Os assalariados de todo o país ganharam na semana passada mais um motivo para se preocupar com a perda do poder de compra do dinheiro que recebem por seu trabalho. Aparentemente contida abaixo do teto de 6,5% fixado para este ano pelo governo (longe, portanto, do centro da meta, de 4,5%), a inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), calculado pelo IBGE, passou a correr sério risco de escapar desse limite, com a liberação de alguns preços controlados.
Pode parecer picuinha de especialista, mas não é. Muitos economistas de boa escola e sem compromissos com a bancada governamental não param de alertar para o mal que representam os preços controlados pelo governo. Muitos são básicos na planilha de custos de quase tudo que se produz e se vende no país, além das tarifas de serviços públicos (prestados ou não pela iniciativa privada) que fazem parte da vida cotidiana das pessoas. É o caso dos combustíveis (incluindo o gás), da energia elétrica, do transporte coletivo, dos planos de saúde, das tarifas de água e esgoto e até do salário mínimo, entre outros.
Nem é preciso calcular a importância eleitoral desses itens para imaginar a tentação dos governantes de mantê-los sob controle severo ou, na melhor das hipóteses, adiar ao máximo os reajustes. São chamados de "administrados", um rótulo simpático para algo que pode significar perigosas distorções na economia. Basta que o desejo de adiá-los seja maior do que a necessidade de cobrir aumentos de custos. Como não existe almoço grátis, mais dia, menos dia, a conta tem de ser paga.
Na sexta-feira, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) autorizou reajustes de 9,65% nos planos de saúde individuais e familiares. O aumento é o maior já concedido nos últimos nove anos e vai afetar o orçamento de 8,8 milhões de pessoas, parcela da população que está sendo punida com um aumento que atropela os 6,28% acumulados pelo IPCA em 12 meses.
No mesmo dia, outra agência "reguladora" autorizou aumento de tarifa ainda mais bombástico para o futuro da inflação. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou um reajuste médio de 18,06% nas contas de luz emitidas pela Eletropaulo. Esse aumento vem na sequência de pesados reajustes concedidos a outras concessionárias, como a Cemig (14,76%) e a Celpe (17,75%).
É mais um capítulo da novela de problemas do setor elétrico criados pela redução forçada das tarifas anunciada pela presidente Dilma em setembro de 2012, que provocou distorções nas contas das concessionárias (inclusive estatais). A isso se somou a necessidade de comprar energia mais cara gerada por termelétricas, ligadas para cobrir a falta de novas hidrelétricas e a escassez de água nos reservatórios das já existentes.
Os aumentos ora concedidos cobrem apenas uma parte do rombo provocado. O resto foi "administrado" sob forma de empréstimos e de futuros reajustes. Mas, desde já, o aumento muito maior do que a inflação vai causar estragos. Para ficar apenas no caso da Eletropaulo, que atende a 6,7 milhões de consumidores da Região Metropolitana de São Paulo, essa concessionária tem peso de 27,9% no item energia elétrica do IPCA nacional. Pior: o reajuste para as indústrias atendidas por ela será ainda maior: 19,93%, com evidente repercussão numa miríade de produtos consumidos em todo o país. É mais uma lição de que o controle da inflação deve ser prioridade política, mas realizado por profissionais.
08 de julho de 2014
Editorial Correio Braziliense
Pode parecer picuinha de especialista, mas não é. Muitos economistas de boa escola e sem compromissos com a bancada governamental não param de alertar para o mal que representam os preços controlados pelo governo. Muitos são básicos na planilha de custos de quase tudo que se produz e se vende no país, além das tarifas de serviços públicos (prestados ou não pela iniciativa privada) que fazem parte da vida cotidiana das pessoas. É o caso dos combustíveis (incluindo o gás), da energia elétrica, do transporte coletivo, dos planos de saúde, das tarifas de água e esgoto e até do salário mínimo, entre outros.
Nem é preciso calcular a importância eleitoral desses itens para imaginar a tentação dos governantes de mantê-los sob controle severo ou, na melhor das hipóteses, adiar ao máximo os reajustes. São chamados de "administrados", um rótulo simpático para algo que pode significar perigosas distorções na economia. Basta que o desejo de adiá-los seja maior do que a necessidade de cobrir aumentos de custos. Como não existe almoço grátis, mais dia, menos dia, a conta tem de ser paga.
Na sexta-feira, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) autorizou reajustes de 9,65% nos planos de saúde individuais e familiares. O aumento é o maior já concedido nos últimos nove anos e vai afetar o orçamento de 8,8 milhões de pessoas, parcela da população que está sendo punida com um aumento que atropela os 6,28% acumulados pelo IPCA em 12 meses.
No mesmo dia, outra agência "reguladora" autorizou aumento de tarifa ainda mais bombástico para o futuro da inflação. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou um reajuste médio de 18,06% nas contas de luz emitidas pela Eletropaulo. Esse aumento vem na sequência de pesados reajustes concedidos a outras concessionárias, como a Cemig (14,76%) e a Celpe (17,75%).
É mais um capítulo da novela de problemas do setor elétrico criados pela redução forçada das tarifas anunciada pela presidente Dilma em setembro de 2012, que provocou distorções nas contas das concessionárias (inclusive estatais). A isso se somou a necessidade de comprar energia mais cara gerada por termelétricas, ligadas para cobrir a falta de novas hidrelétricas e a escassez de água nos reservatórios das já existentes.
Os aumentos ora concedidos cobrem apenas uma parte do rombo provocado. O resto foi "administrado" sob forma de empréstimos e de futuros reajustes. Mas, desde já, o aumento muito maior do que a inflação vai causar estragos. Para ficar apenas no caso da Eletropaulo, que atende a 6,7 milhões de consumidores da Região Metropolitana de São Paulo, essa concessionária tem peso de 27,9% no item energia elétrica do IPCA nacional. Pior: o reajuste para as indústrias atendidas por ela será ainda maior: 19,93%, com evidente repercussão numa miríade de produtos consumidos em todo o país. É mais uma lição de que o controle da inflação deve ser prioridade política, mas realizado por profissionais.
08 de julho de 2014
Editorial Correio Braziliense
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