Esta semana o país pode ver uma troca de governo. O vice-presidente, Michel Temer, terá que entrar dizendo o que fará para enfrentar a crise econômica. Se hesitar, se ceder demais, se achar que tem que fazer qualquer composição, perderá o pequeno capital político que tem. Sobre ele pairam dúvidas e a urgência de um tempo de crises graves e complexas.
A presidente Dilma cavou o buraco econômico no qual o país entrou e que a levou a estes que podem ser seus últimos dias de governo. Ela fez escolhas, tomou decisões, implantou políticas que causaram recessão, inflação alta, rombo fiscal e desemprego. Ela culpou a oposição pela crise em mais um divórcio com a realidade. Dilma ignorou todos os alertas e se negou a ver os indicadores antecedentes do naufrágio econômico.
Um governante pode pedir suor e lágrimas à população, mas não pode fazer isso depois de uma campanha eleitoral em que vendeu uma pujança inexistente e acusou adversários de pretender fazer o que ela depois faria. Os petistas conhecem essa tática e sabe no que dá. Fernando Collor acusou o então adversário Lula de planejar o confisco da poupança e, na Presidência, foi ele quem fez isso.
O declínio da presidente Dilma deixará também uma lição para o marketing político, de que quem faz “o diabo” na eleição pode conhecer o inferno. Que o diga o casal Santana, diretamente do presídio no Paraná.
Dilma sempre defendeu a ampliação de gastos, como mostrou na briga com o ex-ministro Antonio Palocci, em 2005. Ela estava, na época, ficando mais poderosa dentro do governo e usou isso para eliminar a ideia de buscar o déficit nominal zero.
Veio então a nova matriz. Essa ideia foi implantada no fim do governo Lula, mas chegou ao apogeu no período Dilma. Partia do pressuposto equivocado de que se poderia baixar artificialmente os juros, abandonar o superávit primário e aceitar mais inflação. Achava que o crescimento seria resultado dos subsídios e desonerações. Quando o rombo fiscal cresceu, preferiu escondê-lo com maquiagens. Começou, então, a era das pedaladas.
Foi dela a ideia de mudar as regras no mercado de energia. Sempre achou que desse assunto entendia. Reduziu artificialmente os preços e anunciou a benesse em pré-campanha, tendo ao lado o agora presidiário João Santana. Além disso, um leilão mal feito deixou as empresas distribuidoras sem energia contratada. Para piorar, o país entrou num período de seca. Tudo somado levou ao tarifaço decretado ao fim do período eleitoral. Era necessário para corrigir os erros anteriores, mas só seria aceitável se tivesse sido feito antes das eleições. Depois das urnas, foi entendido como estelionato eleitoral.
Um presidente cai pela soma dos seus erros. Ela não conseguiu liderar a coalizão por inabilidade e arrogância, como aconteceu com Collor. Ela cometeu erros que levaram o país a uma recessão, mais forte ainda que a da era Collor. Dilma escolheu seu destino, não é vítima dele.
O vice-presidente, Michel Temer, começou querendo diminuir ministérios e há indicações de que estaria cedendo. Apresentou o que pareceria ser um plano de governo e dá sinais de recuo de várias ideias defendidas nele. Mau sinal. Ele próprio foi citado na Lava-Jato. Ser citado não é condenação, nem mesmo prova. Há graus diferentes. Há pessoas citadas porque estiveram diretamente em fatos nebulosos, e há pessoas das quais se fala em conversas de terceiros. É preciso cuidado no entendimento disso. Mas Temer deveria proteger mais seu eventual governo das dúvidas que o cercam.
Temer pode governar por 31 meses, se não houver qualquer nova reviravolta. O período mais forte será o dos 23 meses, até abril de 2018, quando os políticos se desincompatibilizarão para as eleições gerais. Itamar teve 26 meses de mandato, mas tinha apenas 19 meses, quando empossou seu quarto ministro da Fazenda. Era maio de 1993, quando Fernando Henrique assumiu, Itamar havia perdido sete meses e o grande desafio era vencer décadas de superinflação. E deu tempo. Há várias lições daquele rico período da vida brasileira. Uma delas é que, no Plano Real, a população foi convencida de que aquele era o remédio certo através de uma comunicação sincera. Ouvir a verdade, às vezes, é o único conforto que o país precisa, ou pode ter.
10 de maio de 2016
Miriam Leitão, O Globo
A presidente Dilma cavou o buraco econômico no qual o país entrou e que a levou a estes que podem ser seus últimos dias de governo. Ela fez escolhas, tomou decisões, implantou políticas que causaram recessão, inflação alta, rombo fiscal e desemprego. Ela culpou a oposição pela crise em mais um divórcio com a realidade. Dilma ignorou todos os alertas e se negou a ver os indicadores antecedentes do naufrágio econômico.
Um governante pode pedir suor e lágrimas à população, mas não pode fazer isso depois de uma campanha eleitoral em que vendeu uma pujança inexistente e acusou adversários de pretender fazer o que ela depois faria. Os petistas conhecem essa tática e sabe no que dá. Fernando Collor acusou o então adversário Lula de planejar o confisco da poupança e, na Presidência, foi ele quem fez isso.
O declínio da presidente Dilma deixará também uma lição para o marketing político, de que quem faz “o diabo” na eleição pode conhecer o inferno. Que o diga o casal Santana, diretamente do presídio no Paraná.
Dilma sempre defendeu a ampliação de gastos, como mostrou na briga com o ex-ministro Antonio Palocci, em 2005. Ela estava, na época, ficando mais poderosa dentro do governo e usou isso para eliminar a ideia de buscar o déficit nominal zero.
Veio então a nova matriz. Essa ideia foi implantada no fim do governo Lula, mas chegou ao apogeu no período Dilma. Partia do pressuposto equivocado de que se poderia baixar artificialmente os juros, abandonar o superávit primário e aceitar mais inflação. Achava que o crescimento seria resultado dos subsídios e desonerações. Quando o rombo fiscal cresceu, preferiu escondê-lo com maquiagens. Começou, então, a era das pedaladas.
Foi dela a ideia de mudar as regras no mercado de energia. Sempre achou que desse assunto entendia. Reduziu artificialmente os preços e anunciou a benesse em pré-campanha, tendo ao lado o agora presidiário João Santana. Além disso, um leilão mal feito deixou as empresas distribuidoras sem energia contratada. Para piorar, o país entrou num período de seca. Tudo somado levou ao tarifaço decretado ao fim do período eleitoral. Era necessário para corrigir os erros anteriores, mas só seria aceitável se tivesse sido feito antes das eleições. Depois das urnas, foi entendido como estelionato eleitoral.
Um presidente cai pela soma dos seus erros. Ela não conseguiu liderar a coalizão por inabilidade e arrogância, como aconteceu com Collor. Ela cometeu erros que levaram o país a uma recessão, mais forte ainda que a da era Collor. Dilma escolheu seu destino, não é vítima dele.
O vice-presidente, Michel Temer, começou querendo diminuir ministérios e há indicações de que estaria cedendo. Apresentou o que pareceria ser um plano de governo e dá sinais de recuo de várias ideias defendidas nele. Mau sinal. Ele próprio foi citado na Lava-Jato. Ser citado não é condenação, nem mesmo prova. Há graus diferentes. Há pessoas citadas porque estiveram diretamente em fatos nebulosos, e há pessoas das quais se fala em conversas de terceiros. É preciso cuidado no entendimento disso. Mas Temer deveria proteger mais seu eventual governo das dúvidas que o cercam.
Temer pode governar por 31 meses, se não houver qualquer nova reviravolta. O período mais forte será o dos 23 meses, até abril de 2018, quando os políticos se desincompatibilizarão para as eleições gerais. Itamar teve 26 meses de mandato, mas tinha apenas 19 meses, quando empossou seu quarto ministro da Fazenda. Era maio de 1993, quando Fernando Henrique assumiu, Itamar havia perdido sete meses e o grande desafio era vencer décadas de superinflação. E deu tempo. Há várias lições daquele rico período da vida brasileira. Uma delas é que, no Plano Real, a população foi convencida de que aquele era o remédio certo através de uma comunicação sincera. Ouvir a verdade, às vezes, é o único conforto que o país precisa, ou pode ter.
10 de maio de 2016
Miriam Leitão, O Globo
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