Um pesquisador carioca, Bruno Gomide, encontrou semelhanças entre um texto de 1936 do ensaísta alemão Walter Benjamin (1892-1940) e outro, de 1942, do austríaco-brasileiro Otto Maria Carpeaux (1900-1978), a respeito de certo escritor russo. Ainda que a contragosto, Gomide arrisca que Carpeaux —que veio para o Brasil em 1939, fugindo do nazismo — teria plagiado Benjamin, então desconhecido por aqui. E que isso pode pôr sob suspeita toda a monumental obra crítica de Carpeaux.
Será? Há tempos, revirando velhas pastas de recortes, saiu-me uma crônica de Carlos Heitor Cony, de 1962 ou 63, no “Correio da Manhã”, intitulada “Eruditos & eruditos”. Nela, Cony fala de dois colegas do “Correio”: Carpeaux, então articulista do jornal, e o poeta e editorialista José Lino Grünewald.
Cony conta como José Lino, todos os dias, antes de ir trabalhar, varejava os sebos da rua São José e sempre chegava ao jornal com um livro de autor desconhecido, de qualquer época e em qualquer língua. Ao mostrá-lo a Carpeaux, este dizia que já o conhecia, resumia o seu conteúdo e derramava erudição sobre o autor. E, quando José Lino ia conferir, batia com tudo que Carpeaux dizia.
Até que José Lino descobriu uma preciosidade: um livrinho em francês, “Pages Choisies”, de um ensaísta alemão de quem ele nunca ouvira falar: Walter Benjamin. Folheou-o, impressionou-se e levou o livro para o jornal. Logo ao chegar, disparou: “Carpeaux, você conhece Walter Benjamin?”. Carpeaux respondeu: “Conheço. Era meu amigo”. E deu-lhe mais uma aula.
Não sei se Carpeaux plagiou Benjamin. Só sei que foram contemporâneos e dividiam as mesmas rodas na Berlim e na Paris dos anos 30. E, se eram amigos, quem sabe não dividiam também as mesmas admirações, os mesmos conceitos e até as mesmas palavras?
02 de setembro de 2016
Ruy Castro
Folha
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