Teorias da conspiração são muito atraentes e divertidas, fica difícil resistir. O caso da morte do ministro Teori Zavascki, por sua atuação na Lava Jato, despertou as mais surpreendentes teorias, que se transformaram numa novela nacional. A polêmica chegou a motivar a realização de uma pesquisa, que sinalizou apoio de 83% dos brasileiros à tese de um atentado, defendida também por grande número de jornalistas.
DESESPERO DA FAMÍLIA – Essas especulações, que jamais tiveram base em evidências reais, foram alimentadas pela própria família. Como se sabe, o advogado Francisco Prehn Zavascki, filho do ministro-relator da Lava Jato, exigiu rigorosa investigação: “Ele demonstrou bastante preocupação com o que vinha. Ele realmente estava muito preocupado com o que tinha para acontecer. Ele teve acesso a informações que tinham deixado ele bastante preocupado com o futuro das coisas”.
Delci Zavascki Salvadori, irmã do ministro, reforçou as afirmações do sobrinho. “Tenho medo de que possa ter muita coisa por trás. Quero que façam uma boa investigação”, disse, acrescentando: “A nossa família sempre esteve muito preocupada com o trabalho dele na Lava Jato, mas o Teori sempre nos dizia para ter calma, porque andava com muitos seguranças”, declarou ao repórter Ciro Campos, do Estadão, ao lado do marido Alvor Salvadori e do filho Felipe.
“A gente se falava por telefone quase toda semana. O Teori sempre demonstrou estar tranquilo, nunca me pareceu inseguro sobre possíveis riscos”, relembrou, aos prantos.
FOI UM ACIDENTE – O precário aeroporto de Paraty é pequeno, cercado de morros. No momento da queda chovia bastante. Não havia copiloto para acompanhar o altímetro, controlar inclinação e tentar visualizar a pista. O piloto tinha de fazer tudo sozinho. Tentou pousar, não conseguiu, quando fez o retorno para nova tentativa, estava voando baixo demais e perdeu o controle do avião.
Houve importantes testemunhas, como o turista capixaba Lauro Koheler, que tinha alugado um barco e até tentou socorrer as vítimas. Ele e a mulher descreveram em detalhes a queda do avião. Confirmaram que não havia condições de visibilidade para pouso, ficou claro que se tratava de um acidente.
O Jornal Nacional então fez uma impressionante cobertura, ouvindo as testemunhas e vários especialistas da Aeronáutica. Mesmo assim, as teorias da conspiração continuaram a dominar a internet, sustentadas apenas no fato de Zavascki ser relator da Lava Jato e na declaração de um pescador que teria visto uma fumaça saindo da asa, mas é claro que isso não ocorreu. Com a chuva forte que caía, se houvesse fumaça, dificilmente seria perceptível.
VIAGEM SECRETA – Agora surge a confirmação de que a hipótese do atentado está definitivamente descartada. Motivo: o ministro Zavascki, um homem fechado e discretíssimo, manteve sob sigilo absoluto a viagem para o longo fim de semana em Paraty. Não constava da agenda, não informou à Segurança do Senado nem comunicou a nenhum membro da família. Pelo contrário, mandou sua assessoria informar à imprensa que ele interrompera as férias para decidir a homologação da delação da Odebrecht. Por isso, quando o avião caiu, foi uma enorme surpresa, pensava-se que o relator estava em Brasília, trabalhando.
O sigilo era tamanho que nem mesmo os dois seguranças sabiam da viagem. Eles apenas acompanharam o ministro até o aeroporto do Campo de Marte, em São Paulo, mas não tinham a menor ideia de que ele iria a Paraty, tampouco tinham sido avisados de que embarcaria no King Air do empresário Carlos Alberto Filgueiras.
As redes sociais insistem em dizer que todo mundo sabia da viagem, porque o nome de Zavascki estaria previamente na lista de passageiros. Mas é conversa fiada. No Campo de Marte, que só tem vôos de táxis aéreos e particulares, a relação de quem está a bordo pode ser informada pouco antes da decolagem, e não haveria tempo para sabotagem.
UMA IMPOSSIBILIDADE – Bem, se ninguém sabia com antecedência sobre essa secretíssima viagem, como pode ter havido um atentado? Quem teria adivinhado que o ministro embarcaria no Campo de Marte? E como alguém saberia que ele iria naquele avião? Portanto, comprova-se indiscutivelmente que não houve atentado, porque há uma impossibilidade factual.
O que continua obscuro, de fato, é o relacionamento íntimo de um ministro do Supremo como um empresário cuja fortuna começou na exploração de garimpeiros miseráveis em Serra Pelada. Também se torna intrigante a viagem prazerosa de dois homens e duas mulheres – enredo perfeito para o genial diretor Claude Lelouch fazer um novo filme, em apimentada versão sexagenária, claro.
Em homenagem à memória de Teori Zavascki, sua família deveria passar a torcer para que não haja uma investigação rigorosa. É melhor deixar as coisas como estão e nem tentar saber o que realmente aconteceu – ou iria acontecer.
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PS – É óbvio que as teorias conspiratórias hão de prosseguir. Afinal, ainda podem alegar que o avião caiu porque alguém serrou a rebimbaca da parafuseta do flap esquerdo. Aliás, é até bom que a polêmica se mantenha. Afinal, sem essas discussões que não levam a nada, a vida certamente perde a graça. (C.N.)
PS – É óbvio que as teorias conspiratórias hão de prosseguir. Afinal, ainda podem alegar que o avião caiu porque alguém serrou a rebimbaca da parafuseta do flap esquerdo. Aliás, é até bom que a polêmica se mantenha. Afinal, sem essas discussões que não levam a nada, a vida certamente perde a graça. (C.N.)
23 de janeiro de 2017
Carlos Newton
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