O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes criticou duramente a decisão do Senado de votar separadamento o impeachment e a manutenção dos direitos da ex-presidente Dilma Rousseff de exercer funções públicas. Os senadores afastaram Dilma em definitivo, por 61 votos a 20. Numa outra votação, logo em seguida, o plenário decidiu, porém, que a ex-presidente continua tendo direito a ocupar cargos públicos.
Juristas vêm criticando o rito adotado. Afirmam que o político alvo do impeachment, automaticamente, fica impedido de assumir tais funções por oito anos. O processo de afastamento no Senado foi comandado pelo presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski.
Na manhã desta quinta, o ministro Gilmar Mendes classificou como “bizarra” a separação das duas votações. “O que se fez lá foi um DVS (destaque para votação em separado), não em relação à proposição que estava sendo votada, mas em relação à Constituição, o que é, no mínimo, pra ser bastante delicado, bizarro”, opinou o ministro.
PROVA DOS NOVE – “Vejam vocês como isso é ilógico: se as penas são autônomas, o Senado poderia ter aplicado à ex-presidente Dilma Rousseff a pena de inabilitação, mantendo-a no cargo. Não passa na prova dos 9 do jardim de infância do direito constitucional. Do ponto de vista da solução jurídica, parece realmente extravagante”, considerou Mendes. Na avaliação do magistrado, porém, caso tenha de julgar o tema, o Supremo não determinará o cancelamento da sessão do Senado.
Apesar do Legislativo ter concluído o processo de impeachment, ainda não está claro se Dilma poderá disputar cargos eletivos ou será barrada pela Lei da Ficha Limpa. A respeito dessa questão, Mendes, que preside o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), preferiu não se pronunciar. “Isso vai ser discutido oportunamente, se ela se apresentar como candidata ao TSE”, afirmou.
O ministro deu a entender que Dilma e seus aliados não seriam favoráveis à manutenção dos direitos de ocupação de cargos públicos, caso o réu no processo do Senado fosse um adversário político. “Eu não sei também se os beneficiados dessa decisão ou por essa decisão teriam a mesma contemplação com os seus adversários”, concluiu Mendes.
FICHA LIMPA – O presidente do TSE voltou a comentar a Lei da Ficha Limpa. No dia 17 deste mês, durante um julgamento no Supremo, Mendes disse que esse tópico da legislação parecia ter sido elaborada por “bêbados”, de tão mal feita.
Desta vez, Mendes reiterou sua opinião e afirmou que não pretendia ofender os bêbados. “Não queria ofender os Alcoólatras Anônimos nem os bêbados. Eu falei que essa lei tinha sido feita por pessoas não muito lúcidas, por conta desses problemas todos”, disse.
INELEGÍVEL – Para outro ministro do STF, o decano Celso de Mello, as duas questão são indissociáveis e, ao sofrer o impeachment, o ex-presidente da República fica proibido não só de assumir cadeiras públicas, como de disputar eleições.
“[…] a sanção constitucional (do impeachment) tem uma estrutura unitária porque compreende globalmente, de um lado, a medida de destituição ou privação do mandato, e, de outro lado, como uma natural consequência da destituição, a inabilitação temporária por oito anos para qualquer outra função pública eletiva ou de nomeação”, considera o magistrado.
Mello evitou desqualificar as decisões do Senado, mas disse que o processo, como foi votado, parece “não muito ortodoxo”.
“Isso significa que a sanção constitucional é una e, sendo una, é incindível. Portanto, parece não muito ortodoxo que tenha havido tratamento autônomo como essa separação de duas medidas, que, na verdade, mutuamente, interagem”, afirmou.
CAMINHO INVERSO – Assim como Mendes, o decano fez o caminho inverso, exemplificando o que ocorreria se Dilma tivesse sido absolvida pelos parlamentares.
“Se absolvido, o presidente ou a presidente da República, obviamente, não lhe será imposta a sanção principal, que é a sanção destitutória. Consequentemente, não se cogitará da outra medida secundária, que é uma consequência natural e necessária da primeira. Portanto, não havendo a sanção principal, não há de ser cogitada a sanção secundária”, acrescentou.
“Não tem sentido dispensar tratamento autônomo, de tal modo que, condenando-se a presidente à destituição do mandato, abster-se o Senado de impor, por quaisquer razões, a segunda medida”, disse Mello.
02 de setembro de 2016
Gabriel Mascarenhas
Folha
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