Enquanto Dilma exaltava as “manifestações” no Programa do Ratinho, o pau comia no Rio e em São Paulo. Estava escrito na estrela
Tomei uma decisão editorial. Sempre que eu escrever sobre a barbárie promovida por fascistas mascarados, a primeira imagem do meu texto será essa. Sim, é Caetano Veloso. Ele é favorável à censura prévia no caso das biografias, mas contra a repressão aos black blocs. Aos fatos da hora.
Enquanto o pau comia nas ruas em São Paulo e no Rio, Dilma Rousseff concedia uma entrevista a Ratinho. Não há nada de errado com o apresentador. Faz o trabalho dele. A questão é saber se ela faz o dela.
Enquanto a presidente dizia no SBT que “os protestos fazem parte do processo da democracia e da evolução social do Brasil”, os mascarados do Black Bloc faziam isto em São Paulo.
Enquanto a presidente dizia a Ratinho que os protestos “têm um sentido positivo”, os black blocs faziam isto no Rio.
Enquanto a presidente fazia poesia e garantia que os manifestantes querem “mais garantias de direitos” e “mais democracia”, na capital fluminense, assistia-se a esta beleza:
Enquanto a presidente interpretava os tais protestos como coisa de gente que quer sempre avançar, os “avançados” faziam coisas como esta:
Então vamos ver
O que você sente, leitor amigo, telespectador amigo, quando repórteres e apresentadores de TV recorrem à expressão “manifestação pacífica”? Não está cansado dessa ladainha, dessa mentira escancarada, dessa pilantragem jornalística? Estão querendo enganar a quem? Nesta segunda, a violência estava inscrita na própria convocação dos atos, desde o começo. Questionei aqui: que sentido fazia marcar um protesto em São Paulo em apoio aos grevistas do Rio?
Era o PSOL, que invadiu a Reitoria da USP, se solidarizando com o PSOL que comanda a absurda greve dos professores no Rio. Tanto lá como cá, contava-se com a colaboração dos black blocs, não é? No Rio, como num desfile de escola de samba, criou-se uma comissão de frente, com jovens e uma criança, batizada de “Tropa de Prof”. Parte da imprensa carioca delirou, achou lindo, achou demais, fez poesia, babou de satisfação. Às vezes, tenho a impressão de que há mais black blocs nas redações do que nas ruas. Vejam a foto.
Logo atrás, vinha uma outra ala, a dos… black blocs propriamente. E, como é de seu feitio, mandavam a polícia se f…r.
Respondam, senhores apresentadores de TV.
Respondam, senhores jornalistas de TV.
Respondam, senhores editores de TV.
Respondam, senhores diretores de jornalismo de TV.
Quem, planejando uma “manifestação pacífica”, aceita a colaboração dos black blocs já na própria organização do suposto ato de protesto?
Respondam, senhores jornalistas de TV.
Respondam, senhores editores de TV.
Respondam, senhores diretores de jornalismo de TV.
Quem, planejando uma “manifestação pacífica”, aceita a colaboração dos black blocs já na própria organização do suposto ato de protesto?
O chato é que a condescendência com a violência e com a desordem não muda o espírito dos que odeiam a imprensa livre e o jornalismo, como se vê na foto abaixo.
Embora a Globo faça uma cobertura dos eventos de rua que, para ser ameno, é “amigável” com os protestos, os trogloditas continuam a satanizá-la. Se, amanhã, num ato de delírio extremo, a emissora passasse a tratar os black blocs como heróis, eles a acusariam de tentativa de cooptação. Não existem nem amenidade nem adesão o bastante para a fome do gigante.
País estúpido
Leiam este trecho em azul.
A grande mentira é esta: as manifestações nunca foram pacíficas, desde o início. Depois que se decretou que a “culpa é da polícia” e que a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, debaixo de uma artilharia como nunca se viu, foi obrigada a declarar qualquer área da capital território livre para as manifestações — “sem repressão” —, estava, para lembrar imagem que usei aqui, aberta a Caixa de Pandora. Como no mito, só a esperança ficou grudada ao fundo. Os males do mundo escaparam todos.
Mais: teve início outra tese ridícula — a da “maioria pacífica”, uma espécie, como direi?, tautologia conceitual. Quando a maioria não é pacífica, o que se tem é revolução. Aliás, também as revoluções são feitas por minorias. A questão é saber se elas são ou não usadas como instrumento de luta. Ou foram os “pacíficos” que empurraram os governadores e prefeitos contra a parede?
(…)
O governo federal está recuperando a ofensiva no terreno político, e não há muito o que a oposição possa fazer. Com as pessoas comuns um pouco assustadas e de volta a seus lares, sobraram nas ruas a turma da porradaria e os radicais de esquerda, que já se mobilizam para dirigir de modo mais claro os ataques contra a imprensa — a mesma que incensou o movimento. E desqualifico, mais uma vez, uma mentira estúpida: o jornalismo não entrou nessa “para derrubar Dilma”, não! Entrou porque não resiste a qualquer coisa que tenha cheiro de povo.
(…)
Vá lá na Suécia e diga que tudo vale a pena se a disposição não é pequena para ver o que acontece. Lembram-se do furacão Katrina, nos EUA? As vítimas foram mandadas para escolas e alojamentos. Todos estavam unidos na tragédia, não é? Os idealistas esperavam solidariedade, a ajuda mútua etc. As Forças Armadas americanas estavam lá. Mesmo assim, começaram a se multiplicar os casos de estupro, e as autoridades alertaram: “Protejam-se; não temos como evitar esses atos”.
“Ah, então o povo, deixado por sua própria conta…” Sim, é isso mesmo! É por isso que existem governos e pactos sociais. O estado não precisa ser o Leviatã, não! Mas precisa ter legitimadas as suas forças de contenção. Ou é a guerra de todos contra todos. Uma coisa é criticar os maus policiais; outra, como se fez, é deslegitimar as polícias. É visível que as PMs do Brasil inteiro estão com medo de agir. Os policiais temem parar atrás das grades por cumprir sua função.
Se a amiga da presidente Dilma, a tal Rosa Maria, da Comissão da Verdade, elege as PMs como inimigas do povo e dos direitos humanos, então está declarado o vale-tudo. Vale-tudo que setores da imprensa pediram e aplaudiram. E agora? Agora são as próximas vítimas.
Retomo
Este é trecho de um post que escrevi aqui no dia 27 de junho de 2013, há mais de três meses. Quem se orienta segundo princípios inegociáveis não precisa esperar o desenrolar os fatos para dizer “não” ao que merece “não”. E eu digo “não” à violência que é dirigida contra as balizas do regime democrático.
VOCÊS SABEM QUE JAMAIS ME DEIXEI LEVAR PELO CANTO DA SEREIA, NÃO É? APANHEI MUITO POR ISSO, INCLUSIVE DE ALGUNS LEITORES HABITUAIS DO BLOG.
“É necessário ficar lembrando o que você escreveu?” É, sim! Não é sem um custo razoável que se afirmam certas coisas, na contramão, na contracorrente, quando há quase uma unanimidade em sentido contrário. É preciso ter memória.
Volto a Dilma
Na entrevista ao Ratinho, Dilma afirmou que, sem as manifestações, talvez o governo não tivesse conseguido aprovar os 75% dos royalties do pré-sal para a educação e 25% para a saúde e criar o programa “Mais Médicos”. Num caso, conta-se com o ovo na barriga da galinha. No outro, como é sabido, o programa já estava em curso e nada tinha a ver com a saúde dos brasucas, e sim com os cofres de Cuba. Isso é o de menos. O que importa é que o governo se desvinculou dos protestos, como antevi que aconteceria ainda em junho, e largou a barbárie para ser resolvida pelas Polícias Militares, que, prudentemente, cansaram de ser vítimas das milícias politicamente corretas das redações.
Se setores da imprensa, a exemplo de Caetano Veloso, acham que os black blocs “fazem parte”, por que seriam os homens de farda a dizer que não? Eles, convenham, pertencem àquele grupo que detém o monopólio do uso legítimo da força. Se os “companheiros” da imprensa acham que esse monopólio foi transferido para os outros fardados, os mascarados, não há muito o que os policiais, que são apenas o povo de farda, possam fazer. Os respectivos comandos das PMs deveriam mandar seus homens saírem às ruas distribuindo rosas & poesias.
08 de outubro de 2013
Reinaldo Azevedo - Veja
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