Era consensual, embora vaga, a ideia de que o escândalo da Petrobras superava qualquer outro caso de corrupção ocorrido no Brasil.
Agora, com o anúncio dos termos do acordo de leniência entre a Odebrecht e o Departamento de Justiça dos EUA, constata-se a dimensão inédita, mesmo no plano internacional, das irregularidades já conhecidas —e de muitas outras.
Em 2008, acordo semelhante levou a Siemens a pagar US$ 800 milhões a autoridades americanas e europeias. Um recorde que deve ser batido em breve, pois as compensações devidas pela Odebrecht podem atingir o triplo dessa quantia.
Revela-se que a rede de propinas tecida pela empreiteira e por sua subsidiária pertroquímica, a Braskem, espraiava-se por 12 países. No Brasil, foram US$ 599 milhões (R$ 1,9 bilhão no câmbio atual) destinados a servidores públicos, políticos e partidos.
Argentina (US$ 35 milhões), México (US$ 10,5 milhões), Peru (US$ 29 milhões) e Venezuela (US$ 98 milhões) são alguns dos países que conheceram operações do gênero.
Sistematiza-se assim, graças ao concurso de autoridades americanas, um cálculo que vinha sendo feito de forma fragmentada no Brasil, ao sabor de vazamentos e testemunhos ainda por confirmar.
É que, ao lado de alguns exemplos de precipitação acusatória, o conjunto das delações premiadas se faz sob segredo de Justiça. Foi também longo, ao inverso do que ocorre nos EUA, o processo de negociação dos ex-funcionários da Odebrecht com a Lava Jato.
Reconheça-se que a apuração criminal do envolvimento de políticos e executivos brasileiros não está no foco das preocupações americanas, o que impõe aos trâmites em Curitiba e em Brasília outro gênero de cuidados e salvaguardas.
Não resta dúvida, em todo caso, que ainda falta muito para que o Brasil disponha de técnica investigativa, de jurisprudência e de cultura institucional capazes de rivalizar com as dos Estados Unidos.
Seja como for, torna-se cada vez mais difícil que procedimentos escusos por parte de empresas venham a prosperar, tanto no ambiente externo como no interno.
Com suas ações negociadas em Nova York, a Braskem se vê submetida a regras de transparência e de lisura que os padrões brasileiros a haviam habituado a desconsiderar. Equaliza-se aos poucos, felizmente, a legislação internacional sobre acordos e delações.
O intercâmbio entre autoridades de diversos países conheceu avanços significativos. Diminui a tolerância com o que, algum tempo atrás, considerava-se prática usual. Num ano carente de boas notícias, não é exagero manifestar algum otimismo nesse campo.
19 de janeiro de 2017
Editorial Folha de SP
Agora, com o anúncio dos termos do acordo de leniência entre a Odebrecht e o Departamento de Justiça dos EUA, constata-se a dimensão inédita, mesmo no plano internacional, das irregularidades já conhecidas —e de muitas outras.
Em 2008, acordo semelhante levou a Siemens a pagar US$ 800 milhões a autoridades americanas e europeias. Um recorde que deve ser batido em breve, pois as compensações devidas pela Odebrecht podem atingir o triplo dessa quantia.
Revela-se que a rede de propinas tecida pela empreiteira e por sua subsidiária pertroquímica, a Braskem, espraiava-se por 12 países. No Brasil, foram US$ 599 milhões (R$ 1,9 bilhão no câmbio atual) destinados a servidores públicos, políticos e partidos.
Argentina (US$ 35 milhões), México (US$ 10,5 milhões), Peru (US$ 29 milhões) e Venezuela (US$ 98 milhões) são alguns dos países que conheceram operações do gênero.
Sistematiza-se assim, graças ao concurso de autoridades americanas, um cálculo que vinha sendo feito de forma fragmentada no Brasil, ao sabor de vazamentos e testemunhos ainda por confirmar.
É que, ao lado de alguns exemplos de precipitação acusatória, o conjunto das delações premiadas se faz sob segredo de Justiça. Foi também longo, ao inverso do que ocorre nos EUA, o processo de negociação dos ex-funcionários da Odebrecht com a Lava Jato.
Reconheça-se que a apuração criminal do envolvimento de políticos e executivos brasileiros não está no foco das preocupações americanas, o que impõe aos trâmites em Curitiba e em Brasília outro gênero de cuidados e salvaguardas.
Não resta dúvida, em todo caso, que ainda falta muito para que o Brasil disponha de técnica investigativa, de jurisprudência e de cultura institucional capazes de rivalizar com as dos Estados Unidos.
Seja como for, torna-se cada vez mais difícil que procedimentos escusos por parte de empresas venham a prosperar, tanto no ambiente externo como no interno.
Com suas ações negociadas em Nova York, a Braskem se vê submetida a regras de transparência e de lisura que os padrões brasileiros a haviam habituado a desconsiderar. Equaliza-se aos poucos, felizmente, a legislação internacional sobre acordos e delações.
O intercâmbio entre autoridades de diversos países conheceu avanços significativos. Diminui a tolerância com o que, algum tempo atrás, considerava-se prática usual. Num ano carente de boas notícias, não é exagero manifestar algum otimismo nesse campo.
19 de janeiro de 2017
Editorial Folha de SP
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