"A hora da mudança":
Os Estados brasileiros, salvo raras exceções, comprometeram-se com o que se poderia chamar de irresponsabilidade fiscal. Viveram nos últimos anos sob a égide de despesas crescentes, como se os recursos públicos fossem infinitos: reajustes salariais, penduricalhos dos mais diferentes tipos, cálculos contábeis duvidosos de forma a aparentar conformidade com a lei, empréstimos que eram consumidos fora dos objetivos contratuais, dispêndios feitos com receitas extraordinárias, e assim por diante.
Ressalte-se que não se tratava de uma política levada a cabo apenas pelo Poder Executivo, mas compartilhada pelo Legislativo, pelo Judiciário e pelo Ministério Público. Cada um procurando tirar o seu quinhão, como se os recursos dos contribuintes estivessem simplesmente à sua disposição. Cada um desses Poderes poderá eventualmente produzir suas próprias justificativas, algumas legais, outras no limite, sem que isso altere minimamente o quadro geral.
Os anos lulopetistas, que agora vão chegando ao fim, estimularam tal irresponsabilidade, sempre concedendo aos Estados verbas adicionais, como se o Tesouro público não estivesse comprometido. Os longos anos da presidente afastada, Dilma Rousseff, conduziram essa atitude ao paroxismo, criando contabilidades fictícias, que agora pagam seu preço. Ou melhor, todos nós estamos pagando! Os privilegiados deixaram de se preocupar com o bem público, que constitui propriamente uma República.
O governo Fernando Henrique Cardoso deixou, entre outras heranças positivas, um legado de responsabilidade, consubstanciado na Lei de Responsabilidade Fiscal e na renegociação das dívidas dos Estados que estavam quebrados. Entre outras contrapartidas, alguns Estados deixaram de ter bancos próprios, que só serviam a objetivos eleitoreiros.
Ora, se o primeiro mandato do presidente Lula foi particularmente bem-sucedido, isso se deve à preservação desse legado, apesar de seu discurso esquizofrênico da “herança maldita”. Os incautos e desavisados acreditaram em tal mensagem. O torpor tomou conta da Nação, que ainda o reelegeu, apesar de os efeitos da corrupção já se fazerem presentes no que se convencionou chamar de mensalão.
A responsabilidade fiscal, porém, começou a ser progressivamente corroída a partir do segundo mandato de Lula e nos governos Dilma – ela, então, adotou a política da mais completa irresponsabilidade. Eles até tentaram produzir a narrativa das causas externas, mas não resiste a uma análise mais minuciosa. Nesse meio tempo, o mensalão reapareceu sob a forma do petrolão, minando definitivamente qualquer credibilidade lulopetista, levando até a presidente Dilma ao afastamento e ao impeachment iminente.
O novo governo, de Michel Temer, começa a tomar atitudes corajosas para reverter esse quadro, mas numa situação que não deixa de ser paradoxal, por não ser ainda definitivo. O presidente interino deve tomar atitudes que mudem estruturalmente o País.
Uma delas, da maior importância, é o controle das despesas estaduais. A maioria dos governantes está à míngua, atrasa salários, não honra suas dívidas, causando prejuízo a fornecedores e não conseguindo atender os seus cidadãos adequadamente em assuntos da maior relevância, como segurança, educação e saúde públicas.
Mal-acostumados sob o lulopetismo, sempre fizeram o jogo perverso de transferência de suas responsabilidades para a União. Apostavam no jeitinho, na “negociação”, empurrando com a barriga o problema, para que explodisse não agora, mas mais adiante. Uma bomba de efeito retardado. Acontece que a União está também quebrada. Não há mais remendo possível.
O governo Temer está tomando as medidas necessárias, mas nem sempre vem sendo correspondido pelos parlamentares e por várias corporações, como as do Legislativo, do Judiciário, do Ministério Público e setores do Executivo. Cada um desses grupos clama para si o “direito” à exceção. O bem público fica, então, esquartejado entre os diferentes interesses corporativos. Como foi assim nos governos petistas, permanece arraigado o sentimento de que tudo deve permanecer igual, apesar da aparência da mudança.
As condicionantes do governo Temer são as mais sensatas na renegociação das dívidas estaduais: limitação dos gastos públicos e sua correção anual pela inflação do ano anterior, além de igual limitação dos reajustes salariais nas mais diferentes esferas do funcionalismo público.
Não é possível que uma Nação com mais de 11,5 milhões de desempregados patrocine aumentos salariais para setores que gozam de estabilidade do emprego, enquanto famílias lutam para sobreviver. Não é possível um discurso de sacrifício da Nação com tais disparidades. Medidas devem valer igualmente para todos, sob pena de termos, aí, sim, grande injustiça.
Não se venha com a catilinária de oposição entre direita e esquerda, como se a esquerda petista e de seus congêneres fossem “sociais”, em defesa dos direitos, contra os neoliberais e conservadores que tomaram conta do novo governo. A distinção básica é entre os que sabem fazer contas, como qualquer chefe de família responsável, e os que não conhecem as regras elementares da aritmética, vivendo dos recursos alheios. Ou seja, essa esquerda é ignorante dessas regras, vive no mundo da “contabilidade criativa”.
O País necessita mudar, não pode mais continuar vivendo nesse mundo imaginário de uma ideologia ultrapassada. Os deputados estão sendo chamados à responsabilidade de apostar num novo Brasil, tomando decisões que permitam ao nosso país enveredar pelo caminho da mudança, do crescimento econômico e da equidade social.
Nada poderá ser feito se houver, de modo geral, qualquer tergiversação no que respeita a uma nova responsabilidade fiscal, agora consubstanciada nessa nova lei de renegociação das dívidas estaduais, com suas imprescindíveis contrapartidas.
08 de agosto de 2016
Artigo de Denis Rosenfield no Estadão
Ressalte-se que não se tratava de uma política levada a cabo apenas pelo Poder Executivo, mas compartilhada pelo Legislativo, pelo Judiciário e pelo Ministério Público. Cada um procurando tirar o seu quinhão, como se os recursos dos contribuintes estivessem simplesmente à sua disposição. Cada um desses Poderes poderá eventualmente produzir suas próprias justificativas, algumas legais, outras no limite, sem que isso altere minimamente o quadro geral.
Os anos lulopetistas, que agora vão chegando ao fim, estimularam tal irresponsabilidade, sempre concedendo aos Estados verbas adicionais, como se o Tesouro público não estivesse comprometido. Os longos anos da presidente afastada, Dilma Rousseff, conduziram essa atitude ao paroxismo, criando contabilidades fictícias, que agora pagam seu preço. Ou melhor, todos nós estamos pagando! Os privilegiados deixaram de se preocupar com o bem público, que constitui propriamente uma República.
O governo Fernando Henrique Cardoso deixou, entre outras heranças positivas, um legado de responsabilidade, consubstanciado na Lei de Responsabilidade Fiscal e na renegociação das dívidas dos Estados que estavam quebrados. Entre outras contrapartidas, alguns Estados deixaram de ter bancos próprios, que só serviam a objetivos eleitoreiros.
Ora, se o primeiro mandato do presidente Lula foi particularmente bem-sucedido, isso se deve à preservação desse legado, apesar de seu discurso esquizofrênico da “herança maldita”. Os incautos e desavisados acreditaram em tal mensagem. O torpor tomou conta da Nação, que ainda o reelegeu, apesar de os efeitos da corrupção já se fazerem presentes no que se convencionou chamar de mensalão.
A responsabilidade fiscal, porém, começou a ser progressivamente corroída a partir do segundo mandato de Lula e nos governos Dilma – ela, então, adotou a política da mais completa irresponsabilidade. Eles até tentaram produzir a narrativa das causas externas, mas não resiste a uma análise mais minuciosa. Nesse meio tempo, o mensalão reapareceu sob a forma do petrolão, minando definitivamente qualquer credibilidade lulopetista, levando até a presidente Dilma ao afastamento e ao impeachment iminente.
O novo governo, de Michel Temer, começa a tomar atitudes corajosas para reverter esse quadro, mas numa situação que não deixa de ser paradoxal, por não ser ainda definitivo. O presidente interino deve tomar atitudes que mudem estruturalmente o País.
Uma delas, da maior importância, é o controle das despesas estaduais. A maioria dos governantes está à míngua, atrasa salários, não honra suas dívidas, causando prejuízo a fornecedores e não conseguindo atender os seus cidadãos adequadamente em assuntos da maior relevância, como segurança, educação e saúde públicas.
Mal-acostumados sob o lulopetismo, sempre fizeram o jogo perverso de transferência de suas responsabilidades para a União. Apostavam no jeitinho, na “negociação”, empurrando com a barriga o problema, para que explodisse não agora, mas mais adiante. Uma bomba de efeito retardado. Acontece que a União está também quebrada. Não há mais remendo possível.
O governo Temer está tomando as medidas necessárias, mas nem sempre vem sendo correspondido pelos parlamentares e por várias corporações, como as do Legislativo, do Judiciário, do Ministério Público e setores do Executivo. Cada um desses grupos clama para si o “direito” à exceção. O bem público fica, então, esquartejado entre os diferentes interesses corporativos. Como foi assim nos governos petistas, permanece arraigado o sentimento de que tudo deve permanecer igual, apesar da aparência da mudança.
As condicionantes do governo Temer são as mais sensatas na renegociação das dívidas estaduais: limitação dos gastos públicos e sua correção anual pela inflação do ano anterior, além de igual limitação dos reajustes salariais nas mais diferentes esferas do funcionalismo público.
Não é possível que uma Nação com mais de 11,5 milhões de desempregados patrocine aumentos salariais para setores que gozam de estabilidade do emprego, enquanto famílias lutam para sobreviver. Não é possível um discurso de sacrifício da Nação com tais disparidades. Medidas devem valer igualmente para todos, sob pena de termos, aí, sim, grande injustiça.
Não se venha com a catilinária de oposição entre direita e esquerda, como se a esquerda petista e de seus congêneres fossem “sociais”, em defesa dos direitos, contra os neoliberais e conservadores que tomaram conta do novo governo. A distinção básica é entre os que sabem fazer contas, como qualquer chefe de família responsável, e os que não conhecem as regras elementares da aritmética, vivendo dos recursos alheios. Ou seja, essa esquerda é ignorante dessas regras, vive no mundo da “contabilidade criativa”.
O País necessita mudar, não pode mais continuar vivendo nesse mundo imaginário de uma ideologia ultrapassada. Os deputados estão sendo chamados à responsabilidade de apostar num novo Brasil, tomando decisões que permitam ao nosso país enveredar pelo caminho da mudança, do crescimento econômico e da equidade social.
Nada poderá ser feito se houver, de modo geral, qualquer tergiversação no que respeita a uma nova responsabilidade fiscal, agora consubstanciada nessa nova lei de renegociação das dívidas estaduais, com suas imprescindíveis contrapartidas.
08 de agosto de 2016
Artigo de Denis Rosenfield no Estadão
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