Uma rebelião que teve início na tarde deste sábado nas penitenciárias estaduais de Alcaçuz e Rogério Coutinho Madruga, que são vizinhas, em Nísia Floresta, na região metropolitana de Natal (RN) deixou pelo menos dez mortos, segundo o governo local, que acredita que o número deve aumentar. Ao G1, o coordenador de administração penitenciária do estado, Zemilton Silva, afirmou que pelo menos três presos foram decapitados.
O secretário de Justiça e Cidadania do governo estadual, Wallber Virgolino, afirmou ao Globo no início da noite que a situação era crítica mas que a Polícia Militar estava retomando o controle do presídio. Segundo ele, os policiais já haviam conseguido entrar na penitenciária, mas havia espaços dentro do local que ainda estavam sobre o controle dos presos.
“Os policiais já entraram, estamos retomando o controle, mas sabemos que a situação é crítica. O presídio é muito extenso, não conseguimos chegar a todos os locais ainda” — disse, durante a rebelião.
BARRICADAS – A PM, porém, informou ao G1 que apenas a área externa de Alcaçuz estava sob o controle das autoridades. As saídas foram bloqueadas e o Corpo de Bombeiros estava fazendo barricadas no local. Segundo o G1, policiais militares e agentes penitenciários ainda esperam para entrar nos pavilhões controlados pelos presos.
“A intervenção é impossível agora. No momento estão todos soltos lá dentro, e armados. Nossa missão é evitar que ele saiam” — declarou o major Camilo, da PM, ao G1.
BRIGA DE FACÇÕES – Uma briga entre duas facções PCC e Sindicato do Crime gerou o motim. É o mesmo motivo que fez eclodir as rebeliões que mataram 64 no Amazonas e 33 em Roraima nos primeiros dias do ano. O novo motim fez passar de 100 o número de presos mortos em penitenciárias do país desde o início do ano, já que a Paraíba também registrou duas mortes.
Questionado sobre se o estado havia pedido ajuda para o governo federal, Virgolino se limitou a dizer que, sobre esse assunto, quem deve opinar é o governador, que tem contato direto com o ministro da Justiça.
Procurado, o Ministério da Justiça informou que não houve pedido de auxílio por parte do estado, mas que acompanha de perto o problema. Segundo a assessoria de imprensa, se houver um pedido de socorro por parte do Rio Grande do Norte, o governo vai procurar atender da forma como fez com os estados do Amazonas e de Roraima.
DOBRO DA CAPACIDADE – A rebelião na Penitenciária Estadual de Alcaçuz, na região metropolitana de Natal, teve início na tarde deste sábado, por volta das 16h30m. Ao G1, o major Eduardo Franco, da comunicação da Polícia Militar do Rio Grande do Norte, disse que houve invasão de presos do pavilhão 1 no pavilhão 5, onde estão internos de uma facção criminosa rival. De acordo com Virgolino, os criminosos estavam separados entre os presídios e por pavilhões.
Segundo informações da secretaria estadual de Justiça e Cidadania (Sejuc), a penitenciária tem capacidade para 620 presos, porém, abriga 1.140 pessoas. A unidade é composta por cinco pavilhões e tem 151 celas. Em imagens divulgadas pela PM, é possível ver presos no teto de um dos pavilhões neste sábado.
ESTADO EM ALERTA – As autoridades do Rio Grande do Norte já estavam em alerta para eventuais tensões nas penitenciárias do estado após o massacre em presídios de Manaus e Roraima. Em reportagem do GLOBO publicada no dia 7, a presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do RN, Vilma Batista, disse que os presos haviam sido separados após uma briga de facções no ano passado.
Segundo autoridades, a facção Sindicato do Crime (SDC) ou Sindicato RN, é comandada por Gelson Lima Carnaúba, o G, também líder da Família do Norte (FDN), do Amazonas. O SDC surgiu há dois anos como forma de se opor ao crescimento do PCC no estado. Em agosto do ano passado, a facção foi responsável por ataques em 38 cidades. Ao menos três detentos foram mortos nas cadeias. Ao longo de 2016, foram registrados cerca de 30 suicídios de detentos. Segundo o Ministério Público, porém, esses presos foram mortos.
“Depois que o Sindicato RN desestabilizou o sistema penitenciário começou a briga por espaço com o PCC. O governo decidiu separar os presos — disse Vilma Batista ao Globo na ocasião. Outra rebelião ocorreu no presídio em novembro de 2015. Na época, foram registradas 14 fugas.
PRISÃO NÃO É HOTEL – Na terça-feira, ao comentar a crise que colocou em evidência o descontrole e as condições degradantes do sistema penitenciário brasileiro, Virgolino disse ao Globo que há Estados fazendo acordos tácitos com os presos para evitar rebeliões. Segundo ele, que é delegado de polícia, “o criminoso tem que se sentir criminoso” com regras rígidas de comportamento e sem benesses como ventilador ou tevê. E defendeu que “presídio não é hotel e preso não é hóspede”.
“Alguns estados fazem um acordo tácito com os presos. Tu fica quietinho e eu deixo entrar tudo pra tu. (…) O Estado recua, fica com medo do preso, e começa a aceitar de forma involuntária tudo do preso, para ele não bagunçar, não matar ninguém, não fazer rebelião” — afirmou, acrescentando: “A gente tem que encarar o preso como preso. Se a educação pecou, se os programas sociais pecaram, não é problema nosso. Estamos lá para custodiar”.
Para ele, preso não pode ter televisão ou ventilador na cela. “Presídio não é hotel, e preso não é hóspede. Tem que ser tratado como preso, como acontece no Japão, nos Estados Unidos” — afirmou, dizendo que a superlotação não é aceitável, mas é preciso gerenciar “com o que tem na mão” e que não pode trabalhar com a hipótese de que 20 presídios vão cair do céu no Rio Grande do Norte.
###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – As rebeliões só ocorrem devido à cumplicidade de agentes penitenciárias. No Japão não há rebeliões, porque os agentes trabalham usando máscaras de cirurgia e os presos não podem olhar para eles, em nenhuma hipótese, para evitar que os funcionários da prisão possam ser ameaçados ou corrompidos. É um sistema interessante, que deveria ao menos ser analisado pelas autoridades brasileiras, mas quem se interessa? (C.N)
15 de janeiro de 2017
Bárbara Nascimento
O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário