No mesmo dia, duas reuniões separadas anunciaram em Brasília decisões que não levam a nada. São apenas factóides, criados para demonstrar que o governo federal – ao contrário do que se constata – não permanece omisso diante da gravidade do caos nas penitenciárias. É claro que não se possa culpar exclusivamente a inércia do atual governo, porque a crise vem de longe, este país jamais teve um sistema carcerário verdadeiramente civilizado. Muito pelo contrário, a realidade brasileira é garantir impunidade às elites e oferecer masmorras superlotadas e sangrentas para as classes mais carentes, que representam a maioria da população.
NÃO HÁ DESCULPA – Mas o fato de se tratar de uma questão muito antiga não pode servir de justificativa para um governo que já está no poder há quase um ano, herdou o gravíssimo problema, nada fez para amenizá-lo e agora, quando a crise irrompe, mostra que não sabe que providências tomar. As autoridades estão completamente perdidas, chega a ser constrangedor.
Nestas reuniões de quarta-feira na capital, os ministros que respondem pelo governo não apresentaram solução, apenas falsos paliativos que na verdade não farão a menor diferença, somente servem para marcar presença, como admitiu o próprio presidente Michel Temer, ao afirmar que o objetivo “é fator de atemorização para aqueles que estão nos presídios, e fora também”.
UMA FALSA SOLUÇÃO – Conforme se noticiou com estardalhaço, na reunião do ministro da Defesa com os comandantes militares foi anunciado que o governo planeja empregar cerca de mil militares em vistorias a serem realizadas nos presídios. Embora o ministro Raul Jungmann tenha até admitido a possibilidade de aumentar o efetivo “caso seja necessário”, a iniciativa é ridícula e revela grotesco desconhecimento da situação.
O Brasil tem quase 2 mil estabelecimentos prisionais, entre penitenciárias de grande, médio e pequeno porte. Portanto, teremos de dividir os mil militares em grupos de cem e criar uma estrutura burocrática que agende as vistorias (também chamadas de varreduras). Por óbvio, vai ser muito complicado concretizar essas operações para apreender armas, drogas e celulares, pois terão de ser feitas de surpresa, essa intenção de fazer varreduras não pode vazar, deve ser Piada do Ano.
O mais incrível é que o responsável pela política carcerária, o ministro Alexandre de Moraes nem foi chamado a participar da reunião, vejam como estão batendo cabeça no governo, no dizer de antigamente.
OUTRA FALSA SOLUÇÃO – Sem ter sido convidado, o ministro da Justiça, que balança mas não cai, respondeu comandando outra reunião com representantes da Federação Sindical Nacional dos Servidores Penitenciários (Fenaspen). E também deu entrevista coletiva para anunciar outra grande idéia do governo – a criação do Grupo Nacional de Intervenção Penitenciária, para atuar dentro dos presídios, em conjunto com os governos estaduais.
Mais uma Piada do Ano. O tal grupo deverá ter apenas cem integrantes, a partir da cessão de agentes penitenciários que já trabalham nas penitenciárias estaduais, e o objetivo é que operem em “situações pontuais”, a pedido dos governadores. Ou seja, o grupo é federal, mas formado por agentes penitenciários que são servidores estaduais ou até terceirizados. Com toda certeza, isso não vai funcionar, é só um novo factóide.
Outra proposta sensacional de Alexandre de Moraes foi a criação de um curso federal de capacitação para o aperfeiçoamento dos agentes penitenciários, percebam que o ministro parece estar vivendo em outro país.
TRADUÇÃO SIMULTÂNEA – Como se vê, as autoridades estão mais perdidas do que cego em tiroteio dentro de penitenciária. Não têm foco. Todos deviam saber que o problema é a guerra entre as facções criminosas pelo domínio e controle dos presídios. O governo precisa decidir o que fazer a esse respeito. Eis a questão.
Não adianta criar cursos de capacitação e grupos especiais de agentes penitenciários, nem fazer supostas varreduras nas prisões. Isso tudo é perfumaria, como se dizia antigamente. O povo quer saber é como o governo pretende enfrentar as facções criminosas. Mas será que fá-lo-á? Ou apenas fá-lo-ia?
19 de janeiro de 2017
Carlos Newton
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