Não existe acaso em política. Ou pelo menos o espaço para sua emergência é bastante reduzido pelo jogo permanente de interesses e estratégias. Não foi naturalmente por acaso que o ex-presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, voltou atrás, durante depoimento na última terça-feira à CPI da Petrobras, no Senado, e isentou a presidente Dilma Rousseff de responsabilidade no caso da ruinosa compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, pela estatal brasileira. Por causa da declaração, para todas as câmeras que estavam ali para registrá-la, Gabrielli chegou a ser chamado de cara de pau pelo blogueiro Ricardo Noblat.
Não deve ter sido por acaso também que o ex-presidente da Petrobras deu o dito pelo não dito com relação a Dilma depois que se encontrou reservadamente na Bahia com o ex-presidente Lula, de passagem pelo Estado na semana passada a fim de prestigiar um evento administrativo num município do interior e um acontecimento político na capital baiana, destinado a fortalecer a candidatura ao governo do Estado do petista Rui Costa. Dilma fora presidente do Conselho de Administração da Petrobras quando da polêmica aquisição da refinaria norte-americana.
Mas apressara-se em justificar o fato de ter apoiado o negócio, na época, alegando ter se baseado em documentos incompletos. Foi rebatida, na primeira oportunidade, por Gabrielli, que declarou, em entrevista ao Estadão, que ela não tinha como fugir à responsabilidade no caso. Eram outros tempos aqueles, embora não tão distantes. A insatisfação com Dilma na base aliada e no próprio petismo, conjuminada com a queda constante nos índices de popularidade da presidente, ensejavam a disseminação de um movimento fortíssimo pelo retorno de Lula à política intitulado “Volta, Lula”.
Naquele contexto, o ex-presidente da Petrobras representava Lula, então observando silente o movimento pelo seu retorno, ao passo que Dilma era representada por Graça Foster, sucessora de Gabrielli no comando da estatal. A dissidência no grupo ficaria evidente quando, dias após a entrevista de Gabrielli ao Estadão, Foster, num depoimento a uma comissão da Câmara dos Deputados, reforçou que a compra de Pasadena fora um mau negócio, colocando novamente o baiano, de forma desfavorabilíssima, no centro do debate, juntamente com Lula, no governo de quem Pasadena fora adquirida.
Ocorre que, de lá para cá, Lula chegou à conclusão de que remover Dilma do plano de se recandidatar era impossível. Aqui mesmo na Bahia, a presidente afirmou que seria candidata com ou sem a base e, mais do que isto, que confiava na lealdade do seu antecessor e padrinho político. Sem o consentimento de Dilma, mesmo com a nobre missão de salvar o poder para o PT, o ex-presidente sabia que concorrer à presidência da República de novo seria uma aventura imprevisível, senão de risco altíssimo, capaz, inclusive, de comprometer sua imagem de monstro popular e eleitoral.
Imagine, por exemplo, se Dilma, alijada da disputa pela candidatura Lula, revolta-se e resolve liberar todos os preços administrados no país em plena campanha? Lula não se elegeria nem na Venezuela, só para citar outro país em que os negócios executados pela Petrobras estão na mira do Tribunal de Contas da União e podem ser também declarados a qualquer momento como péssimos. Daí que tudo concorre para demonstrar que não foi por obra do destino que Gabrielli, homem da extrema confiança de Lula, resolveu aliviar para a presidente Dilma agora na CPI da Petrobras. Para o bem do PT no poder, o ex-presidente e a atual voltaram a se entender.
23 de maio de 2014
Raul Monteiro
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