"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

"DISPUTA ABERTA"

 
 
O que a presidente Dilma classifica de “vingança” a ex-senadora Marina Silva chama de “legítima defesa”. Seja lá o que for, esse sentimento deve ter se aprofundado ontem, quando o Senado, dominado pelas forças governistas, aprovou rapidamente a legislação que tira dos novos partidos o direito a tempo de televisão e fundo partidário, projeto esse que Marina atribui diretamente ao Palácio do Planalto.

Quem acredita que a intenção não foi dar o troco à manobra política de Marina e Eduardo Campos, pode fazer tudo, menos política. Mais uma vez a Rede Sustentabilidade, o partido que Marina tenta criar, está bloqueado por um projeto da maioria congressual, o que caracteriza uma ação política truculenta própria de regimes autoritários como o “chavismo”, identificado por Marina como a origem desse comportamento que faz “o diabo” para manter o controle político do país.

Mais uma vez será preciso recorrer ao Supremo Tribunal Federal para evitar esse prejuízo aos novos partidos, entre eles a Rede, abrigado provisoriamente no PSB para um trabalho de guerrilha política de combate à polarização entre PT e PSDB.

Essa mágoa, que não é apenas de Marina, mas também de Eduardo Campos, que acusa o governo de bater abaixo da linha da cintura para tirá-lo da corrida presidencial, pode levar a uma ação mais direta contra a presidente Dilma na campanha eleitoral, o que reforçaria a área da oposição.

Teremos que ver como Eduardo Campos e Marina resolverão a questão das coligações regionais. O PSDB havia feito vários acordos com o PSB pelo país todo, como mantê-los agora? Veremos até que ponto eles são oposição ao PT, ou se quererão ficar em posição equidistante dos dois, para não ficarem marcados como meros antagonistas do PT. Eles têm muita preocupação com isto, pois vieram da base governista.

Desde 2010, Marina evita ser contra o PT, não usou na campanha nem mesmo as críticas que teria sobre a atuação da presidente Dilma no Gabinete Civil, que foi a razão de sua saída do governo depois de quase todo ele permanecer à frente do ministério do Meio Ambiente.

O desabafo sobre o “chavismo” do PT, feito de madrugada na sexta-feira para um pequeno grupo de seguidores, não foi reafirmado na entrevista coletiva para que não fosse, como está sendo, acusada de radicalização à direita.

A diferença é que hoje os dois, especialmente Marina, estão magoados com o governo, a quem atribuem as manobras para tentar impedi-los de participar da corrida presidencial.

O nível de tensão desencadeado pela ação política de Marina e Eduardo pode reforçá-los, mas pode também trazer uma disputa interna que, mesmo não desejada por nenhum dos dois, pode ser incentivada por fatores externos, que afetarão todos os demais competidores de maneiras variadas.

Afinal, como diz Aécio, a disputa está aberta.O que parece ser hoje o grid de largada para a corrida presidencial de 2014 pode não ser o mesmo em julho, quando os partidos farão suas convenções.

Marina pode continuar aparecendo à frente de Eduardo Campos nas pesquisas que vierem a ser feitas, a tal ponto que crie uma situação de constrangimento para o governador de Pernambuco, que, nessa hipótese, não teria outra escolha a não ser abrir mão da disputa em favor de sua nova correligionária.

O ex-governador José Serra certamente ficou inquieto com a decisão de Marina, que abriu uma brecha na disputa presidencial que ele se considera capaz de preencher. Se tivesse tempo, teria mudado de partido para estar em condições de participar da disputa, mas não esperou o último dia para se definir.

Se o senador Aécio Neves não der mostras de que tem condições de reagir nas pesquisas, ocupando o lugar que o PSDB sempre teve entre as duas principais forças políticas do país, é possível que Serra tente reviver seu sonho de disputar a presidência da República.

E, sobretudo, a presidente Dilma verá de volta Lula em seus calcanhares se a jogada de Eduardo Campos e Marina der certo. O movimento “volta Lula” ganhará corpo diante da nova configuração da campanha eleitoral, agora legitimado justamente pela mudança de cenário.


09 de outubro de 2013
Merval Pereira, O Globo

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