Não se pode dizer que sejam surpreendentes – pois correspondem de alguma maneira ao que era de esperar –, mas são certamente impressionantes tanto os resultados como as reações à Operação Politeia, deflagrada na terça-feira pela Polícia Federal (PF) com o cumprimento de 53 mandados de busca e apreensão em Brasília e em seis Estados expedidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Trata-se da primeira fase das investigações da Operação Lava Jato que, por envolverem suspeitos com direito a foro privilegiado, correm sob a supervisão da Suprema Corte.
Ninguém esperava que os figurões eventualmente investigados pela Lava Jato reagissem passivamente à associação de seus nomes às investigações que poderão instruir seu julgamento pelo STF, caso se tornem réus de ações penais.
Mas reações como as do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e de seu conterrâneo Fernando Collor (PTB-AL) são uma estarrecedora demonstração da mentalidade dominante entre os poderosos da política, que por se julgarem atingidos em seu sagrado direito à impunidade contra-atacam tentando desqualificar moral e institucionalmente seus investigadores.
O senador Renan Calheiros tem ampla experiência como alvo de acusações e investigações relativas a improbidade administrativa e tráfico de influência. Chegou a renunciar a seu segundo mandato como presidente do Senado, em 2007, como resultado de negociação com seus pares para se livrar de possível cassação de seu mandato de senador pelo Conselho de Ética da Casa. Não é alvo da Politeia, mas seu nome integra a relação de políticos investigados pela Lava Jato e é possível que, mais adiante, o STF autorize a PF a bater em sua porta. Sua reação, portanto, pode ser considerada preventiva e movida pelo mesmo espírito que o tem levado a retaliar o governo Dilma, a quem responsabiliza por seu envolvimento na Lava Jato.
A nota oficial lida por Calheiros acusa a Operação Politeia de usar “métodos que beiram a intimidação” e “são uma violência contra as garantias constitucionais em detrimento do Estado Democrático de Direito”. Afirma ainda que a PF cometeu uma “invasão” nas dependências do Senado porque a missão de busca e apreensão que empreendeu seria da alçada da Polícia Legislativa – um argumento que maliciosamente procura identificar a PF como órgão “do governo”, ou seja, do Executivo, quando na verdade ela é a Polícia Judiciária da União, enquanto a Polícia Legislativa cumpre ordens dos parlamentares.
A reação de Collor foi mais contundente, certamente porque ele se sente mais vulnerável, dado seu histórico político. A apreensão de três carros de luxo em sua residência em Brasília – a “Casa da Dinda”, de triste memória – escancarou a imagem de “marajá” do antigo candidato à Presidência da República que se elegeu exatamente prometendo ir à caça dos maus brasileiros que usavam a política para enriquecer. O cidadão Fernando Collor tem todo o direito de ostentar uma coleção de carros de luxo importados que valem mais de R$ 5 milhões. Mas o homem público que representa um dos Estados mais pobres da Federação não pode reclamar, nem apresentar-se como vítima de “prejulgamento” e de “atroz constrangimento”, quando lhe é apresentada a conta de sua hipocrisia.
Já o procurador-geral Rodrigo Janot fez esclarecimentos indispensáveis a respeito da operação policial: “As medidas são necessárias para o esclarecimento dos fatos investigados no âmbito do STF, sendo que algumas se destinaram a garantir a apreensão de bens adquiridos com possível prática criminosa e outras a resguardar provas relevantes que poderiam ser destruídas”. Mais claro, impossível.
A Operação Politeia – sugestiva referência à cidade ideal onde a ética prevalece sobre a corrupção, descrita por Platão – está fadada a continuar provocando reações impressionantes, na medida em que inevitavelmente colocará em cena outros figurões. Até agora tem demonstrado que o julgamento do mensalão não foi um episódio isolado, mas o primeiro passo importante para moralizar minimamente a vida pública. O País precisa de muito mais do que isso, mas já é um bom começo.
16 de julho de 2015
Estadão
Ninguém esperava que os figurões eventualmente investigados pela Lava Jato reagissem passivamente à associação de seus nomes às investigações que poderão instruir seu julgamento pelo STF, caso se tornem réus de ações penais.
Mas reações como as do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e de seu conterrâneo Fernando Collor (PTB-AL) são uma estarrecedora demonstração da mentalidade dominante entre os poderosos da política, que por se julgarem atingidos em seu sagrado direito à impunidade contra-atacam tentando desqualificar moral e institucionalmente seus investigadores.
O senador Renan Calheiros tem ampla experiência como alvo de acusações e investigações relativas a improbidade administrativa e tráfico de influência. Chegou a renunciar a seu segundo mandato como presidente do Senado, em 2007, como resultado de negociação com seus pares para se livrar de possível cassação de seu mandato de senador pelo Conselho de Ética da Casa. Não é alvo da Politeia, mas seu nome integra a relação de políticos investigados pela Lava Jato e é possível que, mais adiante, o STF autorize a PF a bater em sua porta. Sua reação, portanto, pode ser considerada preventiva e movida pelo mesmo espírito que o tem levado a retaliar o governo Dilma, a quem responsabiliza por seu envolvimento na Lava Jato.
A nota oficial lida por Calheiros acusa a Operação Politeia de usar “métodos que beiram a intimidação” e “são uma violência contra as garantias constitucionais em detrimento do Estado Democrático de Direito”. Afirma ainda que a PF cometeu uma “invasão” nas dependências do Senado porque a missão de busca e apreensão que empreendeu seria da alçada da Polícia Legislativa – um argumento que maliciosamente procura identificar a PF como órgão “do governo”, ou seja, do Executivo, quando na verdade ela é a Polícia Judiciária da União, enquanto a Polícia Legislativa cumpre ordens dos parlamentares.
A reação de Collor foi mais contundente, certamente porque ele se sente mais vulnerável, dado seu histórico político. A apreensão de três carros de luxo em sua residência em Brasília – a “Casa da Dinda”, de triste memória – escancarou a imagem de “marajá” do antigo candidato à Presidência da República que se elegeu exatamente prometendo ir à caça dos maus brasileiros que usavam a política para enriquecer. O cidadão Fernando Collor tem todo o direito de ostentar uma coleção de carros de luxo importados que valem mais de R$ 5 milhões. Mas o homem público que representa um dos Estados mais pobres da Federação não pode reclamar, nem apresentar-se como vítima de “prejulgamento” e de “atroz constrangimento”, quando lhe é apresentada a conta de sua hipocrisia.
Já o procurador-geral Rodrigo Janot fez esclarecimentos indispensáveis a respeito da operação policial: “As medidas são necessárias para o esclarecimento dos fatos investigados no âmbito do STF, sendo que algumas se destinaram a garantir a apreensão de bens adquiridos com possível prática criminosa e outras a resguardar provas relevantes que poderiam ser destruídas”. Mais claro, impossível.
A Operação Politeia – sugestiva referência à cidade ideal onde a ética prevalece sobre a corrupção, descrita por Platão – está fadada a continuar provocando reações impressionantes, na medida em que inevitavelmente colocará em cena outros figurões. Até agora tem demonstrado que o julgamento do mensalão não foi um episódio isolado, mas o primeiro passo importante para moralizar minimamente a vida pública. O País precisa de muito mais do que isso, mas já é um bom começo.
16 de julho de 2015
Estadão
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