"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 4 de julho de 2015

AQUELE MALDITO CAFEZINHO


Nos tempos bicudos do Estado Novo, Aparício Torelli, o Barão de Itararé, estava preso há quatro meses na Casa de Correção, no Rio, sem ter sido interrogado nem recebido qualquer comunicação judicial. Ele e mais alguns adversários do regime. Informado, o ministro Castro Nunes, do Supremo Tribunal Federal, decidiu resolver a situação e foi à penitenciária.
Entrevistou-se com os presos, ouvindo deles ignorarem porque lhes havia sido tolhida a liberdade, sem processo nem culpa formada. Quando entrou na cela do Barão, recebeu resposta diferente e singular: “A responsabilidade de minha prisão deveu-se àquele maldito cafezinho!”
O ministro zangou-se, disse não aceitar brincadeiras, mas o sarcástico jornalista insistiu pedindo para demonstrar. Contou que estava em seu gabinete, no jornal de sua propriedade, quando teve vontade de tomar um cafezinho. Pegou o paletó, desceu até o botequim mais próximo e depois de pedir o cafezinho, ia levando a xícara aos lábios quando um investigador de polícia aproximou-se, botou a mão no seu ombro e disse “o senhor está preso!”
“Só pode ter sido aquele maldito cafezinho”, completou o Barão.
Essa historinha se conta a propósito dos deputados e senadores submetidos a inquérito policial sigiloso junto ao Supremo Tribunal Federal, como envolvidos no escândalo da Petrobras. Todos têm argumentado que os milhões recebidos de empreiteiras foram utilizados em suas campanhas eleitorais, com o devido registro na Justiça Eleitoral e de acordo com a lei.
Entendem-se perseguidos pelo procurador-geral da República. Não estão ainda presos, denúncias não foram apresentadas por Rodrigo Janot, por enquanto, tornando-se necessário provar, ou não, que os milhões recebidos deveram-se a trocas de favores ou mesmo que saíram dos cofres da Petrobrás. Muita gente reclama da lentidão dos inquéritos, apesar de o Supremo adotar seu ritmo próprio. Mesmo assim, bem que o espírito do ministro Castro Nunes poderia pairar sobre seus sucessores para decidir sobre a sorte dos parlamentares atuais.
Aparício Torelli estudava medicina, em Porto Alegre, antes de tornar-se Barão, pois não tinha havido a Revolução de Trinta nem o confronto de Itararé. Era mau aluno, interessava-se muito mais pela política, e no fim de um determinado ano foi prestar exame sem ter estudado nada. Naqueles idos havia vetusto cerimonial, com os professores instalados numa bancada alta e os alunos tremendo de medo, embaixo. Na hora do nosso personagem ser inquirido, foi um fracasso. Não respondeu coisa alguma, exasperando o pomposo mestre, que em determinado momento dirigiu-se ao contínuo postado a seu lado e ordenou: “José, traga um monte de capim!” O genial futuro jornalista completou: “E para mim um cafezinho…”
04 de julho de 2015
Carlos Chagas

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