Temer não terá cem dias para acertar. Ele terá cem horas
Quem vai definir o ritmo e a intensidade do corte da taxa de juros será o eventual novo governo de Michel Temer, à medida que decidir qual será a intensidade e a velocidade do ajuste fiscal que pretende implementar. Quanto mais sólido e crível for o ajuste mais rapidamente a taxa Selic, hoje em 14,25% ao ano, poderá cair para níveis que possam começar a estimular a retomada da atividade econômica. Se o ajuste for rápido, a queda dos juros será rápida. Se for lento, o afrouxamento monetário será lento.
O ministro indicado para a Fazenda, Henrique Meirelles, está mais do que ciente disso e entende que Fazenda e Banco Central terão que trabalhar afinados para não dar passo em falso, nos moldes do entendimento que havia entre Pedro Malan e Arminio Fraga e mesmo entre Antonio Palocci e Meirelles. "Não há cem dias para a provável nova gestão acertar. Há cem horas", comentou um aliado do PMDB.
Conforme a ata do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem, "o nível elevado da inflação em 12 meses e as expectativas de inflação distantes dos objetivos do regime de metas não oferecem espaço para flexibilização da política monetária". E não à toa o Copom, agora, informou que a política fiscal está no terreno "expansionista".
Uma autoridade sabiamente, acrescenta: "Um novo governo, com novos atores e novas medidas, deve abrir espaço para a Selic cair".
A primeira condição para que isso aconteça é Temer conseguir dar "um choque de confiança" nos agentes econômicos. Nesse sentido, a escolha das primeiras medidas que vão compor o programa de recuperação das contas públicas terá peso fundamental. E o que de pior pode acontecer é o eventual novo governo, assim que assumir, se acovardar na ambição do ajuste fiscal.
Uma boa combinação é ter um conjunto de três ou quatro medidas estruturais de peso - reforma da Previdência, desvinculação do Orçamento e teto para a expansão dos gastos públicos, por exemplo - que garantam a solvência do Estado no médio prazo. E medidas de curto prazo para reverter a acelerada deterioração das contas públicas.
Dessa forma Meirelles conseguiria trocar o ajuste de curto prazo que o mercado gostaria de ver, por uma recuperação das finanças públicas e geração de superávit primário no médio prazo.
O presidente do BC, Alexandre Tombini, fará a transição para a nova diretoria do Banco Central, que precisa ser sabatinada e aprovada pelo Senado. Portanto, a próxima reunião do Copom, nos dias 7 e 8 de junho, ainda ocorrerá sob seu comando.
A direção do BC avalia que ao fim de cinco anos e meio de gestão, Tombini, com seus erros e acertos, deixará "as coisas bem encaminhadas" para o sucessor.
Ele entregará o BC com um nível recorde de R$ 400 bilhões em depósito compulsório - que poderão ser reduzidos no momento em que for preciso dar liquidez ao sistema bancário para expandir o crédito; US$ 376 bi de reservas cambiais que reforçam o seguro para problemas externos; e a política monetária calibrada, com juros de 14,25% ao ano, para fazer a inflação a convergir para a meta de 4,5% em 2017. E, por fim, as expectativas de inflação do mercado melhoram gradativamente.
Os "swaps" cambiais que chegaram a US$ 112 bilhões, em uma operação do BC que foi muito criticada por analistas e economistas privados, em três semanas despencaram para cerca de US$ 60 bilhões e não será difícil zerar a conta dos "swaps" nas próximas semanas.
A desvalorização da taxa de câmbio fez um ajuste rápido nas contas do balanço de pagamentos, levando a projeção do déficit em conta corrente para a casa dos 2% do PIB com tendência a zerar. O que nem é desejável na medida que o país precisa de poupança externa para investir.
A mudança da tendência do câmbio, que agora se valoriza, pode ser mitigada pelo retorno da política de acumulação de reservas cambiais, na medida que os investidores externos se animarem e os juros caírem.
O sistema financeiro está resiliente, apesar de dois anos consecutivos de contração da economia. As empresas muito endividadas estão, até o momento, conseguindo renegociar seus débitos por prazos mais longos.
O segredo é 2017. Os bancos, que estão bem capitalizados e provisionados queimaram gordura e têm fôlego para até meados do ano que vem. Se a economia não voltar a crescer em 2017, aí sim eles podem dar trabalho.
No quadro econômico visto de hoje, portanto, "o Banco Central não é problema nem solução", disse uma fonte. "Lá as políticas estão encaminhadas e sabe-se para onde vai", completou. O problema e a solução estão no descontrole das finanças e no endividamento público.
A gestão de Tombini no BC será lembrada por dois momentos marcantes: o cavalo de pau na taxa de juros em agosto de 2011 e o maior ciclo de aperto monetário da história do Copom. O governo Dilma começou em janeiro de 2011 com elevação dos juros, cuja taxa saiu de 10,75% no fim do mandato de Lula para 12,50% ao ano em junho.
De forma inesperada, o Copom deu um corte na Selic em agosto - sob argumento de agravamento da crise na zona do euro. Começou ali um processo que reduziu os juros para 7,25% em outubro de 2012. Foi uma atitude ousada e insustentável que na ótica do mercado feriu a credibilidade do BC.
Já com pressões inflacionárias, o Copom só começou a elevar a taxa em abril de 2013, dando início a uma longa trajetória de aperto monetário que elevou a Selic em sete pontos percentuais, para 14,25% em julho de 2015, nível em que se encontra até hoje.
A inflação, porém, nunca chegou à meta de 4,5% de 2011 para cá. O mais próximo que esteve, nas expectativas do mercado, foi em 4,9% em junho de 2012. Tombini encerra seu mandato no BC com as expectativas de inflação em queda, mas ainda por convergir para a meta de 4,5% em 2017.
Se ele foi "dovish" na primeira fase, tem sido bastante conservador desde 2013. Nem ele nem Dilma, porém, verão os frutos da dura recessão em que o país mergulhou há dois anos.
06 de maio de 2016
Claudia Safatle, Valor Econômico
Quem vai definir o ritmo e a intensidade do corte da taxa de juros será o eventual novo governo de Michel Temer, à medida que decidir qual será a intensidade e a velocidade do ajuste fiscal que pretende implementar. Quanto mais sólido e crível for o ajuste mais rapidamente a taxa Selic, hoje em 14,25% ao ano, poderá cair para níveis que possam começar a estimular a retomada da atividade econômica. Se o ajuste for rápido, a queda dos juros será rápida. Se for lento, o afrouxamento monetário será lento.
O ministro indicado para a Fazenda, Henrique Meirelles, está mais do que ciente disso e entende que Fazenda e Banco Central terão que trabalhar afinados para não dar passo em falso, nos moldes do entendimento que havia entre Pedro Malan e Arminio Fraga e mesmo entre Antonio Palocci e Meirelles. "Não há cem dias para a provável nova gestão acertar. Há cem horas", comentou um aliado do PMDB.
Conforme a ata do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem, "o nível elevado da inflação em 12 meses e as expectativas de inflação distantes dos objetivos do regime de metas não oferecem espaço para flexibilização da política monetária". E não à toa o Copom, agora, informou que a política fiscal está no terreno "expansionista".
Uma autoridade sabiamente, acrescenta: "Um novo governo, com novos atores e novas medidas, deve abrir espaço para a Selic cair".
A primeira condição para que isso aconteça é Temer conseguir dar "um choque de confiança" nos agentes econômicos. Nesse sentido, a escolha das primeiras medidas que vão compor o programa de recuperação das contas públicas terá peso fundamental. E o que de pior pode acontecer é o eventual novo governo, assim que assumir, se acovardar na ambição do ajuste fiscal.
Uma boa combinação é ter um conjunto de três ou quatro medidas estruturais de peso - reforma da Previdência, desvinculação do Orçamento e teto para a expansão dos gastos públicos, por exemplo - que garantam a solvência do Estado no médio prazo. E medidas de curto prazo para reverter a acelerada deterioração das contas públicas.
Dessa forma Meirelles conseguiria trocar o ajuste de curto prazo que o mercado gostaria de ver, por uma recuperação das finanças públicas e geração de superávit primário no médio prazo.
O presidente do BC, Alexandre Tombini, fará a transição para a nova diretoria do Banco Central, que precisa ser sabatinada e aprovada pelo Senado. Portanto, a próxima reunião do Copom, nos dias 7 e 8 de junho, ainda ocorrerá sob seu comando.
A direção do BC avalia que ao fim de cinco anos e meio de gestão, Tombini, com seus erros e acertos, deixará "as coisas bem encaminhadas" para o sucessor.
Ele entregará o BC com um nível recorde de R$ 400 bilhões em depósito compulsório - que poderão ser reduzidos no momento em que for preciso dar liquidez ao sistema bancário para expandir o crédito; US$ 376 bi de reservas cambiais que reforçam o seguro para problemas externos; e a política monetária calibrada, com juros de 14,25% ao ano, para fazer a inflação a convergir para a meta de 4,5% em 2017. E, por fim, as expectativas de inflação do mercado melhoram gradativamente.
Os "swaps" cambiais que chegaram a US$ 112 bilhões, em uma operação do BC que foi muito criticada por analistas e economistas privados, em três semanas despencaram para cerca de US$ 60 bilhões e não será difícil zerar a conta dos "swaps" nas próximas semanas.
A desvalorização da taxa de câmbio fez um ajuste rápido nas contas do balanço de pagamentos, levando a projeção do déficit em conta corrente para a casa dos 2% do PIB com tendência a zerar. O que nem é desejável na medida que o país precisa de poupança externa para investir.
A mudança da tendência do câmbio, que agora se valoriza, pode ser mitigada pelo retorno da política de acumulação de reservas cambiais, na medida que os investidores externos se animarem e os juros caírem.
O sistema financeiro está resiliente, apesar de dois anos consecutivos de contração da economia. As empresas muito endividadas estão, até o momento, conseguindo renegociar seus débitos por prazos mais longos.
O segredo é 2017. Os bancos, que estão bem capitalizados e provisionados queimaram gordura e têm fôlego para até meados do ano que vem. Se a economia não voltar a crescer em 2017, aí sim eles podem dar trabalho.
No quadro econômico visto de hoje, portanto, "o Banco Central não é problema nem solução", disse uma fonte. "Lá as políticas estão encaminhadas e sabe-se para onde vai", completou. O problema e a solução estão no descontrole das finanças e no endividamento público.
A gestão de Tombini no BC será lembrada por dois momentos marcantes: o cavalo de pau na taxa de juros em agosto de 2011 e o maior ciclo de aperto monetário da história do Copom. O governo Dilma começou em janeiro de 2011 com elevação dos juros, cuja taxa saiu de 10,75% no fim do mandato de Lula para 12,50% ao ano em junho.
De forma inesperada, o Copom deu um corte na Selic em agosto - sob argumento de agravamento da crise na zona do euro. Começou ali um processo que reduziu os juros para 7,25% em outubro de 2012. Foi uma atitude ousada e insustentável que na ótica do mercado feriu a credibilidade do BC.
Já com pressões inflacionárias, o Copom só começou a elevar a taxa em abril de 2013, dando início a uma longa trajetória de aperto monetário que elevou a Selic em sete pontos percentuais, para 14,25% em julho de 2015, nível em que se encontra até hoje.
A inflação, porém, nunca chegou à meta de 4,5% de 2011 para cá. O mais próximo que esteve, nas expectativas do mercado, foi em 4,9% em junho de 2012. Tombini encerra seu mandato no BC com as expectativas de inflação em queda, mas ainda por convergir para a meta de 4,5% em 2017.
Se ele foi "dovish" na primeira fase, tem sido bastante conservador desde 2013. Nem ele nem Dilma, porém, verão os frutos da dura recessão em que o país mergulhou há dois anos.
06 de maio de 2016
Claudia Safatle, Valor Econômico
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