"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

FUTURO DAS EMPREITEIRAS

Que horizonte têm as empresas que se envolveram na corrupção investigada pela Lava-Jato? Essa pergunta está presente na economia brasileira, porque são grandes empresas e foram fundo demais na corrupção. A punição financeira tem que ser alta, mas não pode ser maior do que a capacidade da empresa de pagar, porque aí ela não consegue ressarcir a sociedade.

Quase três anos depois de iniciada a Lava-Jato, mas ainda longe do fim, grandes empresas do país estão pagando o preço alto da corrupção, vendendo ativos, ficando sem contratos, vendo seus controladores e executivos encurralados pela Justiça, e, mesmo assim, ainda não se sabe quais delas vão sobreviver.

Recentemente, a Petrobras decidiu reativar as obras do Comperj, mas chamou 20 empresas para participar da disputa, todas estrangeiras. Isso faz sentido no momento, mas e no futuro? As empresas que assinarem acordo de leniência poderão voltar a fazer negócios com o governo? Esse dilema permanece. E esse é o dado principal para saber se as empresas têm viabilidade econômica ou não. O BNDES suspendeu 25 financiamentos de projetos de empreiteiras brasileiras no exterior. Depois, aceitou retomar um projeto da Queiroz Galvão em Honduras, porque a empresa cumpriu os requisitos para esta retomada. Outra obra, da OAS, na Argentina, não terá mais desembolso do banco porque passará a ter financiamento local. Os outros 23 contratos suspensos estão sendo analisados. No mercado financeiro, os acordos de leniência têm permitido avanços para as empresas. A Moody’s, por exemplo, elevou a nota de crédito da subsidiária Odebrecht Engenharia e colocou-a em perspectiva positiva, indicando que novas elevações poderiam acontecer nos próximos meses. No relatório, a Moody’s diz que a empresa de engenharia teve receita líquida de R$ 48,8 bilhões nos 12 meses encerrados em junho de 2016. Apesar de alto, o volume de negócios caiu 33% desde o começo da Lava-Jato.

A empreiteira está fazendo acordos em outros países onde praticou o mesmo crime: Peru, Colômbia, Panamá, Argentina e Equador. Além do pagamento das indenizações aos governos, muitos desses executivos que confessaram participação em crimes cumprirão pena de restrição de liberdade. Marcelo Odebrecht ficará preso em regime fechado por mais um ano. A empresa terá que manter três profissionais do mercado como auditores internos, com amplo acesso às informações. A dúvida que se tem no mercado é se em algum momento ela poderá participar de novas concorrências no país.

Empresas de outros países quando são apanhadas em delito e fazem acordo de leniência pagam o que devem, mas continuam nos negócios. Foi o que acabou de acontecer com a Volkswagen no caso das manipulações dos índices de poluição dos motores a diesel descoberto pelo governo americano. A indústria terá que pagar US$ 4,3 bilhões para encerrar todos os processos civis e criminais contra ela e US$ 15 bilhões aos consumidores. Ela teve apenas um executivo preso, apesar de a fraude ter atingido 11 milhões de veículos, e terá que manter também três consultores dentro da companhia fiscalizando a sua gestão. Mesmo assim, foi a fabricante do setor que mais vendeu veículos no ano passado.

Algumas das empreiteiras envolvidas em casos de corrupção já estavam em situação financeira difícil, como a OAS. A Camargo Correa está voltando às investigações pelo muito que omitiu durante o primeiro acordo de leniência. Por tudo o que houve até agora, não se pode dizer quais empresas vão sobreviver a esse processo no qual entraram pelo continuado crime de corrupção, mas o país terá que responder à dúvida sobre a possibilidade, ou não, dessas empresas participarem de novas concorrências ou obterem novos financiamentos junto a bancos públicos.

Caso não possam, não sobreviverão, caso possam, há o risco de que elas voltem a delinquir. A presença dos fiscais, as novas normas de conduta, a fiscalização da Justiça podem evitar que elas voltem a praticar crime. Nos próximos anos é que se saberá se novas empresas de engenharia, com outras práticas, ocuparam o espaço deixado vago pelas grandes empreiteiras ou se as atuais empresas apanhadas na prática sistemática de crimes vão sobreviver e mudar a forma de fazer negócios no Brasil.



19 de janeiro de 2017
Míriam Leitão, O Globo

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