"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

LOS ASQUEROSOS

Em 2011, comentei o aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) para as compras feitas em cartão de crédito no Exterior. O estrangeiro ficou então 4% mais caro para todo brasileiro. Se antes você pagava 2,38 reais por 100 reais gastos, hoje você passa a pagar 6,38. Em mil reais, pagará 63,80. Em dez mil, que é uma despesa viável em cartão de crédito para uma viagem, pagará 638 reais. Quase a metade de uma passagem de ida e volta a Paris, na época.

Além do absurdo pago pela taxa de embarque – uma das mais caras do mundo – você passou a marchar com mais uma contribuição para o governo assistencialista do PT. O aumento do imposto visava, segundo as autoridades, conter o consumo. Conter, lá fora. Aqui, você pode consumir com gosto. Mal surge uma brecha para o cidadão viajar e comprar barato, o governo interfere na economia para proteger os caros preços nacionais.

Se ainda existe memória neste país, quem costuma viajar deve lembrar dos dias da ditadura militar em que havia limitação para as divisas que um turista levava ao exterior. O limite era mil dólares, quantia que mal pagava dez dias de hotel no estrangeiro. Sem falar que, quando se viaja, é preciso comer. A lei era de uma hipocrisia escancarada, pois nenhuma autoridade acreditaria ser possível sobreviver uma semana no exterior com mil dólares. O recurso era então levar dólares na barriga.

O viajante brasileiro assumiu uma condição de marsupial. Os dólares não eram levados exatamente na cueca, mas em cintas improvisadas de tecido, com um bolsinho para os dólares. Eu gostava daquelas guaiacas de couro que se comprava na Argentina, um cinturão com divisões internas. Com o tempo, me tornei mais criativo. A cada calça que comprava, pedia ao lojista que a munisse de bolsos internos.

Todo brasileiro de minha idade, que um dia teve de viajar, em algum momento usou este recurso. Hoje é mais simples. Leva-se VTMs ou travellers-cheques, sem limitação de quantidade, ou cartões de crédito. Mas eu vivi minha fase de dólar, não digo na cueca, mas pelo menos na barriga. O que dava à viagem uma certa insegurança. Se você tinha travellers (hoje obsoletos) ou VTMs, recebia um comprovante de compra que lhe permitia resgatá-los, caso você fosse roubado ou perdesse os mesmos. Se fosse roubado ou perdesse papel-moeda, não há como recuperá-lo.

Dona Dilma tentou acabar com a fugaz festa dos brasileiros. Sua mensagem era: abandone essa mania de viajar. Afinal, como dizia Afonso Celso, “não há no mundo país mais belo do que o Brasil. Quantos o visitam atestam e proclamam essa incomparável beleza. Dentro do enorme perímetro brasileiro, encontra-se tudo o que de pitoresco e grandioso oferece a terra”.

Para que viajar então? “Em nenhuma outra região, se mostra o céu mais sereno, nem madruga mais bela a aurora: o sol em nenhum outro hemisfério tem os raios tão dourados, nem os reflexos noturnos tão brilhantes: as estrelas são as mais benignas, e se mostram sempre alegres: os horizontes, ou nasça o sol ou se sepulte, estão sempre claros; as águas, ou se tomem nas fontes pelos campos, ou dentro das povoações nos aquedutos são as mais puras... A formosa variedade de suas formas, na desconcertada proporção dos montes, na conforme desunião das praias, compõe uma tão igual harmonia de objetos que não sabem os olhos onde melhor possam empregar a vista”.

Fique na pátria amada, leitor. Enfrente, em nome do amor ao Brasil, os caros preços do Rio, São Paulo, Recife, Salvador, Curitiba, Porto Alegre. Pague em um restaurante brasileiro metido a besta o triplo ou mais do que você pagaria em uma boa casa em Paris. Dona Dilma, coerente com suas origens, está usando os recursos dos países totalitários do século passado, do Brasil da ditadura militar inclusive: impedir, ou pelo menos dificultar, as viagens ao estrangeiro.

Mas ainda havia uma brecha. O IOF para travellers checks e compra de moeda estrangeira continuava sendo de 0,38%. Vovê podia voltar à condição de turista marsupial. Escrevi na ocasião: “voltamos à condição de turista marsupial. Em vez de cartão de crédito, leve dinheiro na barriga. Mas faça isto logo. Se bem conheço os bois com que lavro, a sanha fiscal do governo vai logo fechar esta última janela”.

Fechou. Terminou a mumunha. Travellers, cartões de débito e pré-pagos, a exemplo do American Express Global Travel, do Visa Travel Money e do MasterCard Cash Passport, são taxados em 6,38%. Como tambémnas compras ,nos saques realizados no exterior, as compras realizadas em débito no cartão múltiplo e nos cheques de viagens. Leio nos jornais que, em decorrência desta alta do IOF, muita gente que está de viagem marcada tem trocado a segurança do plástico pela moeda em espécie, preservando 6% de gastos com impostos em tudo que comprar no estrangeiro. Somente a compra de dinheiro em espécie – em solo nacional – continua com imposto de 0,38%. Voltamos definitivamente ao dólar na barriga.

Dona Dilma está seguindo o exemplo da Argentina, que aumentou de 20% para 35% o imposto sobre compras feitas com cartão de crédito fora do país e compras de pacotes turísticos e passagens de avião. Segunda a versão oficial, a medida visava conter a redução das reservas internacionais do país. Na verdade, uma desculpa esfarrapada para o protecionismo da indústria nacional.

Em 2012, novas restrições à compra de moedas estrangeiras na Argentina, determinando que apenas as pessoas com viagem marcada para o exterior tenham acesso à moeda do país de destino. Ditaduras não gostam de ver seus nacionais viajando. Quem viaja compara. Quem compara, contesta. Que o digam os países comunistas, que durante décadas proibiram viagens ao exterior.

Mas consolem-se brasileiros e argentinos. A Venezuela foi mais audaz. Segundo a EFE, a revolução bolivariana da Venezuela começou a classificar seus cidadãos que voam para fora do país quase como traidores da pátria. É o que se pode concluir pela divulgação feita pelo Ministério da Comunicação e Informação (MinCl), na noite de primeiro de janeiro, de uma lista de dirigentes oposicionistas que foram passar as férias de fim de ano em outros territórios.

A titular da pasta, Delcy Rodríguez, endossou uma lista com os dados de identidade, data de saída e destino de 27 turistas que foram para o exterior, e que qualificou como membros “da direção opositora”. Não bastasse isso, quinta-feira passada o deputado governista Robert Serra tentou também, via Twitter, dar um último reforço nessa campanha de descrédito contra os membros da oposição. “Definitivamente não gostam nem de seu país”, escreveu. “Esses asquerosos falam bobagens do país e do governo mas nem sequer desfrutam da própria pátria”.

A narrativa oficial chavista, segundo a agência, procura mostrar os setores de oposição – os asquerosos – como apátridas que, cegos por ambições pessoais e interesses de classe, obedecem às instruções de patrões estrangeiros.

Nesta pátria amada, ainda não chegamos à condição de asquerosos. Mas o governo tenta forçar, com canetaços, o brasileiro a evitar o Exterior. De nada adiantará a medida. Mesmo com 6,38%, Paris ou Madri, ou Roma ou Berlim, continuam mais baratos que o Brasil. Particularmente neste ano de Copa.


07 de janeiro de 2014
janer cristaldo

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