A troca de e-mails entre um executivo da empreiteira OAS e um dos diretores do Instituto Lula, Paulo Cangussu André, indicam um pagamento por palestra realizada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Chile, em 2013, antes da formalização do contrato. Responsável pelo repasse de R$ 3,9 milhões para o instituto e para a LILS Palestras, Eventos e Publicações, a empreiteira acusada de corrupção na Petrobrás é suspeita de ter ocultado propina nos pagamentos feitos ao ex-presidente entre 2011 e 2014.
Documentos da Operação Aletheia – 24ª fase da Lava Jato – que levou Lula coercitivamente para depor, na sexta-feira, 4, registram a troca de e-mail entre Paulo André, do Instituto Lula, e Dante Fernandes, da OAS, no dia 7 de janeiro de 2014.
“Na mensagem é possível identificar que o pagamento de uma suposta palestra foi realizado antes da formalização do respectivo contrato”, informa a força-tarefa da Operação Lava Jato. O dado faz parte do Relatório de Análise de Polícia Judiciária nº 477. “Esse e outros indícios de ilicitude apontados na exordial permitem concluir que os endereços eletrônicos vinculados ao instituto (Lula) podem ter sido utilizados para eventuais arranjos ilícitos envolvendo a contratação de palestras do ex-presidente da República.”
O contrato da palestra foi anexado pelos dois investigados. Redigido em português, a OAS contrata a LILS Palestras, eventos e publicação. A data é de 1 de novembro de 2013. “Seu objeto e a prestação de serviços na condição de palestrante por Luiz Inácio Lula da Silva, na data de 27/11/2013, na cidade de Santiago do Chile/Chile, pela remuneração de R$ 501.438,37, valor correspondente a US$ 200.000,00, conforme câmbio do mercado paralelo na época do contrato”, registra o MPF. “Não há detalhamento, na minuta do contrato, acerca da palestra a ser proferida.”
CONTRATO “A POSTERIORI”
Para a força-tarefa, chama atenção o fato de “embora o documento encontre-se datado de 1 de novembro de 2013, foram identificadas trocas de mensagens de e-mail, em 01/2014, entre os executivos da OAS Marcos Paulo Ramalho, Dante Fernandes e Renato Stakus acerca da minuta do contrato”.
No diálogo, consta informação de que o pagamento do valor acordado ja havia sido formalizado, conforme nota fiscal nº 82, encaminhada, via e-mail, por Paulo Andre, do Instituto Lula, para Marcos Paulo Ramalho, da OAS, em 2 de dezembro de 2013.
A análise da minuta anexada ao e-mail indicou que o arquivo fora criado em 7 de janeiro de 2014, portanto em momento posterior à suposta realização da palestra, datada de 27 de novembro de 2013.
SUSPEITA DE PROPINA
A Lava Jato suspeita que as palestras pagas ao ex-presidente, a partir de 2011, via empresa LILS e os valores doados ao Instituto Lula possam ter ocultado propina desviada da Petrobrás. As cinco maiores doadores do instituto e as cinco maiores pagadoras da LILS são empreiteiras do cartel acusado de corrupção na Petrobrás.
O MPF realizou a oitiva de quatro executivos do alto escalão do Grupo OAS. “Nessas oitivas, Ricardo Marques Imbassahy, diretor financeiro da OAS Empreendimentos entre 2011 e 2014, Carmine de Siervi Neto, diretor Superintendente da OAS Empreendimentos entre 2006 e 2013, e Fabio Hori Yonamime, presidente da OAS Empreendimentos no ano de 2014, afirmaram que não se recordam de ter sido noticiada palestra do ex-Presidente Lula dentro da OAS ou custeada pela mesma no período em que estiveram no Grupo OAS”.
Para a força-tarefa da Lava Jato, embora sejam as palestras realizadas no exterior, “era de se esperar que citados eventos fossem noticiados dentro do Grupo OAS, especialmente a seus altos executivos”.
“A partir de tais depoimentos, reforça-se a hipótese de que a L.I.L.S. Palestras, Eventos E Publicações LTDA. possa ter sido usada para dissimular o recebimento de vantagens indevidas, utilizando-se de tais documentos tão somente para justificar os recebimento de valores a partir do Grupo OAS.”
MINUTAS DE CONTRATOS
Apesar dos executivos desconhecerem palestras, análise do material apreendido na sede da empresa OAS “revelou a existência de diversas minutas de contratos celebrados com a LILS Palestras, cujos objetos correspondem a prestação de serviços de palestrante por Lula, sócio da empresa contratada”.
Para a Lava Jato, “a falta de profissionalização dos serviços supostamente prestados pela LILS Palestras resta consubstanciada pelo fato de que funcionários do Instituto Lula apresentam-se como responsáveis pelo contato com a empresa contratante, cuidando de detalhes acerca da contratação e dos recebimentos de valores”.
INSTITUTO LULA CONTESTA
“O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ministrou palestra no dia 27 de novembro de 2013, em Santiago do Chile. O encontro com 30 importantes empresários do país foi noticiado e registrado em foto pela Confederación de la Producción y del Comércio, importante entidade que reúne o empresariado chileno”, diz o Instituto Lula, acrescentando:
O Instituto Lula lamenta mais uma vez ter que vir a público reafirmar que a atividade de palestrante do ex-presidente é absolutamente legal e similar a de outros ex-presidentes. Todas as palestras contratadas foram devidamente ministradas por Lula. Muitas delas foram publicamente divulgadas por seus realizadores, bastando utilizar mecanismos de busca na internet para acessá-los. Solicitamos correção dos jornais que, baseados apenas na peça da Operação Lava Jato, publicaram as suspeitas dos promotores de que tal palestra não foi realizada, quando ela aconteceu.”
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Por curiosidade, entrei no site do Instituto Lula e pesquisei “Confederación de la Producción y del Comércio”. A resposta foi a seguinte: “Sua pesquisa não retornou nenhum resultado”. É estranho, muito estranho mesmo, saber que o Instituto não registra a memória dos atos de seu fundador e mentor. Se for concedida a delação premiada à OAS, logo saberemos. Enquanto isso não sai, vou perguntar ao Fallavena, nosso especialista em palestras, o que ele acha disso… (C.N.)
11 de março de 2016
Ricardo Brandt e Julia Affonso
Estadão
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