"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

A KGB E O ASSASSINATO DE JFK: PROGRAMADO PARA MATAR


          Artigos - Desinformação        
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A conspiração do assassinato de Kennedy nascera – e jamais morreria. Em abril de 1977, Yury Andropov, chefe da KGB, informou o Politburo que a KGB estava lançando uma nova campanha de desinformação para implicar ainda mais “os serviços especiais americanos” no assassinato de Kennedy.


N.doT.: 
A entrevista abaixo foi publicada no site FrontPageMagazine em 3 de outubro de 2007. O editor Jamie Glazov entrevistou o general Ion Mihai Pacepa.

A Frontpage Interview hoje recebe o general Ion Mihai Pacepa, o oficial de inteligência de mais alta patente que desertou do bloco soviético.
Em 1989, o presidente romeno Nicolae Ceausescu e a esposa foram executados após um julgamento, onde a maior parte das acusações foram, palavra por palavra, tiradas do livro Red Horizons, de Pacepa.
Esta obra foi publicada em 27 países. O seu mais recente livro é Programmed to Kill: Lee Harvey Oswald, the Soviet KGB, and the Kennedy Assassination.


FP: General Ion Mihai Pacepa, bem-vindo ao Frontpage Interview.
Pacepa: É uma grande honra estar aqui. A sua revista é uma das poucas que entendem totalmente o Kremlin.
FP: Mr. Pacepa, você tem conhecimento direto dos laços da KGB com Oswald, e também teve acesso a documentos da KGB recentemente descobertos. Fale sobre a sua experiência de perito neste assunto e sobre as provas recentemente tornadas públicas. Fale também sobre as suas conclusões.
Pacepa: Moscou, é claro, não admitiu para nós, líderes representantes dos serviços de inteligência soviéticos, qualquer envolvimento no assassinato do presidente Kennedy. O Kremlin sabia que qualquer imprudência poderia dar início à Terceira Guerra Mundial. Mas, durante 15 anos da minha outra vida no topo do serviço de inteligência do bloco soviético, estive envolvido num esforço mundial de desinformação destinado a desviar a atenção do envolvimento da KGB com Lee Harvey Oswald, o marine americano que desertou para Moscou, retornou para os EUA e assassinou o presidente Kennedy.
Lançamos boatos, publicamos artigos e até mesmo livros insinuando que os culpados estavam nos EUA, não na União Soviética. A nossa máxima “prova” foi um bilhete endereçado a “Mr. Hunt”, datado de 8 de novembro de 1963, e assinado por Oswald, cujas cópias foram descobertas nos EUA em 1975. Sabíamos que o bilhete era falso, mas os peritos americanos em grafologia atestaram a sua autenticidade, e teóricos da conspiração o conectaram com o agente da CIA E. Howard Hunt, na época bem conhecido pelo escândalo de Watergate, e o usaram para “provar” o envolvimento da CIA no assassinato do presidente Kennedy.
Documentos originais da KGB existentes no Arquivo Mitrokhin, trazidos à luz na década de 1990, finalmente provaram que o bilhete fôra forjado pela KGB durante o escândalo de Watergate. O falso bilhete foi verificado duas vezes quanto à “autenticidade” pela Technical Operations Directorate (OTU) da KGB e liberado para ser usado. Em 1975, a KGB enviou, do México, três fotocópias do bilhete para entusiastas de teorias da conspiração nos Estados Unidos. [1] (O regulamento da KGB só permitia o uso de fotocópias dos documentos falsificados para evitar o exame meticuloso do original.)
Após o colapso da União Soviética, tive esperança de que os novos líderes em Moscou revelassem a mão da KGB por trás do assassinato do presidente Kennedy. Porém, em 1993, eles publicaram Passport to Assassination: the Never-Before-Told Story of Lee Harvy Oswald by the KGB Colonel Who Knew Him, um livro sustentando que uma investigação completa sobre Oswald não havia encontrado o mínimo indício do envolvimento soviético. [2] Os carrascos não se incriminam a si mesmos.
FP: Você pode dar detalhes sobre o Arquivo Mitrokhin?
Pacepa: Na década de 1990, o oficial da KGB aposentado Vasily Mitrokhin, ajudado pelo M16 britânico, contrabandeou de Moscou cerca de 25 mil páginas de documentos da KGB altamente confidenciais. Representam uma minúscula parte do arquivo da KGB, estimado em cerca de 27 bilhões de páginas (o arquivo da alemã oriental Stasi tinha cerca de 3 bilhões). Mesmo assim, o FBI descreveu o Arquivo Mitrokhin como “o mais completo e extenso arquivo de inteligência jamais recebido de qualquer fonte”. De acordo com este arquivo, o primeiro livro americano sobre o assassinato, Oswald: Assassin or Fall Guy?, que culpa a CIA e o FBI pelo crime, foi idealizado pela KGB. O autor do livro, Joachim Joesten, um comunista americano nascido na Alemanha, ficou cinco dias em Dallas após o assassinato, e em seguida foi para a Europa e sumiu de vista. Poucos meses depois, o livro de Joesten foi publicado pelo comunista americano Carlo Aldo Marzani (New York), que recebeu 80 mil dólares da KGB para produzir livros pro-soviéticos, mais 10 mil dólares por ano para divulgá-los agressivamente. Outros documentos do Arquivo Mitrokhin identificam o primeiro crítico americano deste livro, Victor Perlo, como um agente disfarçado da KGB.
O livro de Joesten foi dedicado ao americano Mark Lane, descrito no Arquivo Mitrokhin como um esquerdista que recebeu dinheiro anonimamente da KGB. Em 1966, Lane publicou o best-seller Rush to Judgment, alegando que Kennedy havia sido morto por um grupo americano direitista. Estes dois livros encorajaram as pessoas com algum conhecimento minimamente relacionado com a matéria a entrar na briga. Cada qual via os acontecimentos da sua própria perspectiva, mas todos acusavam grupos americanos pelo crime. O representante do distrito de New Orleans, Jim Garrison, olhou ao redor do seu distrito doméstico e em 1967 prendeu um homem do lugar, a quem acusou de conspiração com os grupos da inteligência americana para assassinar Kennedy e assim parar os mais recentes esforços de acabar com a Guerra Fria. O acusado foi inocentado em 1969, mas Garrison apegou-se à sua história, escrevendo primeiramente A Heritage of Stone (Putnam, 1970) e por fim publicando On the Trail of the Assassins (Sheriden Square, 1988), um dos livros inspiradores do filme JFK de Oliver Stone.
A conspiração do assassinato de Kennedy nascera – e jamais morreria. De acordo com outro documento, em abril de 1977, Yury Andropov, chefe da KGB, informou o Politburo que a KGB estava lançando uma nova campanha de desinformação para implicar ainda mais “os serviços especiais americanos” no assassinato de Kennedy. Infelizmente, o Arquivo Mitrokhin silencia sobre o assunto daí em diante.
FP: Você descobriu documentos escritos pessoalmente pelo assassino, Lee Harvey Oswald, sugerindo que ele estava ligado ao departamento da KGB para assassinatos no exterior e que voltou aos Estados Unidos vindo da União Soviética apenas temporariamente, em missão. Duas investigações federais e mais de 2500 livros analisaram o assassinato mas ninguém tocou neste assunto. Por quê?
Pacepa: Porque nenhum dos investigadores ou pesquisadores estavam suficientemente familiarizados com as práticas e códigos de operação da KGB. O FBI recentemente disse ao Congresso americano que somente um interlocutor árabe nativo pode captar os sutis detalhes da uma interceptação telefônica da al-Qaida – especialmente ligações com a dupla linguagem de inteligência. Passei 23 anos da minha outra vida falando por meio destes códigos. Até mesmo a minha própria identidade era codificada. Em 1955, quando me tornei oficial da inteligência estrangeira, fui informado que dali em diante o meu nome seria Mihai Podeanu, e Podeanu permaneci até 1978, quando rompi com o comunismo. Todos os meus subordinados – e todos os demais oficiais de inteligência estrangeira do bloco soviético – usavam códigos nos relatórios escritos, ao falar com as suas fontes e até mesmo nas conversas com os seus próprios colegas. Quando deixei a Romênia para sempre, o meu serviço de espionagem era a “universidade”, o líder do país era o “Arquiteto”, Viena era “Videle” e assim por diante.
Em uma entrevista publicada nos EUA, o general da KGB, Boris Solomantin, durante muito tempo representante-chefe do PGU (inteligência estrangeira soviética) disse:

“não me considero um homem que conhece tudo sobre inteligência – como alguns oficiais deste Primeiro Departamento [isto é, do PGU], escritores tentando se mostrar. Em inteligência e contrainteligência somente o homem que está chefiando estes serviços conhece tudo. Estou dizendo isto porque todas as questões sobre criptografia e máquinas de criptografia estavam sob responsabilidade de outro departamento – em uma diretoria fora da minha, similar à sua National Security Agency”. [3]
Durante os meus últimos dez anos na Romênia, também gerenciei o equivalente do país à NSA, e me familiarizei com os sistemas de codificação usados por todo o serviço de inteligência do bloco soviético. Este conhecimento me permitiu perceber que as aparentemente inócuas cartas de Oswald e da sua esposa soviética para a embaixada soviética em Washington, D.C. (disponibilizadas para a Warren Commission) eram mensagens veladas para a KGB. Nelas, encontrei a prova de que Oswald havia sido enviado para os EUA em missão temporária, e que ele planejava retornar para a impenetrável União Soviética após a conclusão da sua tarefa.
Levei muitos anos para separar o joio do trigo enquanto percorria as pilhas de relatórios de investigação gerados pela morte violenta do jovem presidente americano, mas, quando terminei, estava enfeitiçado pela abundânica de impressões digitais da KGB em toda a história de Oswald e do seu assassino, Jack Ruby.
FP: Dê exemplos concretos.
Pacepa: Por exemplo, no bilhete escrito a mão em russo deixado por Oswald para a esposa soviética, Marina, pouco antes de tentar assassinar o general americano Edwn Walker, que serviu como um ensaio para o assassinato do presidente Kennedy. Aquele importantísimo bilhete contém dois códigos da KGB: amigos (código para oficial de suporte) e Cruz Vermelha (código para ajuda financeira). No bilhete, Oswald diz a Marina o que fazer caso ele fôsse preso. Ele reforça que ela deve entrar em contato com a “embaixada” (soviética), que eles têm “amigos aqui” e que a “Cruz Vermelha” vai ajudá-la financeiramente. De particular importância é a instrução de Oswald para ela “mandar para a embaixada a informação do que aconteceu a mim”. Na época, o código para embaixada era “escritório” mas parece que Oswald queria ter certeza de que Marina iria entender que ela devia informar imediatamente a embaixada soviética. É de se notar que Marina nao mencionou este bilhete às autoridades americanas após a prisão de Oswald. Ele foi encontrado na casa de Ruth Paine, uma amiga americana com a qual Marina estava no momento do assassinato.
FP: Segundo a conclusão da Warren Commission e do House Select Committee on Assassinations, Oswald não tinha a menor conexão com a KGB. Mas, de acordo com o seu livro, Oswald encontrou-se secretamente com um oficial do departamento de assassinatos da KGB na Cidade do México poucas semanas antes de matar o presidente Kennedy. Qual a prova disso?
Pacepa: Há muitas evidências sutis provando a conexão de Oswald com a KGB. Um indício tangível é a carta enviada por ele à embaixada soviética em Washington poucos dias antes de se encontrar com o “Camarada Kostin” na Cidade do México. A CIA identificou Valery Kostikov como um oficial do 13° Departamento da PGU para “wet affairs” (expressão na qual wet é um eufemismo para sangrento). Um rascunho escrito à mão daquela carta foi encontrada entre os pertences de Oswald após o assassinato. A já mencionada Ruth Paine testemunhou que Oswald reescreveu aquela carta diversas vezes antes de datilografá-la na máquina de escrever dela. Marina garantiu que ele “redatilografou o envelope dez vezes”. Era importante para ele. Uma fotocópia da carta final enviada por Oswald para a embaixada soviética foi recuperada pela Warren Commission. Deixe-me citar algumas frases daquela carta, na qual eu também inseri, entre parênteses, a versão antes rascunhada por Oswald:
“Isto é para informar você dos eventos recentes desde as minhas reuniões com o camarada Kostin [no rascunho: “sobre novos eventos desde as minhas entrevistas com o camarada Kostine”] na embaixada da União Soviética, Cidade do México, México. Não pude permanecer no México [riscado no rascunho: “porque considerei desnecessário”] indefinidamente devido às restrições do meu visto mexicano, de apenas 15 dias de duração. Não tive a chance de pedir um novo visto [no rascunho: “solicitando uma prorrogação”] a não ser usando o meu nome real, por isso voltei para os Estados Unidos.”
O fato de Oswald ter usado um codinome operacional para Kostikov confirma, para mim, que tanto a sua reunião com Kostikov na Cidade do México como a sua correspondência com a embaixada soviética em Washington foram conduzidas em um contexto operacional da PGU. O fato de Oswald não ter usado o seu nome real para obter o visto mexicano confirma esta conclusão.
Agora, vamos sobrepor esta carta combinada ao guia gratuito Esta Semana – de 28 de setembro a 4 de outubro de 1963, e a um dicionário Castelhano-Inglês, ambos encontrados entre os pertences de Oswald. O guia tem o número de telefone da embaixada soviética sublinhado, os nomes Kosten e Oswald anotados em cirílico na página listando os “Diplomatas no México” e, na página anterior, marcas de verificação perto de cinco cinemas. [4] Atrás do dicionário Castelhano-Inglês, Oswald escreveu: “comprar ingressos [plural] para a tourada” [5] e a praça de touros Plaza México está circulada no mapa da Cidade do México. [6] O Palácio de Belas Artes, local predileto dos turistas que se juntam aos domingos de manhã para assistir o Balé Folclórico, também está marcado no mapa de Oswald, [7].
Ao contrário do que Oswald informou, ele não foi visto na embaixada soviética em nenhum momento durante a sua estadia na Cidade do México – a CIA tinha câmeras de vigilância na entrada da embaixada na época. [8] Resumindo: todos os fatos acima, reunidos, sugerem para mim que Oswald recorreu a uma reunião não programada, ou “iron meeting” – zheleznaya yavka, em russo – para uma conversa urgente com Kostikov na Cidade do México. A “iron meeting” era um procedimento padrão da KGB para situações de emergência: “iron” significava firme ou inalterável.
Na minha época eu aprovei muito poucas “iron meetings” na Cidade do México (local favorito para o contato com nossos agentes importantes morando nos EUA) e a reunião “iron meeting” de Oswald parece, para mim, uma “iron meeting” típica. Ou seja, um breve encontro em um cinema para marcar uma reunião para o dia seguinte nas touradas (na Cidade do México, elas acontecem às 4h30 na tarde do domingo); um encontro breve em frente do Palácio de Belas Artes para passar para Kostikov um dos ingressos comprado por Oswald para a tourada; e uma longa reunião para discussão na tourada de domingo.
Não posso, é claro, ter certeza de que tudo aconteceu exatamente desta forma – cada oficial de apoio tem as suas próprias peculiaridades. Mas independentemente de como eles possam ter entrado em contato, é claro que Kostikov e Oswald se encontraram secretamente naquele fim de semana de 28 e 29 de setembro de 1963. Na terça-feira seguinte, ainda na Cidade do México, ele telefonou para a embaixada soviética a partir da embaixada cubana e pediu ao guarda em serviço para conectá-lo com o “Camarada Kostikov” com o qual ele “conversou em 28 de setembro”. Aquele telefonema foi interceptado pela CIA.
FP: Cada partido comunista era gerenciado por um politburo ao estilo soviético, todos os exércitos do bloco soviético usavam o mesmo uniforme, cada força policial do Leste Europeu foi substituída por uma milícia ao estilo soviético. Como este padrão soviético refletiu no serviço de inteligência do bloco?
Pacepa: “Tudo o que você verá aqui é idêntico ao que eu vi no seu serviço” disse-me Sergio del Valle – Ministro do Interior cubano e chefe geral da segurança nacional e da inteligência estrangeira – quando me apresentou para os dirigentes do serviço de espionagem cubano, o DGI. [9] Até mesmo o treinamento dos oficiais do DGI era baseado nos mesmos manuais recebidos da PGU por nós, do serviço de espionagem romeno, o DIE – Departamentul de Informatii Externe.
Sim, a inteligência soviética, como o governo soviético em geral, tinha uma forte propensão por padrões. Pela sua própria natureza, a espionagem é um empreendimento enigmático e dúbio, mas nas mãos dos soviéticos desenvolveu-se e virou uma filosofia completa, onde cada aspecto tinha o seu próprio conjunto de regras testadas e precisas e seguia um padrão fixo.
Durante os muitos anos que passei pesquisando os laços de Oswald com a KGB, peguei as informações reais e verificáveis sobre a sua vida desenvolvidas pelo governo americano e pesquisadores independentes relevantes, e as examinei à luz dos padrões operacionais da PGU – pouco conhecidos por estrangeiros devido ao absoluto segredo então – como hoje – endêmico na Rússia. Novos insights sobre o assassinato de repente ganharam vida. As experiências de Oswald como marine servindo no Japão, por exemplo, se encaixaram perfeitamente no padrão da PGU para recrutar membros das forças armadas americanas fora dos Estados Unidos que, por muitos anos, eu apliquei nas operações romenas. Também ficou óbvio que o armário no terminal de ônibus usado por Oswald em 1959, após retornar aos EUA vindo do Japão, para depositar uma mochila de lona cheia de fotografias de aviões militares americanos, era de fato uma intelligence dead drop [N do T: local onde duas pessoas de um serviço secreto podem colocar e retirar objetos sem precisar se encontrar]. [10] Durante aqueles anos o uso de tais armários era moda na PGU – e no DIE.
As operações da espionagem soviética podem ser separadas de acordo com padrões, se você estiver familiarizado com elas. Os peritos em contrainteligência chamam estes padrões de “evidência operacional”, mostrando as impressões digitais do perpetrador.
FP: A maior parte do trabalho do assassinato de Kennedy sugere que Oswald era um marine de baixo escalão sem informações importantes a oferecer para a KGB. Também era nitidamente perturbado e um tanto imprevisível. Se isto é verdade, por que a KGB o recrutou?
Pacepa: Isto é desinformação soviética – disseminada também pelo meu DIE, sob ordens da KGB. A verdade é bem diferente. Veja um exemplo. Como operador de radar na Base Aérea de Atsugi no Japão, Oswald sabia a altitude de vôo dos super-secretos aviões espiões U-2 da CIA que sobrevoavam a União Soviética partindo daquela base. Em 1959, quando eu era o chefe do posto de inteligência da Romênia na Alemanha Ocidental, um requerimento soviético endereçado a mim pediu “tudo, incluindo boatos” sobre a altitude de vôo dos aviões U-2. O Ministro de Defesa soviético sabia que os aviões U-2 haviam sobrevoado a União Soviética diversas vezes, mas o Comando de Defesa Aérea não havia sido capaz de rastreá-los porque os radares soviéticos da época não alcançavam grandes altitudes.
Francis Gary Powers, o piloto do U-2 abatido pelos soviéticos em 1° de maio de 1960, acreditava que os soviéticos haviam sido capazes de atingi-lo porque Oswald os havia informado sobre a altitude do seu vôo. De acordo com as declarações de Powers, Oswald tinha acesso “não somente aos códigos de radar e rádio mas também ao novo equipamento de radar MPS-16 com reconhecimento de altura” e a altitude na qual o U-2 voava, que era um dos segredos mais bem guardados.[11]
Parece que Oswald, que desertou para a União Soviética em 1959, era uma das pessoas presentes na audiência do julgamento espetacular de Powers em Moscou. Em 15 de fevereiro de 1962, Oswald escreveu para o irmão Robert: “Ouvi pela Voz da América que eles libertaram Powers, o sujeito do avião de espionagem U-2. É uma grande notícia onde você está, acredito. Ele parecia ser um americano fino e inteligente quando eu o vi em Moscou.” [12]
Terá sido um procedimento normal para a KGB mandar Oswald observar o julgamento de Powers como uma recompensa por ter ajudado a União Soviética abater o U-2.
FP: Yuri Nosenko, um oficial da KGB que desertou para os Estados Unidos em 1964, disse a Gerald Posner, pesquisador do assassinato: “Estou surpreso pela importância dada ao fato de [Oswald] ser um marine. O que ele era na Marinha – major, capitão, coronel?” [13] Como você explica esta declaração de Nosenko?
Pacepa: É fato que Nosenko desertou de boa fé. Mas ele pertenceu ao departamento doméstico da KGB e não sabia nada sobre as fontes estrangeiras da PGU – como um agente de nível médio do FBI não sabe nada sobre as fontes da CIA no exterior.
O recrutamento de membros das forças armadas era uma das mais altas prioridades da PGU na época. A busca por “serzhant” era a minha principal prioridade durante os três anos (1957-59) em que fui designado para residir na Alemanha Ocidental, e ainda era uma das principais prioridades em 1978, quando rompi com o comunismo. Evidentemente, a PGU gostaria de ter recrutado coronéis americanos, mas era difícil se aproximar deles, enquanto oficiais de baixo escalão eram mais acessíveis e podiam fornecer excelentes informações se usados corretamente.
Um bom exemplo é o sargento Robert Lee Johnson. Na década de 1950 ele estava servindo no exterior onde, como Oswald, ficou apaixonado pelo comunismo. Em 1953, Johnson secretamente entrou na unidade militar soviética na Berlin Oriental, onde pediu – como Oswald obviamente fez – garantia de asilo político no “paraíso dos trabalhadores”. Uma vez lá, Johnson foi recrutado pela PGU e persuadido a voltar temporariamente aos EUA para executar uma “tarefa histórica” antes de iniciar a sua nova vida na União Soviética – como foi o caso de Oswald. Realmente, o sargento Johnson foi recompensado secretamente com a patente de major do Exército Vermelho e recebeu congratulações escritas pelo próprio Khrushchev. [14]
De acordo com o coronel da PGU Vitaly Yurchenko, que desertou para a CIA em 1985 e logo em seguida re-desertou, o oficial chefe americano John Anthony Walker – outro “serzhant” – foi o maior agente da história da PGU, “ultrapassando em importância até o roubo soviético dos projetos anglo-americanos da primeira bomba atômica”. John F. Lehman, secretário americano da Marinha na época da prisão de Walker, concordou. [15]
FP: Em 1962, quando Oswald retornou da União Soviética, trouxe com ele um documento de 13 páginas intitulado “Diário Histórico”. Por que tinha este nome?
Pacepa: “Histórico” era um slogan da PGU na época. O termo foi cunhado pelo general Aleksandr Sakharovsky, antigo conselheiro-chefe soviético para a Securitate romena e comandante da PGU por imprecedentes 14 anos. “Histórico” era a sua expressão favorita. A Securitate tinha a “tarefa histórica” de eliminar a burguesia do solo romeno, como ele constantemente pregava para nós. O “dever histórico” da PGU era cavar a cova da burguesia internacional. Dogonyat i peregonyat era a nossa “tarefa histórica monumentalnaya”, ele nos disse logo após Khrushchev ter lançado aquele famoso slogan sobre a sua crítica ao Ocidente e sobre a superação do Ocidente no espaço de dez anos.
Diários pessoais também eram uma invenção de Sakharovsky. Todos os nossos oficiais e agentes ilegais enviados ao Ocidente com biografia fictícia deviam levar algum tipo de apoio escrito para a memória, para lembrarem exatamente onde, quando e o que supostamente haviam feito em vários períodos da sua alegada vida. Até o fim da década de 1950, estas anotações eram transportadas na forma de microdots ou filmes flexíveis escondidos em algum objeto de uso diário, mas, é claro, apresentavam o risco potencial de se tornar prova incriminatória se fôssem encontrados. Em janeiro de 1959, Sakharovsky deu ordens a todos os serviços de inteligência estrangeira do bloco soviético para dissimular estas biografias na forma de diários, rascunhos de livros, cartas pessoais ou notas autobiográficas. Estas notas eram escritas por especialistas em desinformação, copiadas à mão pelo agente ilegal ou de inteligência, normalmente imediatamente antes dele partir para o Ocidente, e em seguida passavam pela fronteira livremente.
Um exame miscroscópico do “Diário Histórico” de Oswald realmente mostrou que “foi escrito em uma ou duas sessões”. [16] Também foi copiado muito apressadamente, como sugerem os diversos erros de ortografia.
FP: O seu livro dá uma intrigante guinada no modo como conta o enredo. No fim, você diz que a evidência sugere que Oswald perdeu o apoio da PGU (Inteligência Estrangeira Soviética), e que ele foi sozinho para matar o presidente Kennedy. Isto é um tanto surpreendente. Conte-nos o que você sabe e explique a sua interpretação.
Pacepa: Em outubro de 1962, a Suprema Corte da Alemanha Ocidental realizou o julgamento público de Bogdan Stashinsky, desertor da inteligência soviética condecorado por Khrushchev por ter assassinado inimigos da União Soviética moradores no Ocidente. Este julgamento revelou Khrushchev ao mundo como um insensível assassino político. Em 1963, o extravagante ditador soviético já era um tirano incapacitado e ofegante. A mínima referência a qualquer envolvimento soviético no assassinato do presidente americano poderia ter sido fatal para Khrushchev. Assim, a KGB – como também o meu DIE – cancelou todas as operações destinadas a assassinar inimigos no Ocidente.
A PGU tentou, sem sucesso, desprogramar Oswald. Os documentos disponíveis mostram que, para provar para a PGU que ele era capaz de executar com segurança o assassinato ordenado, Oswald fez um ensaio atirando – apesar de ter errado por pouco – no general americano Edwin Walker. Oswald fez um pacote, completo com fotografias, mostrando como ele tinha planejado esta operação, e em seguida levou este material para a Cidade do México para provar ao “Camarada Kostin”, o seu oficial de apoio, a sua capacidade. Apesar de Oswald ter conseguido executar a tentativa de assassinato de Walker sem ser identificado como o atirador, Moscou permaneceu inflexível.
O obstinado Oswald estava arrasado, mas no fim ele foi em frente por si só, totalmente convicto de estar cumprindo a sua tarefa “histórica”. Tinha apenas 24 anos e tinha dado o melhor de si para obter armas de modo imperceptível e para fabricar documentos de identidade, usando os métodos aprendidos com a KGB. Até o derradeiro final ele também seguiu as instruções de emergência recebidas originalmente da KGB – não admitir nada e pedir um advogado.
Como Oswald já sabia demais sobre o plano original, entretanto, Moscou providenciou para que fosse silenciado para sempre, caso continuasse tentando realizar o impensável. Era outro padrão soviético. Sete chefes da própria polícia política soviética foram secreta ou abertamente assassinados para evitar incriminar o Kremlin. Alguns foram envenenados (Vyacheslav Menzhinsky, em 1934), outros executados como espiões ocidentais (Genrikh Yagoda em 1938, Nikolay Yezhov em 1939, Lavrenty Beriya e Vsevolod Merkulov em 1953, e Viktor Abakumov em 1954).
Além do mais, imediatamente após as notícias do assassinato de Kennedy, Moscou lançou a operação “Dragão”, um esforço de desinformação no qual o meu serviço esteve profundamente envolvido. O objetivo – plenamente atingido – era jogar a culpa em vários grupos nos Estados Unidos por terem matado o seu próprio presidente.
FP: A primeira resenha sobre Programmed to Kill, feita pela Publishers Weekly, afirma que o seu livro é baseado em histórias antigas de inteligência e não oferece nenhum motivo convincente sobre o interesse soviético pelo assassinato. O que você diz a respeito?
Pacepa: Em 3 de janeiro de 1988, o The New York Times publicou uma resenha parecida sobre o meu primeiro livro, Red Horizons, afirmando que ele continha apenas “histórias esquálidas” sobre o presidente romeno Nicolae Ceausescu. Dois anos depois, entretanto, Ceausescu foi executado após um julgamento cujas acusações eram provenientes, palavra por palavra, do meu livro – que ainda continua vendendo.
FP: Então tudo isso – se isso é verdade – não era um pouco estranho para Khrushchev ter arriscado tanto? Poderia ter causado uma guerra mundial?
Pacepa: Khrushchev, o meu chefe de facto por nove anos, era irracional. Hoje, as pessoas se lembram dele como um camponês que consertou as maldades de Stalin. O Khrushchev que eu conheci era sanguinário, impetuoso e extrovertido, e tendia a destruir todos os projetos tão logo caíssem nas suas mãos. A irracionalidade de Khrushchev fez dele o mais controverso e imprevisível dos líderes soviéticos. Desmascarou os crimes de Stalin mas converteu o assassinato político no principal instrumento da sua política externa. Criou a política de coexistência pacífica com o Ocidente mas acabou por empurrar o mundo para a iminência de uma guerra nuclear. Concluiu o primeiro acordo para o controle de armas nucleares, mas tentou garantir a posição de Fidel Castro no comando de Cuba com a ajuda de armas nucleares. Restabeleceu as relações de Moscou com a Iugoslávia de Tito mas rompeu com Beijing e assim destruiu a unidade do mundo comunista. Em 11 de setembro de 1971, Khrushchev morreu em desonra, como uma não-pessoa, não sem antes ter visto as suas memórias publicadas no Ocidente dando a sua versão da história.
FP: General Ion Mihai Pacepa, obrigado por ter vindo à Frontpage Interview. Ao lado das suas novas revelações e dos importantes fatos e assuntos trazidos à tona sobre o assassinato de Kennedy, o seu livro serve como mais um lembrete sobre a natureza maléfica da KGB e sobre a entidade sinistra e verdadeiramente tenebrosa que nós enfrentamos no regime soviético.
Obrigado por sua luta pela verdade e pela memória histórica.
Será uma honra recebê-lo mais uma vez.
Pacepa: Parabéns pela sua coragem em debater este tema tão controverso.
Notas:
[1] Cristopher Andrew and Vasily Mitrokhin, The Mitrokhin Archive and the Secret History of the KGB (New York, Perseus Books Group, 1999), p. 229.
[2] Oleg Nechiporenko, Passport to Assassination: the Never-Before-Told Story of Lee Harvy Oswald by the KGB Colonel who knew him (New York: Carol Publishing Group, 1993).
[3] Washington Post Magazine, April 23, 1995.
[4] Warren Commission Exhibit 2486.
[5] Testimony of Ruth Hyde Paine, Warren Commission Vol. 3, pp. 12-13.
[6] Warren Commission Exhibit 1400.
[7] Priscilla Johnson McMillan, Marina and Lee (New York: Harper & Row, 1977), p. 496.
[8] Edward Jay Epstein, Legend: The Secret World of Lee Harvey Oswald (New York: Reader’s Digest Press), p. 16.
[9] Dirección General de Inteligencia
[10] Epstein, Legend, p. 89.
[11] Francis Gary Powers, with Curt Gentry, Operation Overflight: The U-2 spy pilot tells his story for the first time (New York: Holt, Rinehart, 1970), p. 357.
[12] Warren Commission Exhibit 315.
[13] Gerald Posner, Case Closed: Lee Harvey Oswald and the Assassination of JFK (New York: Random House, 1993), p. 49.
[14] Christopher Andrew and Oleg Gordievsky, KGB: The Inside Story Of Its Foreign Operations from Lenin to Gorbachev (New York: HarperCollins, 1990), p. 462.
[15] John Barron, Breaking the Ring (Boston: Houghton Mifflin, 1987), pp. 148, 212.
[16] Epstein, Legend, pp. 109, 298n.
21 de novembro de 2013
Jamie Glazov
é editor da Frontpage Magazine.
Tem Ph.D. em História com especialidade em política externa russa, americana e canadense. É o autor de Canadian Policy Toward Khrushchev’s Soviet Union e co-editor (com David Horowitz) de The Hate America Left. Editou e escreveu a introdução de Left Illusions, de David Horowitz. O seu novo livro é United in Hate: The Left’s Romance with Tyranny and Terror. Para ver os seus simpósios, entrevistas e artigos anteriores, clique aqui. Email: jglazov@rogers.com Este endereço de e-mail está protegido contra spambots. Você deve habilitar o JavaScript para visualizá-lo. .
Tradução: Ricardo Hashimoto

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