"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 23 de maio de 2014

SEQUESTRO PÚBLICO


Apoderar-se do que pertence à sociedade é algo quase corriqueiro no país. Ainda que isso possa se restringir à minoria dos brasileiros, afeta número significativo de pessoas de todas as regiões, religiões e classes sociais. Em bairros ricos, moradores esticam a cerca e incluem área que deveria servir para qualquer um passar. Profissionais liberais se recusam a pagar impostos. E rios e ruas são tratados como destino de descarte.
Funcionários do Estado talvez não ajam de forma pior, nesse quesito, do que a média da humanidade e dos brasileiros. Mas certamente deveriam ser melhores. Afinal, sua função é servir ao público, defender o que é de todos. Muita gente, porém, acha que ser aprovada em concurso é receber uma capitania que, à diferença daquelas do Brasil colonial, são vitalícias, não hereditárias, e concedidas por mérito, não por influência ou amizade. Tal qual alguém investido de título de nobreza, o detentor do privilégio passa a se ver com mais direitos e menos deveres que os demais.

Reivindicar remuneração e condições de trabalho justas é certamente direito dos funcionários públicos, como trabalhadores que são. Mas a sociedade também tem o direito de julgar se os pedidos são razoáveis ou não. Conceitualmente, ninguém duvida disso. Porém, qualquer questionamento de um ponto específico, como o nível de remuneração ou a jornada de trabalho diferenciada, tende a ser desqualificado por funcionários do Estado que se sentem donos dos empregos - nem todos, repito.
Dentro dessa ideia de posse, alguns veem o local de trabalho como algo que pertence a si, ou ao seu grupo. Não são raras as situações em que servidores exigem o direito de escolher o chefe, em sistema de autogestão. O detalhe é que os recursos para sustentar a máquina vêm do contribuinte. Mas isso não incomoda: acham que o dinheiro dos impostos lhes pertence, que há uma dívida contratada.

A nova etapa da crescente conquista de espaço é a Copa do Mundo. Esse pessoal já decidiu que o evento não vai se realizar, ou vai ser bem pior do que poderia, se suas reivindicações não forem aceitas. É caso inédito de sequestro de bem público intangível, no qual foram investidos R$ 25,6 bilhões pelo governo federal. O que não percebem é que a paciência do contribuinte é cada vez menor. E cresce o número de pessoas que criticam os privilégios. Isso inclui bom número de funcionários públicos, que merecem, esses sim, o título de servidores.
23 de maio de 2014
Paulo Silva Pinto, Correio Braziliense 

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