"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

CLASSE MÉDIA BRADESCÃO


Com todo o forrobodó que o texto de uma escritora causou nas redes sociais tempos atrás, parei para pensar em minha própria relação com os planos de saúde. Não é só pobre que se deslumbra, não. Plano de saúde é sonho da classe média, logo depois de trabalho com carteira assinada.

Tem plano? Se o emprego tem plano é emprego bom.

O ápice da minha carreira profissional com carteira assinada foi trabalhar numa empresa que tinha Bradesco – Bradescão, para os funcionários. O dinheiro ninguém quer colocar lá no banco, mas o plano de saúde ninguém troca por Amil, Unimed, por nada desse mundo.

Quando você vai ao RH para assinar o contrato e saber sobre os benefícios que a empresa concede aos funcionários, na lista de importância, na MINHA lista de importância, sempre estiveram planos de saúde, cartão-alimentação e bônus. Nessa ordem.

Você sai do RH e quase grita um viva pro Bradescão. Nada é mais importante do que ter um plano de saúde que cubra Albert Einstein, Sírio Libanês, Samaritano e Pró-Mater. É o meu cenário de novela.

É tudo tão lindo, branco, de mármore, silencioso, com cheiro de desinfetante bom. Os médicos são tão educados, que eu tenho certeza que não vou morrer só de estar ali. Ninguém morre num hospital que parece cenário de novela. Acredito piamente nisso e perco a vontade de morrer na hora.

A gente tem tanto medo, mas tanto medo do SUS, que pode faltar qualquer coisa em casa, menos o plano. Uma amiga, demitida, cortou manicure, massagista, faxineira, jantarzinho, penhorou as joias, vendeu tudo que comprou em Miami nas últimas férias. Ficou infeliz, mas não ficou sem plano.

Entendo e me identifico com o pobre descrito no texto excomungado. Sou classe média, mas tenho os mesmos sintomas. De um tempo pra cá sempre acho que a pressão está alta e vou ter um treco. Mas como todo e bom classe média, ando com um vidrinho de santa-tarja-preta na bolsa. Tudo fica tranquilo e o treco vai embora.

Mas ao frequentar bons hospitais não dá pra sair de casa para um exame ou para uma emergência com um moletom velho, uma chuca no cabelo e a cara amassada de travesseiro.

Numa das últimas vezes, dei de cara com um ex-namorado, que ficou com pena do meu abatimento. Só estava com sono e doente, mas da próxima vez não piso no ambulatório sem chapinha, corretivo e vestido bandage.

No SUS as pessoas não encontram nem médico, mas no hospital do plano você pode dar de cara até com ex-ministro. A emergência que espere.

Engordei 10 quilos, não consigo emagrecer e já sei de quem é a culpa. Da tireoide. Ou do antidepressivo. Como toda e boa classe média, parei de ter surtos, mas fiquei gorda. O metabolismo não deve estar no seu melhor.

Vou fazer uma bateria de exames. Eles devem apontar a razão do meu peso extra. Só espero que não vejam a porção de bacon com ovos do café da manhã de ontem. Vai dar tireoide, está na moda em todas as classes sociais.

E o que eu gosto de tirar sangue? Não vou pelo lanchinho, mas fico emocionada com o cardápio do Fleury, tantas são as opções. Com glúten, sem lactose, com culpa, sem emoção. Muito melhor do que aqueles biscoitinhos Bauducco, do Delbony.

Mas pra mim é sempre um sacrifício ficar três dias sem beber, 12 horas sem comer. Tudo muito chato. Quando me liberam, quero praticamente devorar um churrasco. Se topar com algum classe D descrito no texto amaldiçoado, vou me convidar pra laje.


Acabo com a fome e de quebra com essa frescurite de síndrome do pânico, a nova moda da classe média. Será que o plano cobre?

21 de maio de 2015
Mariliz Pereira Jorge

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