Reportagem de Raphael Di Cunto e Andrea Jube, no Valor, edição de quarta-feira, revela que o bloco parlamentar aliado do governo Michel Temer, classificado como o Centrão, fez uma mobilização e conseguiu que o projeto de emenda constitucional que estabelece a reforma da Previdência somente seja discutido em fevereiro de 2017, depois da eleição dos próximos presidentes da Câmara e do Senado. Existe o temor de que venha a ocorrer um desgaste político muito maior do que o causado pela PEC do limite de gastos públicos. O medo do desgaste atingiu em cheio também o PMDB que, no centro da tempestade, convocou reunião para debater a mudança de nome.
Tem lógica o recuo do centrão. Pois se o limite do teto de gastos, que nada mais é do que condicionar as despesas de um exercício à taxa de inflação registrada pelo IBGE para o ano anterior, provocou os protestos da noite de terça-feira, é lógico que, por sua natureza diretamente restritiva, a reforma da Previdência Social levará a protesto ainda mais intensos. Essas manifestações são uma realidade provável e contra elas a repressão por si só não resolve.
FALTA DE SOLUÇÃO – A repressão policial pode impedir o vandalismo e a destruição de valiosos patrimônios públicos e particulares. Mas não desloca a nuvem de falta de solução que está obscurecendo o país. Some-se a isso tudo a delação de Marcelo Odebrecht, que, segundo a imprensa, demorou dez horas do primeiro dia.
Tentar reduzir o plano de ação do Ministério Público e da Magistratura, como deseja Renan Calheiros, além de iniciativa imprópria, não inclui, tampouco poderia incluir, os delatores. A eles interessa a ampla divulgação de seus textos e contextos, um aspecto que não pode passar despercebido especialmente pelos alvos das denúncias já em fase de comprovação. Os atores da corrupção precisam responder à indagação de toda opinião pública brasileira.
TEVE DE RECUAR – Assim, dentro da atmosfera reinante, o governo teve de aceitar o posicionamento bem colocado pelo Centrão, que possui inclusive os melhores e mais fortes argumentos.
A divulgação das delações não vai parar, é evidente. Frear um pouco um projeto que retira direitos e restringe o uso facultativo de outros, na esfera dos milhões de segurados do INSS e da Seguridade Social, representa, sem analisar seu mérito, um lance de cautela. O fim de semana se aproxima e, com ele, podem emergir uma série de versões à espera de desmentidos convincentes, além de explicações pelo menos razoáveis. Não a repetição, que parece fita gravada em comum, de que as doações recebidas foram registradas na Justiça Eleitoral, com aprovação das respectivas contas.
HOUVE DOAÇÕES ILEGAIS – Em tudo isso, fica embutida o reconhecimento tácito de que as doações reveladas foram recebidas. Pois se não tivessem sido recebidas, a Justiça Eleitoral não as poderia ter aprovado, por falta de existência material do que se discute.
Esta face, sobretudo, representa a escala preliminar de uma outra: se os valores recebidos em doações ilegais foram efetivamente aplicados nas campanhas. Trata-se de verificar a convergência de valores. Além do mais, se houvesse esta convergência de valores, não existiria a imagem do caixa dois.
Até o momento as doações ilegais dos delatores estão sendo confirmadas. Pelo menos no primeiro estágio do desembolso.
16 de dezembro de 2016
Pedro do Coutto
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