Uma confusão criada pela consciência de um diplomata bem formado para quem ter iniciativa era próprio dos seres racionais
Um senador polêmico, com vestígios de inimigo, entra porta adentro da Embaixada do Brasil pedindo socorro e é prontamente acolhido.
Boa tradição diplomática, fonte de prazer para quem respeita nossa história.
Um jovem diplomata, sem saber que seria extravagante, se põe a recolher indícios para encontrar uma solução, e, sem muita barganha, empresta ao caso sua reputação.
Bons sinais vindos de um funcionário do Estado que sabe que trabalhar com a consciência pesada leva à má reputação. Uma decisão que tira o Brasil do isolamento regional e o repõe no destino universal da diplomacia humanitária e pacifista.
O que espanta no caso é a iniciativa do governo e a sua afeição por um valor maior do que qualquer conveniência não serem defendidas por ninguém que o apoia. Menos o diplomata que deu sequência ao ato da presidente de 8 de junho de 2012 ao conceder, de pronto, asilo ao perseguido politico, o qual o Itamaraty não soube cumprir por pressão do governo interessado em marginalizar o asilado.
Se eu fosse presidente, nomeava o garoto chanceler pela sutil capacidade de perceber que o governo boliviano estava disposto a fechar os olhos para uma saída furtiva, como se deu, e o brasileiro desejava encerrar o asilo na Embaixada, como ocorreu.
Bastava aplicar a inteligência às relações oficiais entre Estados e confiar que a transbordante amizade entre governantes não tomasse conta do discernimento político entre nações.
É claro que a ação astuta do subordinado, de um posto que nossa diplomacia fez mais importante do que Washington, assusta o superior submetido a outra cadeia de comando. Assim, 110 anos depois do Tratado de Petrópolis, a noção de fronteira entre Brasil e Bolívia, não é mais geográfica, política ou jurídica.
É difícil não alertar para os vestígios que a história desse forasteiro pode sedimentar na índole dos diplomatas. Viajando por 1600 km, silencioso como matraca, sem precisar de gasolina, o cortejo do amaldiçoado atravessou cinco postos da gendarmaria preguiçosa para entrar no jato particular, destes sempre à disposição da política, na maior fronteira dos dois países, e chegou, desnecessariamente, como chega a droga nos bairros chiques da capital. Assustando os anjos que optaram pela neutralidade, mas se movem rápido quando qualquer coisa serve para ajustar condutas na rinha das facções.
Uma confusão criada pela consciência de um diplomata bem formado para quem ter iniciativa era próprio dos seres racionais. Ilusão que também atingiu seu colega Bustani (embaixador brasileiro abandonado pelo Itamaraty na Organização para Prescrição das Armas Químicas — Opaq — por agir como devia) quando desafiou a águia americana em Haia.
Aqui, o jovem subordinado, que honrou a vocação humanitária do país e não deixou a incúria apodrecer seu hóspede, teve pior sorte: vai ser investigado pelos lustradores de sapato enquanto aguarda o jogo indolente de passar anel entre os cortesãos.
Uma fábula capa e espada, de autoria calada, onde o Zorro passa a mão na cabeça do Tonto.
02 de setembro de 2013
Paulo Delgado é sociólogo, foi deputado federal, vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados e secretário de Relações Internacionais do PT
Boa tradição diplomática, fonte de prazer para quem respeita nossa história.
Um jovem diplomata, sem saber que seria extravagante, se põe a recolher indícios para encontrar uma solução, e, sem muita barganha, empresta ao caso sua reputação.
Bons sinais vindos de um funcionário do Estado que sabe que trabalhar com a consciência pesada leva à má reputação. Uma decisão que tira o Brasil do isolamento regional e o repõe no destino universal da diplomacia humanitária e pacifista.
O que espanta no caso é a iniciativa do governo e a sua afeição por um valor maior do que qualquer conveniência não serem defendidas por ninguém que o apoia. Menos o diplomata que deu sequência ao ato da presidente de 8 de junho de 2012 ao conceder, de pronto, asilo ao perseguido politico, o qual o Itamaraty não soube cumprir por pressão do governo interessado em marginalizar o asilado.
Se eu fosse presidente, nomeava o garoto chanceler pela sutil capacidade de perceber que o governo boliviano estava disposto a fechar os olhos para uma saída furtiva, como se deu, e o brasileiro desejava encerrar o asilo na Embaixada, como ocorreu.
Bastava aplicar a inteligência às relações oficiais entre Estados e confiar que a transbordante amizade entre governantes não tomasse conta do discernimento político entre nações.
É claro que a ação astuta do subordinado, de um posto que nossa diplomacia fez mais importante do que Washington, assusta o superior submetido a outra cadeia de comando. Assim, 110 anos depois do Tratado de Petrópolis, a noção de fronteira entre Brasil e Bolívia, não é mais geográfica, política ou jurídica.
É difícil não alertar para os vestígios que a história desse forasteiro pode sedimentar na índole dos diplomatas. Viajando por 1600 km, silencioso como matraca, sem precisar de gasolina, o cortejo do amaldiçoado atravessou cinco postos da gendarmaria preguiçosa para entrar no jato particular, destes sempre à disposição da política, na maior fronteira dos dois países, e chegou, desnecessariamente, como chega a droga nos bairros chiques da capital. Assustando os anjos que optaram pela neutralidade, mas se movem rápido quando qualquer coisa serve para ajustar condutas na rinha das facções.
Uma confusão criada pela consciência de um diplomata bem formado para quem ter iniciativa era próprio dos seres racionais. Ilusão que também atingiu seu colega Bustani (embaixador brasileiro abandonado pelo Itamaraty na Organização para Prescrição das Armas Químicas — Opaq — por agir como devia) quando desafiou a águia americana em Haia.
Aqui, o jovem subordinado, que honrou a vocação humanitária do país e não deixou a incúria apodrecer seu hóspede, teve pior sorte: vai ser investigado pelos lustradores de sapato enquanto aguarda o jogo indolente de passar anel entre os cortesãos.
Uma fábula capa e espada, de autoria calada, onde o Zorro passa a mão na cabeça do Tonto.
02 de setembro de 2013
Paulo Delgado é sociólogo, foi deputado federal, vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados e secretário de Relações Internacionais do PT
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