No documentário "A Névoa da Guerra", Errol Morris entrevista Robert McNamara, secretário de Defesa dos Estados Unidos nos anos 60. Um homem aparentemente bom, atormentado pela sua responsabilidade na escalada da guerra com o Vietnã. Um pequeno país foi massacrado. Um grande país descobriu-se menor.
Em 11 lições, várias memoráveis, McNamara discute os equívocos que resultaram em uma guerra tão fútil quanto trágica. Talvez o maior tenha sido desconhecer as razões da divergência.
O filme registra o seu encontro, em 1995, com o ministro das Relações Exteriores do Vietnã na época da guerra. McNamara comenta que havia o receio de uma aliança entre a China e o Vietnã. O ministro responde: "Vocês estavam totalmente errados! Lutávamos pela nossa independência. Você não leu um livro de história? Temos lutado com os chineses por mil anos!"
"Estávamos errados. Terrivelmente errados", constata McNamara no fim da vida. A sua contrição não o redimiu, mas, ao menos, auxiliou na compreensão de uma tragédia e colaborou com a reconciliação.
Por aqui, nossa história decepciona. Quem reconheceu a responsabilidade pelos equívocos dos planos econômicos nos anos 1980? Quem assumiu a culpa pela política iniciada há oito anos e que resultou na grave crise atual, com a segunda maior queda da renda em 120 anos? Tantos a apoiaram e, agora, para constrangimento da história, afirmam que foram críticos desde o começo. O fracasso é órfão, como afirmou John Kennedy.
A campanha eleitoral de 2014 decepcionou quando a ética foi deixada no saguão de entrada.
A difamação da divergência procurou justificar a retomada de políticas que repetidamente fracassaram nos anos 1970 e 1980. A culpa das dificuldades seria da crise externa, ou da oposição.
"O inferno são os outros" sintetiza a saída fácil de um escritor, vítima do seu próprio oportunismo.
Agravando o malfeito, o descontrole do gasto público foi mascarado pela criatividade contábil, que tentou preservar a narrativa, ainda que em detrimento do bem comum.
A moralidade distorcida, a arrogância e o português atrapalhado ameaçaram tornar farsesco o discurso, não fosse o desastre da promessa de Brasil grande que resultou em terra arrasada.
De uma presidente que lutou contra a ditadura, ainda que defendendo outro regime autoritário, esperava-se mais respeito pela transparência das contas públicas. De lideranças que surgiram com a redemocratização esperava-se apreço pelas instituições e pelo diálogo.
O mea-culpa de McNamara contrasta com a pequenez por aqui. Reconhecer erros e restabelecer o diálogo seria o começo da reconstrução.
13 de setembro de 2016
Marcos Lisboa, Folha de SP
Em 11 lições, várias memoráveis, McNamara discute os equívocos que resultaram em uma guerra tão fútil quanto trágica. Talvez o maior tenha sido desconhecer as razões da divergência.
O filme registra o seu encontro, em 1995, com o ministro das Relações Exteriores do Vietnã na época da guerra. McNamara comenta que havia o receio de uma aliança entre a China e o Vietnã. O ministro responde: "Vocês estavam totalmente errados! Lutávamos pela nossa independência. Você não leu um livro de história? Temos lutado com os chineses por mil anos!"
"Estávamos errados. Terrivelmente errados", constata McNamara no fim da vida. A sua contrição não o redimiu, mas, ao menos, auxiliou na compreensão de uma tragédia e colaborou com a reconciliação.
Por aqui, nossa história decepciona. Quem reconheceu a responsabilidade pelos equívocos dos planos econômicos nos anos 1980? Quem assumiu a culpa pela política iniciada há oito anos e que resultou na grave crise atual, com a segunda maior queda da renda em 120 anos? Tantos a apoiaram e, agora, para constrangimento da história, afirmam que foram críticos desde o começo. O fracasso é órfão, como afirmou John Kennedy.
A campanha eleitoral de 2014 decepcionou quando a ética foi deixada no saguão de entrada.
A difamação da divergência procurou justificar a retomada de políticas que repetidamente fracassaram nos anos 1970 e 1980. A culpa das dificuldades seria da crise externa, ou da oposição.
"O inferno são os outros" sintetiza a saída fácil de um escritor, vítima do seu próprio oportunismo.
Agravando o malfeito, o descontrole do gasto público foi mascarado pela criatividade contábil, que tentou preservar a narrativa, ainda que em detrimento do bem comum.
A moralidade distorcida, a arrogância e o português atrapalhado ameaçaram tornar farsesco o discurso, não fosse o desastre da promessa de Brasil grande que resultou em terra arrasada.
De uma presidente que lutou contra a ditadura, ainda que defendendo outro regime autoritário, esperava-se mais respeito pela transparência das contas públicas. De lideranças que surgiram com a redemocratização esperava-se apreço pelas instituições e pelo diálogo.
O mea-culpa de McNamara contrasta com a pequenez por aqui. Reconhecer erros e restabelecer o diálogo seria o começo da reconstrução.
13 de setembro de 2016
Marcos Lisboa, Folha de SP
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