Como convém a quem se infiltra na política, Lula da Silva e Dilma Rousseff são grandes artistas, que vivem múltiplos papéis, alguns deles até conflitantes. No início da carreira, Lula era o líder sindical que aparentemente enfrentava os patrões e o governo, apresentava-se como representante dos trabalhadores e buscava justiça social. Para ganhar a eleição em 2002, transformou-se no Lulinha Paz e Amor, assinou a Carta aos Brasileiros (leia-se: Carta aos Banqueiros), assumiu o poder e se vendeu às “zelites” que ele tanto criticava. Sua sucessora Dilma Rousseff surgiu como a gerentona, uma Dama de Ferro à brasileira, mas não era nada disso. Quando surgiu o mar de lama, trocou de personagem e passou a viver o papel de Soninha Toda Pura, que se danem Lula e PT, porque nenhuma acusação a atingiria.
Dezenas de milhões de pessoas acreditaram nesses dois artistas presidenciais. Mas agora tudo mudou. As máscaras de Lula e Dilma não mais existem. Foram arrancadas pela delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT-MS), que até ser preso era líder do governo e uma dos mais destacados políticos do partido.
As primeiras revelações do parlamentar comprovam a participação direta e concreta de Lula e Dilma nas maracutaias do governo e da base aliada para se perpetuarem no poder. E vem muito mais denúncia pela frente, porque Delcídio agora estará sendo ouvido praticamente todos os dias, em sucessivos depoimentos para esmiuçar as gravíssimas acusações iniciais que fez, em termos genéricos, envolvendo inclusive ministros de tribunais superiores. Agora, ele vai descer a detalhes.
UM PETISTA EX-TUCANO
Muito simpático, com trânsito livre em todas as facções do Congresso, Delcídio Amaral era um espécime estranho, que entrara na política pelo PSDB e depois se tornara petista. Não havia notícias de irregularidades que o envolvessem, embora ele já tivesse dado sinais de deslumbramento, com a festa monumental em homenagem à filha e as temporadas familiares em pontos turísticos internacionais, como Punta Del Este e Ibiza.
Quanto foi preso, a delação não lhe passava pela cabeça. Seu depoimento foi neutro, apenas tentou se defender, porque tinha esperanças de se livrar com ajuda dos advogados. Mas citou algumas vezes a presidente Dilma, de maneira espontânea.
“A então ministra Dilma já conhecia Nestor Cerveró desde a época em que ela atuou como secretária de Energia no governo Olívio Dutra, no Rio Grande do Sul“, afirmou o senador, acrescentando: “Como a área de exploração de gás era bastante desenvolvida naquele Estado, havia contatos permanentes entre a Diretoria de Gás e Energia da Petrobrás e a secretaria comandada pela Dilma Rousseff“.
MAIKA ENTRA EM CENA
Mas acontece que o senador é casado com Maika Gomez Amaral, uma mulher de personalidade muito forte, que há meses vinha insistindo que ele deixasse o PT. Na noite da prisão, em contato com pessoas amigas, ela culpou a presidente Dilma por ter convencido Delcídio a permanecer no PT e continuar a ser líder do governo. E desabafou, dizendo que o marido advertira Dilma várias vezes sobre a gravidade da operação Lava Jato, mas a presidente não deu atenção.
No dia seguinte, Maika procurou o advogado para conversar sobre delação premiada, que no fim de semana tornou-se o assunto principal em sua primeira visita ao marido, na sala onde estava detido na Polícia Federal. Ela argumentou com veemência que seria uma insanidade pagar sozinho por erros cometidos pelo PT e pelo Planalto. Delcídio tentou argumentar, inutilmente.
CAMPANHA PELA DELAÇÃO
A partir daí, Maika iniciou uma campanha, pedindo que toda a família e os amigos pressionassem Delcídio para que fizesse delação premiada. Em Brasília e Campo Grande, ela falava abertamente que tudo o que Delcídio fez foi a mando de Lula e Dilma. E ainda desafiava a força-tarefa da Lava Jato, dizendo que só iriam encontrar dívidas, se quebrassem o sigilo bancário do marido.
Foi assim que Delcídio Amaral acabou convencido a fazer o acordo de delação premiada. E ele então começou a escrever suas memórias do cárcere, digamos assim, para apresentá-las à força-tarefa. Quando mostrou os primeiros capítulos, foi um assombro. Por isso, o Ministério Público Federal (leia-se: Procuradoria-Geral da República) imediatamente concordou com a prisão domiciliar do senador.
Agora, ninguém sabe o que acontecerá com ele, que simplesmente está detonando o que resta do governo, de Lula, de Dilma, do PT e de tudo o mais.
O QUE DIZEM LULA E DILMA?
Apertem os cintos, Lula sumiu! Como sempre acontece, ele se omitiu e foi o Instituto Lula que soltou uma nota. “O ex-presidente Lula jamais participou, direta ou indiretamente, de qualquer ilegalidade, seja nos fatos investigados pela operação Lava Jato, ou em qualquer outro, antes, durante ou depois de seu governo“, diz o texto divulgado na tarde de quinta-feira.
E Dilma? Ficou calada o dia inteiro. No final da tarde, mandou distribuir uma nota, dizendo repudiar “o uso abusivo de vazamentos como arma política” e afirmando que é preciso apurar a divulgação de parte do conteúdo da delação de Delcídio, porque esse tipo de prática “não contribui para a estabilidade do país“. Alegou que o governo tem se pautado “pelo combate à corrupção” e pela “defesa dos princípios que regem o Estado Democrático de Direito“. Por isso, “vazamentos apócrifos, seletivos e ilegais devem ser repudiados e ter sua origem rigorosamente apurada, já que ferem a lei, a justiça e a verdade“.
Sem citar o nome de Delcídio, disse a presidente: “Se há delação premiada homologada e devidamente autorizada“, é “justo e legítimo” que o teor seja conhecido pela sociedade. “No entanto, repito, é necessária a autorização do Poder Judiciário“, completa.
DILMA NÃO NEGOU NADA
Caramba, em nenhum momento ela negou as acusações, só fez reclamar do vazamento. Quem é que escreve essas bobagens para ela? Será o notável “comunicador” Edinho Silva, ministro e porta-voz? Como todos sabem, Edinho foi tesoureiro da última campanha de Dilma e ganhou o Ministério como prêmio de consolação, por ser o homem que sabe demais, ao estilo Hitchcock.
Aliás, com as novas denúncias envolvendo doações ilegais da Odebrecht à campanha de Dilma em 2014, o comunicador Edinho Silva tem um encontro marcado com o japonês da Federal. Ele e muitos outros, é claro. Como diz o ministro-relator Teori Zavascki, o pior ainda está para vir.
04 de março de 2016
Carlos Newton
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