"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 16 de setembro de 2014

POLÍTICA DO COTIDIANO, DO JORNALISTA CLAUDIO HUMBERTO

Varejo partidário

Multiplicação de pequenas legendas e provável fragmentação das bancadas no Congresso trará novos obstáculos a quem se eleger


Quem quer que saia vitorioso das eleições presidenciais deste ano terá de haver-se, provavelmente, com dificuldades de negociação no Congresso ainda mais intensas do que as que hoje se verificam.

Pelas projeções atuais, estima-se que será maior, no Senado, a pulverização das bancadas. Hoje, 16 legendas diferentes detêm poderes de barganha diante do Executivo. Calcula-se que, em 2015, o número passará a 18.

Na Câmara dos Deputados, não há como fazer prognósticos da mesma natureza. Líderes partidários acreditam, todavia, que a fragmentação aumentará --e, segundo reportagem do jornal "Valor Econômico", o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar considera que saltará de 22 para 28 o total de siglas nessa Casa.

É duvidoso que, mesmo na mais complexa das sociedades, o pensamento da população se divida em tantas visões de mundo.

O princípio da liberdade de organização, é claro, assegura que se possam reunir em partidos quaisquer cidadãos que assim o desejarem, não importando se banal ou bizarra a causa que os agrega.

O atual sistema acaba tendo o efeito, contudo, de premiar o surgimento de legendas artificiais. Obtendo uma parcela qualquer do horário eleitoral, não raro recorrem a nomes populares para prover-se de um excedente de votos.

Feita a bancada, vêm os benefícios: uma fatia do fundo partidário soma-se aos cargos de assessoria parlamentar e às verbas de gabinete. O negócio, entretanto, mal começou. Haverá de dar-se no trato com o Executivo.

Verdade que, muitas vezes, sobem ao Legislativo agremiações cuja inexpressividade eleitoral não é fruto do oportunismo, mas da intransigência ideológica.

A existência de minúsculas organizações de esquerda termina por sustentar, num ambiente ainda marcado pela memória da perseguição, a ideia de que seria contraproducente barrar seu acesso às vantagens de estar no Congresso.

O tema foi objeto de julgamento, em 2006, no Supremo Tribunal Federal. Na ocasião, argumentou-se que impor critérios rigorosos demais para a concessão de benefícios condenaria à inexistência partidos legítimos, com efeitos nocivos, ademais, para o direito de representação das minorias.

A necessidade de restringir para um teto razoável o número de partidos, no entanto, persiste, e deve ser cogitada no âmbito de uma reforma política mais ampla.

O sistema proporcional, a distribuição do horário gratuito, as coligações para cargos proporcionais e a obrigatoriedade do voto são fatores que contribuem para a criação de um varejo partidário que, no fundo, desserve o eleitor. Já bastante sacrificado, aliás, pelo oportunismo dos grandes partidos. Que, estes, operam no atacado.


16 de setembro de 2014
Editorial Folha de SP

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