BC avisa que juros vão ficar onde na verdade estão desde o fim de 2017
CASO NÃO apareça ninguém com um bom argumento para o Banco Central baixar a taxa de juros para, digamos, 5%, a discussão de cortes adicionais é bizantina. Nesta quarta-feira (7), o BC reduziu a Selic para 6,75%, baixa histórica.
A taxa de juro real no mercado, no atacadão de dinheiro, no entanto, anda em torno de 2,9% ao ano desde novembro do ano passado (taxa "ex ante", DI para um ano, descontada a inflação esperada para 12 meses). O Banco Central calibrou um fim suave para o desaperto monetário.
Em caso de surpresa positiva na inflação, o BC pode até cortar mais 0,25 ponto percentual, como afirmou na nota em que divulgou a decisão sobre a Selic. Não deve fazer grande diferença, se alguma, se parar por aí.
A taxa real deve ficar em torno de 2,8% por boa parte do resto do ano. Logo, é preciso mudar a conversa sobre política econômica, se por mais não fosse.
Como nota histórica, observe-se que a última vez em que a taxa real de juros básica beirou os 2,8% foi em maio de 2013, quando o Fed, o banco central americano, indicava que dará fim à política de relaxamento monetário, o que causou algum tumulto financeiro naquele ano. O Junho de 2013 faria algum estrago adicional.
Entre abril de 2012 e maio de 2013, o juro real básico ficou abaixo de 2,8%, raspando 1,3% no início de 2013, o ano em tudo terminou e ainda não acabou, ao menos no que diz respeito à política. A fim de bater o recorde de juro real baixo de Dilma Rousseff, então um sucesso pela culatra, seria preciso baixar a Selic a uns 5,5%. Alguém se habilita a defender a tese?
Nem é preciso lembrar que, ao contrário de agora, o juro real baixou sob Dilma 1 quando havia pressão inflacionária, tabelamentos de preços e desleixo crescente com as contas públicas. Não iria prestar, como estava claro, e não prestou. Deu em besteira grossa.
De mais novo no comunicado do Banco Central lê-se agora que a recuperação econômica é "consistente". Esse uso equivocado da palavra "consistente" é decerto um clichê, cada vez mais desgastado e vazio, mas contrasta com o palavreado dos comunicados anteriores, que qualificavam a recuperação de "gradual". O BC está mais animado, pois. Também não deu muita trela para o paniquito corrente nos mercados financeiros mundiais.
Mais importante que um corte de um quarto de porcentagem será o destino do crédito e das taxas de juros bancárias. Parece que o degelo enfim começou, no trimestre final do ano passado, mas o desentupimento do canal de crédito ainda está entre o parcial e o incerto.
Do lado dos gastos do governo, parece que vai haver uma descompressão Mandrake, um gasto maior do que o previsível, dadas as projeções de receita e a meta de deficit, grosso modo dinheiro de "sobras" do ano passado. Pelo bem ou pelo mal, é algum impulso adicional.
Resumo da ópera, podemos ter um ano de bom alívio, se não houver tumulto financeiro maior lá fora ou a eleição de boçais extremos em outubro. Foi adiado para 2019 o encontro com os nossos problemas teratológicos: governo quebrado, incapaz de manter infraestrutura e gasto social básico, com dívida crescente.
11 de fevereiro de 2018
Vinicius Torres Freire, Folha de SP
CASO NÃO apareça ninguém com um bom argumento para o Banco Central baixar a taxa de juros para, digamos, 5%, a discussão de cortes adicionais é bizantina. Nesta quarta-feira (7), o BC reduziu a Selic para 6,75%, baixa histórica.
A taxa de juro real no mercado, no atacadão de dinheiro, no entanto, anda em torno de 2,9% ao ano desde novembro do ano passado (taxa "ex ante", DI para um ano, descontada a inflação esperada para 12 meses). O Banco Central calibrou um fim suave para o desaperto monetário.
Em caso de surpresa positiva na inflação, o BC pode até cortar mais 0,25 ponto percentual, como afirmou na nota em que divulgou a decisão sobre a Selic. Não deve fazer grande diferença, se alguma, se parar por aí.
A taxa real deve ficar em torno de 2,8% por boa parte do resto do ano. Logo, é preciso mudar a conversa sobre política econômica, se por mais não fosse.
Como nota histórica, observe-se que a última vez em que a taxa real de juros básica beirou os 2,8% foi em maio de 2013, quando o Fed, o banco central americano, indicava que dará fim à política de relaxamento monetário, o que causou algum tumulto financeiro naquele ano. O Junho de 2013 faria algum estrago adicional.
Entre abril de 2012 e maio de 2013, o juro real básico ficou abaixo de 2,8%, raspando 1,3% no início de 2013, o ano em tudo terminou e ainda não acabou, ao menos no que diz respeito à política. A fim de bater o recorde de juro real baixo de Dilma Rousseff, então um sucesso pela culatra, seria preciso baixar a Selic a uns 5,5%. Alguém se habilita a defender a tese?
Nem é preciso lembrar que, ao contrário de agora, o juro real baixou sob Dilma 1 quando havia pressão inflacionária, tabelamentos de preços e desleixo crescente com as contas públicas. Não iria prestar, como estava claro, e não prestou. Deu em besteira grossa.
De mais novo no comunicado do Banco Central lê-se agora que a recuperação econômica é "consistente". Esse uso equivocado da palavra "consistente" é decerto um clichê, cada vez mais desgastado e vazio, mas contrasta com o palavreado dos comunicados anteriores, que qualificavam a recuperação de "gradual". O BC está mais animado, pois. Também não deu muita trela para o paniquito corrente nos mercados financeiros mundiais.
Mais importante que um corte de um quarto de porcentagem será o destino do crédito e das taxas de juros bancárias. Parece que o degelo enfim começou, no trimestre final do ano passado, mas o desentupimento do canal de crédito ainda está entre o parcial e o incerto.
Do lado dos gastos do governo, parece que vai haver uma descompressão Mandrake, um gasto maior do que o previsível, dadas as projeções de receita e a meta de deficit, grosso modo dinheiro de "sobras" do ano passado. Pelo bem ou pelo mal, é algum impulso adicional.
Resumo da ópera, podemos ter um ano de bom alívio, se não houver tumulto financeiro maior lá fora ou a eleição de boçais extremos em outubro. Foi adiado para 2019 o encontro com os nossos problemas teratológicos: governo quebrado, incapaz de manter infraestrutura e gasto social básico, com dívida crescente.
11 de fevereiro de 2018
Vinicius Torres Freire, Folha de SP
Nenhum comentário:
Postar um comentário