Depois da reportagem da Natuza Nery e Marina Dias, Folha de São Paulo de domingo, revelando a forte insatisfação da presidente Dilma Rousseff em relação ao posicionamento do ministro José Eduardo Cardozo no episódio da publicação das declarações do empresário Ricardo Pessoa pela Polícia e o Ministério Público Federal, parece lógico que o titular da Justiça não tenha outro caminho a não ser o de deixar a Pasta da Justiça e, portanto, sair do governo. A reportagem revela a profunda contrariedade da presidente da República para com o ministro da Justiça culpando-o de não ter agido junto ao ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal, para que adiasse a delação premiada do proprietário da UTC e presidente do Clube das empreiteiras para os contratos da Petrobrás.
Claro que a exigência de Dilma Rousseff era impossível na prática, mas o problema de Eduardo Cardozo não está nesse ponto. Encontra-se na insatisfação demonstrada pela chefe do Executivo quanto ao seu comportamento político. Como ele exerce um cargo de absoluta confiança, evidentemente esta confiança foi retirada, ou, pelo menos projetada para um plano secundário.
A situação de Cardozo, em decorrência da matéria publicada pela Folha de São Paulo, se agrava porque ele terá que depor nesta semana no Tribunal Superior Eleitoral a respeito das doações feitas por Ricardo Pessoa à Campanha de Dilma Rousseff para sua reeleição. Que poderá dizer? Que elas não existiram? É possível que estejam legalmente formalizadas. Mas a questão essencial não é esta.
ORIGEM DOS RECURSOS
Doações podem estar formalmente declaradas ao TSE, mas isso não quer dizer que seja legítima a origem dos recursos e muito menos quanto a forma deles terem sido obtidos. Há ainda um outro aspecto envolvendo a questão das doações de modo geral. Não se trata do registro ou não de seus recebimentos junto ao Tribunal Superior Eleitoral. É necessário confrontar os valores das doações feitas com os valores citados por aqueles que as receberam.
Se os totais parciais não coincidirem é porque as diferenças tiveram outro destino que não o financiamento das campanhas políticas. É preciso considerar se seguiram a legislação eleitoral que impõe que elas sejam praticadas somente através de dois caminhos: o cheque nominal cruzado, ou então depósito bancário efetuado na conta receptora. Portanto torna-se fácil verificar se houve ou não convergência dos valores ou o respeito às normas fixadas na lei 9504/97.
SUBSTITUIÇÃO
Mas agravando a tensão que envolve o até agora ministro da Justiça, há ainda o problema de seu comparecimento a CPI sobre a Petrobrás nos próximos dias, na Câmara Federal. Sua convocação resultou de um acordo entre as bancadas do PT e da oposição, para que seu comparecimento substituísse o dos ministros Edinho Silva e Aloizio Mercadante. Antes de focalizar o estranho caso da substituição, tem-se a impressão de que o comparecimento de Cardozo reveste-se de um risco duplo: de um lado a insatisfação do governo por não ter impedido a divulgação pela Veja da entrevista de Ricardo Pessoa; de outro a pressão das oposições que vão certamente lhe cobrar esclarecimentos sobre a insatisfação de que teria sido alvo pela presidente Dilma Rousseff, conforme publicaram as repórteres Natuza Nery e Marina Dias. O problema do comparecimento de Eduardo Cardozo a CPI, entretanto não termina ainda neste ponto.
NÃO HÁ DECISÕES DEFINITIVAS
Pois é preciso considerar que a troca de sua presença pelas de Edinho Silva e Mercadante tenha sido apenas um episódio e não uma decisão final da própria CPI. Vai depender do que Eduardo Cardozo disser à Comissão Parlamentar de Inquérito, é possível que depois de seu depoimento a CPI volte a exigir também depoimentos de Edinho Silva e Aloizio Mercadante, partindo-se do princípio de que em política, especialmente no meio da tempestade, não existem decisões definitivas.
Diante de todo esse quadro o que parece ser definitivo é o afastamento de Eduardo Cardozo do governo, inicialmente previsto para setembro, mas que pode ser antecipado pelos fatos que ocorrerem nos próximos dias. Depois das acusações a ele por parte da presidente da República, ele perdeu a condição de permanecer na equipe do Palácio do Planalto. Será um desembarque a mais no meio de uma tormenta.
14 de julho de 2015
Pedro do Coutto
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