreso com a notícia, publicada por Moreno dia 4 de junho, o ministro foi entrevistado pelo Correio Braziliense e respondeu que jamais dera “carteirada” e a AGU nem participara da defesa no caso da EBC, que fora feita diretamente pela Casa Civil, através de Gustavo do Vale Rocha, ligado a Eduardo Cunha e que ele estava acumulando ilegalmente a Subchefia Jurídica do Planalto com as funções de integrante do Conselho Nacional do Ministério Público e a atividade de advogado, em afronta direta à legislação, comprometendo a imagem da Casa Civil e da Presidência da República.
REAÇÃO IMEDIATA – Diversas instituições saíram em defesa de Medina Osório, como a Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE), o Movimento de Defesa da Advocacia (MDA), o Movimento dos Advogados Públicos Aposentados (MAPA), a Associação Nacional dos Advogados da União (ANAUNI) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Ao mesmo tempo, o brigadeiro Ary Soares Mesquita, chefe do Centro de Comunicação Social da Aeronáutica, emitiu nota oficial para desmentir de forma categórica as especulações de uma “carteirada”, explicando que se tratara de um vôo normal:
“O translado para Curitiba foi solicitado na manhã do dia 01 de junho e a FAB contava com aeronave disponível no horário solicitado, o que possibilitou que a missão se concretizasse, tendo ocorrido sem nenhuma interferência de órgãos externos para o seu cumprimento”, esclareceu a FAB.
APOIO À LAVA JATO – Na verdade, o ministro da AGU estava sendo demitido por seu incondicional apoio à Lava Jato. Viajara a Curitiba em voo oficial, acompanhado de um procurador da União e dois assessores, para participar de encontros com a força-tarefa, reforçar a participação da AGU na Lava Jato e fazer uma palestra em evento da Associação dos Juízes Federais do Brasil, em que foi saudado pelo juiz Sérgio Moro e aclamado pela seleta platéia.
Estes eram os motivos da demissão de Medina Osório – sua intransigente defesa da Lava Jato e os processos que a AGU decidira mover para que os empreiteiros reembolsem os cofres públicos. Apenas isso.
TEMER RECUOU – Diante da reação avassaladora, o presidente Temer não tinha mais condição de demitir o ministro da AGU, até porque a participação de Medina Osório dava uma certa dignidade a um ministério repleto de corruptos, pois 19 dos 22 nomes escolhidos inicialmente para o primeiro escalão do governo estão implicados em alguma acusação, processo judicial, investigação ou são citados na Lava Jato.
Como se sabe, oito deles estão mencionados em delações premiadas, inquéritos ou na chamada “lista da Odebrecht”, incluindo Eliseu Padilha, o superministro.
TRABALHANDO EM SILÊNCIO – Devido à tentativa de demissão, Medina Osório passou a trabalhar sem dar entrevistas, dedicado a fazer a AGU desempenhar suas funções institucionais, depois de funcionar durante 13 anos e meio como braço político do PT. Tudo ia bem, até que recebeu um comunicado da Polícia Federal, em 11 de julho, informando a conclusão de inquéritos contra 14 políticos, e então oficiou ao Supremo, pediu cópia para que a AGU pudesse cumprir a obrigação de mover ações indenizatórias, para ressarcir os cofres públicos.
A essa altura, Eliseu Padilha já havia cooptado a advogada Grace Fernandes Mendonça, representante da AGU no Supremo, e pediu-lhe que evitasse que os dados sobre os inquéritos dos 14 políticos (entre eles, o presidente do Senado, Renan Calheiros) fossem encaminhados Medina Osório.
FALTA UM HD – O tempo foi passando, de vez em quando o ministro da AGU cobrava as informações, e nada. A desculpa final do assessor de Grace Mendonça foi a falta de um HD externo para copiar os dados do Supremo, vejam a que ponto de desfaçatez chegou o governo.
Medina Osório foi ficando cada vez mais irritado, chegou a ameaçar ir pessoalmente ao Supremo buscar as informações, e a advogada Grace Mendonça então alertou o ministro Eliseu Padilha, que convocou o chefe da AGU para uma reunião no Planalto.
Padilha exigiu que Medina Osório esquecesse a Lava Jato. O chefe da AGU respondeu que tinha obrigações institucionais a cumprir. O superministro insistiu. Osório respondeu que se a Lava Jato não fosse apoiada, o governo ia acabar derretendo. A discussão esquentou. Sem consultar Temer, Padilha disse que Medina estava demitido. E naquele exato momento, o governo começou a se derreter.
13 de setembro de 2016
Carlos Newton
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