"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 11 de julho de 2015

IMPÉRIO DA LEI

Cada vez mais, as investigações da Polícia Federal (PF) em torno da operação Lava Jato aproximam-se de personagens mais graúdos, tanto da esfera pública quanto do mundo empresarial – no caso, das empreiteiras. Como era previsível, esse avanço encontra não pequenas resistências, já que há muita gente insatisfeita com as investigações e com o que elas podem revelar. Preferem que tudo fique como está, com as maracutaias ocultas, bem longe dos olhos do público e gozando a costumeira impunidade.

Nesse cenário de forte pressão contra a atuação independente da Polícia Federal, é alentador ouvir a posição firme do diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello. Em entrevista ao Estado, publicada no domingo, Daiello foi claro: “Nós investigamos fatos, aonde os fatos vão chegar é consequência da investigação, doa a quem doer”.

É oportuno que o diretor-geral utilize a expressão “doa a quem doer”, tão frequente nos lábios da presidente Dilma Rousseff para se referir à independência da PF em seu governo. Oportuno porque, a cada dia que passa, o partido da presidente parece combater com mais vigor a independência da PF. O PT movimenta-se contra toda e qualquer investigação da PF que possa atingir os seus membros.

Os petistas parecem não suportar a ideia de que também eles estão sujeitos à lei e que, portanto, quando estão envolvidos em denúncias de corrupção, eles devem ser investigados. E, ainda por cima, o partido não tem qualquer pudor em explicitar que essa mentalidade não republicana – de pretender uma imunidade criminal para os amigos – é alimentada pela própria cúpula. O ex-presidente Lula, por exemplo, é o primeiro a manifestar sua preocupação pelo fato de a PF não ser “controlada” pelo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, dando a entender que preferiria ver em Cardozo outra atitude – ou que então deixe o cargo.

Diante dessas nefastas pressões, Daiello foi enfático na entrevista ao Estado: “A PF é controlada pela lei. Nós cumprimos a lei e ninguém vai aceitar ingerência política aqui”. Recordava, assim, que a subordinação da PF ao Ministério da Justiça é apenas administrativa, reafirmando, ao mesmo tempo, uma importante realidade institucional – a PF é uma polícia de Estado, e não de governo.

Isso significa que a PF se subordina à lei, e não aos interesses do governo. “O diretor-geral da PF tem como prioridade o cumprimento da lei. Ele vai cumprir a lei e fazer as investigações que a lei determina e dentro do limite que a lei determina”, esclareceu Daiello.

Ao ser questionado se a PF tem um viés político nas investigações, o diretor-geral voltou a afirmar a postura republicana da corporação: “A PF não investiga pessoas, mas fatos. Se existem indícios de que um fato pode ser crime, a PF vai investigar dentro de suas atribuições, que são o desvio de recursos da União, contrabando e tráfico de drogas”. Somente assim a PF poderá cumprir o seu papel, que é investigar com isenção as denúncias que lhe chegam.

Nunca antes na história deste país foi tão importante o papel da PF, em razão da gravidade das denúncias que trazem à tona o maior esquema de corrupção até então conhecido e que envolvem a maior empresa estatal brasileira e poderosos personagens, do setor público e do privado. O País precisa, mais do que nunca, de uma polícia independente, que atue com os olhos postos apenas na lei, e não em critérios políticos.

E do mesmo modo que é alentador ouvir o credo republicano do diretor-geral da PF, é triste tomar conhecimento da reles reação petista à entrevista ao Estado. O deputado Assis Carvalho (PT-AC) quer providências da PF já que, segundo ele, o diretor-geral “extrapolou”. Outro deputado petista, Carlos Zarattini, também mostrou o seu descontentamento com o fato de a PF cumprir a lei: “Não gostei. Esse diretor da PF acha que ali é um quarto poder, que não tem que se submeter a quem foi eleito, a quem tem voto”.

Pelo que se vê, os deputados petistas consideram que o voto lhes dá o direito de passar por cima da lei e querem ver a PF encabrestada. Numa democracia, o único cabresto da PF deve ser a lei. Nem mais nem menos.


11 de julho de 2015
Estadão

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