Delatores da Operação Lava Jato afirmam ter usado contratos de patrocínio da Stock Car, principal categoria do automobilismo nacional, para lavar dinheiro que seria usado para pagar propina no âmbito da Petrobras. O caminho do dinheiro, segundo as delações, passava por Adir Assad, empresário já condenado na Lava Jato e alvo de três operações da PF no último mês. Ele era proprietário de uma empresa de marketing com atuação na categoria e também o principal parceiro de uma escuderia em uma divisão de acesso da modalidade.
Grandes empreiteiras estamparam por anos suas marcas em carros da categoria, apesar de essas empresas não costumarem fazer despesas com publicidade.
Segundo Ricardo Pessoa, dono da construtora UTC e delator desde 2015, uma das maneiras de justificar o dinheiro usado para pagar propina era superfaturar os valores de patrocínio intermediados pela empresa Rock Star, de Assad. O volume excedente pago à empresa era “devolvido” e usado para pagamentos ilegais de ex-diretores da estatal e políticos.
“O valor combinado era entregue em espécie por algum emissário de Adir Assad”, disse Pessoa em seu acordo de delação, de acordo com a transcrição.
DINHEIRO VIVO – Outro delator da Lava Jato, Ricardo Pernambuco, sócio da Carioca Engenharia, também afirmou que obtinha dinheiro em espécie para pagamentos por meio de contratos simulados com Assad.
Pernambuco apresentou como uma das provas um contrato firmado em 2009, no valor de R$ 820 mil, para patrocínio do piloto Murillo Macedo Filho na categoria Stock Car Light.
Na 31ª fase da Operação Lava Jato, deflagrada no começo do mês, também foram anexados aos autos notas fiscais de pagamentos do grupo Schahin, que possui banco e construtora, para a Rock Star.
Nessas notas, que somam valores de R$ 3,5 milhões, a justificativa de pagamento era patrocínio para a J.Star Racing, equipe associada a Assad que competia na categoria Copa Montana. O responsável pela escuderia é Murillo Macedo.
FUNDOS DE PENSÃO – Um outro patrocinador do time de corrida era o Trendbank, que administrava fundos de pensão e que foi investigado em CPI neste ano por prejuízos na gestão de recursos de funcionários da Petrobras e dos Correios.
Uma quebra de sigilo da Rock Star na Lava Jato mostrou que o banco foi o maior financiador da firma de Assad, com R$ 28 milhões pagos entre 2007 e 2013, o equivalente a 13% de tudo que a empresa recebeu desde a sua fundação.
Para comprovar o que contou, o empreiteiro Ricardo Pessoa apresentou uma série de notas fiscais e até um contrato de patrocínio firmado por meio da Rock Star. Nesse contrato, a empreiteira se comprometia a pagar à firma de Assad R$ 4 milhões por patrocínio e ações de marketing relacionadas ao piloto Allam Khodair na temporada de 2012.
NO NÍVEL DE NEYMAR – Para o especialista em marketing esportivo Amir Somoggi, um valor como esse está muito acima da média de patrocínios para modalidades fora do futebol, em um patamar do nível do jogador Neymar, esportista de maior visibilidade do país.
“A maior parte do bolo das verbas de patrocínio no Brasil vai para o futebol e a menor é pulverizada entre todas as outras modalidades esportivas”, diz.
Uma das notas fiscais emitidas pela Rock Star para pagamentos da UTC informa que o patrocínio era relacionado ao maior campeão da Stock Car, Ingo Hoffmann. Mas não há investigação relacionada aos esportistas.
A primeira menção à competição de automobilismo na Operação Lava Jato foi feita ainda em 2014, pelo doleiro Alberto Yousseff, delator da investigação.
Ele disse que a Tomé Engenharia, que também mantinha patrocínio na Stock Car, fazia pagamentos de propina por meio de uma empresa “ligada ao ramo de corridas”. A Tomé também foi uma das maiores financiadoras da Rock Star.
TRÊS OPERAÇÕES – Adir Assad foi alvo de três operações da PF nas últimas semanas: a Saqueador, relacionada ao empresário Carlinhos Cachoeira e a construtora Delta, a Pripyat, sobre suposta propina Eletronuclear, e a fase 31 da Lava Jato. Suas empresas receberam pagamentos que somaram R$ 1,2 bilhão no período analisado pela quebra de sigilo, a partir de 2005.
No início do ano, o então senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS), cassado em maio, disse, em acordo de delação, que Assad gerenciava o caixa dois na campanha de Dilma Rousseff à Presidência em 2010, o que ela nega.
O Ministério Público paulista também o denunciou neste ano sob suspeita de participação em desvios em obras do governo do Estado, administrado pelo PSDB.
25 de julho de 2016
Felipe Bächtold
Folha
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