Um espetáculo de civismo, sem dúvida. Mas incompleto, apesar dos quase dois milhões de manifestantes que ganharam as ruas do país inteiro. Porque faltou cheiro de povo, nos protestos. A imensa maioria ensabonetada cheirava bem. Foi a classe média que ocupou Copacabana, por exemplo. Só que a Rocinha ficou em casa. Assim nas demais capitais. Trata-se de algo a ser examinado em profundidade, sem que dessa constatação surja o menor reparo a quantos protestaram contra Dilma e contra a corrupção. A exceção desprezível limitou-se às poucas faixas que pediam a volta à ditadura militar. Patetas que também dispõem do direito democrático de dizer o que pensam.
Foi impecável o comportamento das Polícias Militares. Nas raríssimas vezes em que precisou atuar, recebeu o apoio geral.
Lamentável, porém, registre-se a perplexidade do governo. Resta saber o que significaram as palavras do ministro da Justiça, empenhado em reduzir à reforma política a reação do poder público. Chegou a pregar a extinção total das contribuições empresariais nas campanhas eleitorais e a anunciar a tão ansiada legislação anticorrupção, mas deixou no vazio o principal significado das manifestações de domingo: por que a classe média rejeita o governo Dilma? Não será apenas porque sobre seus ombros pesa a maior fatura da incompetência da administração pública e do funcionamento das instituições.
Existe um fator pessoal nessa equação. Aliás, é o mesmo que fulminou Fernando Collor e agora Madame desperta com sua arrogância, presunção e ar de superioridade. A pouca atenção dada ao cidadão comum isola a presidente da República da classe média. O povão, que poderia agradecer a ela pelo assistencialismo, também é mantido à distância. Como não confia nas elites, sendo a recíproca verdadeira, a conclusão é de uma governante sozinha, apesar de reeleita.
NÚMEROS CONFLITANTES
Não dá para aceitar o conflito de números em São Paulo. A Polícia Militar estimou em um milhão de manifestantes na avenida Paulista. O Datafolha ficou em 220 mil. Alguém exagerou ou alguém omitiu.
17 de março de 2015
Carlos Chagas
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