O Planalto prepara mudanças nas regras para a demarcação de terras indígenas; no Congresso Nacional, os ruralistas querem retirar do Executivo essa prerrogativa.
Enquanto isso, os conflitos se intensificam, o mais recente em Humaitá (AM), a 675km de Manaus, onde fica a reserva tenharim. Um índio teria sido morto, três moradores estão desaparecidos e a sede da Fundação Nacional do Índio (Funai) foi incendiada. Tudo por causa de um pedágio cobrado pelos índios na rodovia que corta a reserva.

Ao Correio, o líder indígena Marcos Terena faz duras críticas:“O governo não sabe o que está acontecendo, só toma conhecimento depois que explode o conflito”. Segundo ele, a Funai está acéfala, virou obsoleta e não há interlocutores preparados para lidar com conflitos.

“Em Humaitá, quem é o negociador? O ministro da Justiça (José Eduardo Cardozo) mandou a polícia. A questão indígena virou caso de polícia! É a política que o Chile adotou contra os índios mapuche. O governo brasileiro está usando a mesma metodologia”, salienta.

Terena concedeu a entrevista por telefone, da aldeia Terena de Aquidauana, em Mato Grosso do Sul, onde nasceu há quase 60 anos. Entrou na Funai como piloto. Foi fundador da União das Nações Indígenas. Na Eco-92, organizou a Conferência Mundial dos Povos Indígenas sobre Território, Meio Ambiente e Desenvolvimento. É o idealizador dos Jogos dos Povos Indígenas e do Festival das Tradições Indígenas.

Sobre a questão indígena, Terena diz que é preciso analisar a questão por três ângulos: um é o do colonizador clássico, que é conservador e continua retrógrado em relação ao índio do novo milênio; outro, é a visão assistencialista e paternalista do governo brasileiro, que também é conservadora; o terceiro, é a dinâmica natural e progressiva dos povos indígenas, que é quase invisível.

“Diante das circunstâncias do ser humano, o índio tem transformado as invasões culturais e econômicas — como hidrovias, hidrelétricas, novas cidades e etc. —, que representariam uma catástrofe étnica, em nova perspectiva de luta e sobrevivência.
Esse processo está sendo digerido pelos líderes tradicionais, que chamamos de autoridades, e que o sistema colonizador transformou na figura caricata de caciques. São pessoas que muitas vezes nem falam português, vivem na selva, preservam a cultura e estão muito atentas a esse processo”, salienta o líder indígena.