Quem banca o saneamento da máquina pública é ele mesmo, um cacique do velho PMDB
Mais um festival de rock se vai, deixando mensagens no ar. Mas quem quiser decifrá-las para entender, afinal, o que é que muda o mundo, poderá se assustar: mantidas as tendências atuais, logo o rock"n"roll estará servindo para protestos contra a Guerra do Vietnã e em defesa da pílula anticoncepcional. Será que o mundo está mudando de marcha a ré? Existe rock reacionário?
Foi comovente ver aquelas bandas brasileiras caricaturando o passado que nunca tiveram, soltando brados heroicos contra o governo e a política nacional. Se tivessem gritado com metade desse entusiasmo nos 13 anos de rapinagem do PT... Bem, não teria acontecido nada, porque esses rebeldes não fazem mal a ninguém.
A rebeldia empalhada do Rock in Rio não se lembrou de Luiz Inácio Lula da Silva, o comandante do maior assalto da história republicana. Num país mais ou menos saudável, os acordes ensurdecedores do mensalão, do petrolão e das revelações obscenas da Operação Lava Jato imporiam, sobre qualquer outro som, o brado pela prisão de Lula. No entanto, o heptarréu (já condenado em um dos processos) não inspira os revolucionários da tirolesa.
É a onda purificadora mais poluída da história da rebeldia cívica (alô, vigilância sanitária!). No embalo do bordão carne assada "fora Temer", que virou até brinco no festival, os intelectuais de porta de assembleia resolveram classificar o impeachment da senhora Rousseff (que também está solta) como a mera substituição de uma quadrilha por outra. Não, companheiros da limpeza. Não foi isso o que aconteceu.
Notícia em primeira mão para vocês que estão chegando de Woodstock: a Petrobras, maior empresa nacional, jogada na lona pelo estupro petista, foi saneada e reerguida no espaço inacreditável de um ano. A mesma transfusão de gestão aconteceu no Banco Central, no Tesouro e nas principais instituições que comandam a economia nacional. Vocês não poderiam saber de nada disso porque estavam assistindo a Jimmy Hendrix, mas aí vai: o dólar, os juros, o risco país e a inflação despencaram, também em tempo recorde. Portanto, companheiros revolucionários, avisem ao pessoal da limpeza que, no coração do estado brasileiro, não houve a substituição de uma quadrilha por outra. A não ser que a que entrou seja uma quadrilha do bem, como vocês fingem que a gangue do Lula é.
Quem está bancando esse saneamento da orgia petista na máquina pública, contra tudo e contra todos, queridos metaleiros de playground, é o mordomo! Ele mesmo, um cacique do velho e fisiológico PMDB, que tem de ser investigado sempre. Mas o que se viu foram denúncias fajutas montadas por um falso justiceiro para fazer política – ou, mais precisamente, retomar o poder central para a turminha do progressismo trans.
Em outras palavras, os rebeldes de festival que pagam 500 pratas por um ingresso gritavam por uma virada de mesa a favor de quem esfolou o povo. Não esse povo imaginário que eles defendem, mas o povo que jamais passará nem na porta do Rock in Rio, muito menos participará de protesto fashion bem na hora que o emprego começa a reaparecer.
Os heróis dos revolucionários de auditório são personagens como Rodrigo Janot, que alegrou a criançada com sua brincadeira de arco e flecha enquanto conspirava com os açougueiros biônicos do PT. Janot e os rebeldes de festival deram à delinquência de Dilma Rousseff uma anistia comovente. A regente do petrolão, com seus e-mails de obstrução à Lava Jato esfregados na cara do país, não mereceu flechadas verdadeiras nem gritinhos da plateia.
O Rock in Rio 2017, com suas claques colegiais regidas por cantores decadentes – desesperados por um pouco de charme ideológico –, sintetizou a covardia fantasiada de bravura: todos passando aquele perfuminho de rebeldia para pertencer a um levante imaginário da esquerda popular contra a direita elitista. Todos, portanto, atrás do mesmo véu que protegeu o deputado petista flagrado comprando sua eleição no próprio PT – o último milagre da narrativa coitada.
A má notícia, companheiros perfumados, é que essa barulheira demagógica vai morrer dentro de sua própria bolha. A trilha sonora desse festival deveria ter sido cerimoniosamente solicitada ao Roger do Ultraje a Rigor: a gente somos inútil!
04 de outubro de 2017
Guilherme Fiuza, Revista Época
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