"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 25 de outubro de 2015

O MITO ESQUERDISTA DA "DÍVIDA HISTÓRICA" ENTRE BRANCOS E NEGROS



Zumbi: de escravo a senhor de escravos.

Em artigo publicado no Instituto Liberal, o economista Felipe Lungov desmonta o mito de que os brancos têm uma dívida histórica para com a população negra. A escravidão é antiga: era praticada, por exemplo, na Grécia e em Roma, e não tinha qualquer cunho racial. Por outro lado, os próprios africanos praticaram a escravidão. Vale a pena acompanhar os argumentos do autor do texto, que reproduzo abaixo:

Não quero aqui contestar o fato de que os colonos europeus tenham usado trabalho escravo africano durante séculos no Brasil. Negros eram capturados de suas tribos na África, cruzavam o Oceano Atlântico em condições precárias, eram vendidos e forçados a trabalhar para seus senhores brancos por gerações até o fim do Império.

As consequências morais desse triste capítulo da história podem ser analisadas por duas óticas diferentes. A primeira é a adotada pela esquerda em geral e pelo movimento ativista negro em particular, que acredita que ações e responsabilidades são atribuídas a grupos de pessoas com características comuns. Por essa ótica, o fato de brancos terem escravizado negros criou uma dívida moral e histórica entre esses dois grupos, que deve ser paga por quem hoje é branco para quem hoje é negro.

Essa análise fundamentaria as discriminações (sob o eufemismo de ações afirmativas) que vemos hoje, particularmente a reserva de vagas para negros em universidades e concursos públicos, sob pretexto de acerto dessa dívida histórica.

A segunda ótica com que podemos ver a questão é a ótica libertária. Por ela, direitos, obrigações, ações e responsabilidades são atribuídas a cada pessoa individualmente — não a grupos de pessoas. Ninguém, em hipótese alguma, é chamado para reparar um mal causado por outra pessoa, mesmo que ambos compartilhem a mesma cor da pele, sejam da mesma família, sejam amigos, ou torçam para o mesmo time. Jamais.**

Olhando por esse prisma, não haveria dívida histórica moral dos brancos de hoje para os negros de hoje, exatamente porque esses brancos não são obrigados a pagar por injustiças cometidas por outros brancos; e mesmo que fossem, não seria para os negros de hoje, que também são outros que não aqueles que foram vítimas da escravidão.

Ativistas do movimento negro, quando confrontados com essa argumentação, trocam o discurso moral pelo material. Segundo eles, o trabalho escravo negro beneficiou materialmente os brancos, e essa riqueza permitiu que os descendentes dos senhores de escravos estejam injustamente em melhor situação financeira do que os descendentes dos escravos. Aqui, haveria novamente uma dívida histórica a saldar.

O problema desse argumento é que ele repousa sobre uma visão curiosamente estreita da história. Eu mesmo tive a oportunidade de visitar o Zimbábue, na África, e andei em meio às ruínas do Reino do Zimbábue dos séculos 13 a 15. Visitei a câmara onde eram mantidos os escravos, o local onde eram mantidas todas as mulheres do rei, e as fortificações que defendiam o rei de invasores externos.

Também estive na Etiópia, em meio a ruínas e belíssimas igrejas onde outrora fora o Império Etíope que durou impressionantes 800 anos até o final do século 20. Como em quase todo o resto da África, o império escravizou, por milhares de anos, outros povos que conquistava.

Entre os europeus, por milênios pessoas eram feitas escravas por dívidas ou guerra. Uma proporção significativa da população urbana da Grécia antiga era formada por escravos, quase todos brancos. Roma também incorporava novos escravos a seu império por onde avançava, brancos ou negros do norte da África. Romanos brancos que caíssem reféns em guerras com povos africanos também eram escravizados.

Os próprios negros, no Brasil, quando conseguiam sua libertação, tentavam comprar ou capturar outros negros como escravos. Zumbi, herói do movimento negro, foi tanto escravo como senhor de escravo — muitos outros também. Como decidir de que lado da dívida histórica estão seus atuais descendentes?

Uma visão mais abrangente e menos maniqueísta da história nos mostra, portanto, que a escravidão foi prática recorrente por muito da existência humana. Não tenho dados para embasar essa afirmação (nem seria possível tê-los), mas se formos levar a sério esse argumento de beneficiamento material por escravidão e traçar a árvore genealógica de cada um de nós até o começo dos tempos, tenho certeza que todos nós temos ascendentes que já foram escravos, e todos nós temos também ascendentes que já foram senhores de escravos. 
Todos nós, brancos e negros, já enriquecemos injustamente, e injustamente enriquecemos outros. O que nos diferencia, por esse critério, é a proporção entre cada um dos dois — igualmente impossível de se determinar para cada indivíduo.

Por fim, nem todos os brancos que hoje vivem no Brasil são descendentes de senhores de escravos do Império. Muitos imigrantes chegaram no século passado e não se beneficiaram em nada com o trabalho escravo dos negros de séculos anteriores. Mesmo assim, na visão do movimento ativista negro, seus descendentes têm uma dívida histórica com os negros.

Isso para não falar de toda a mistura entre raças e entre correntes migratórias que é o nosso povo brasileiro. É fácil perceber que é impraticável desenhar políticas públicas verdadeiramente preocupadas em corrigir qualquer tipo de injustiça que a escravidão tenha causado. 
A história da humanidade é recheada de atrocidades de todo tipo, condenáveis por qualquer pessoa com um mínimo de sensibilidade — e, muito mais importante, com a visão de mundo liberal que temos hoje.

Não há como saber quem é mais vítima e quem é mais agressor, mesmo que se escolha enxergar pela ótica coletivista de responsabilidades. Reconhecer que essas atrocidades aconteceram, mas que não há nada que possa ser feito para compensar suas reais vítimas é o primeiro passo para evoluirmos rumo a uma sociedade próspera para todos, pacífica e com menos rancor. 
Em muitos lugares do mundo, longe das universidades públicas brasileiras, nada ou muito pouco se evoluiu nesse sentido. Não façamos o mesmo.

** Exceto, obviamente, nos casos em que duas ou mais pessoas estão voluntariamente associadas, como um casamento de comunhão de bens, sócios de uma empresa, etc.


25 de outubro de 2015

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