Bridge, em inglês, significa ponte. Localizada em Brasília, a Bridge Participações é propriedade do empresário Benedito Rodrigues de Oliveira Neto, o Bené, amigo de Fernando Pimentel (PT), governador de Minas Gerais. Um ótimo amigo: já emprestou avião e pagou R$ 12 mil para Pimentel e a mulher passarem férias num resort na Bahia. Pimentel e Bené são investigados pela Polícia Federal, na Operação Acrônimo, por lavagem de dinheiro – e por suspeita de, justamente, fazer uma ponte. Entre empresas que desejam empréstimos no BNDES e o próprio BNDES. Bené é o principal caminho para a PF investigar a caixa-preta do banco estatal e deve ser um dos focos da CPI do BNDES, a ser instalada no próximo dia 5 na Câmara dos Deputados.
Época obteve cópias de notas fiscais da Bridge e de outra empresa de Bené, a BRO. A história das notas fiscais é repleta de coincidências, envolvendo as duas empresas e seu dono, a montadora Caoa, que fabrica e revende carros da sul-coreana Hyundai no Brasil, e Fernando Pimentel – que, antes de ser governador de Minas, era ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Pasta a que o BNDES é subordinado. Para a polícia, nem sempre coincidências são meras coincidências.
Em fevereiro de 2012, o BNDES financiou a construção de uma fábrica da Hyundai em Piracicaba, São Paulo, por R$ 218 milhões. Ainda em 2012, o governo lançou o programa Inovar Auto, como forma de modernizar a indústria automobilística em troca de isenções fiscais. Em 2013, a montadora foi habilitada para iniciar a produção do veículo ix35, além de importar carros com desconto no IPI. Uma das portarias assinadas por Pimentel autoriza a importação de 2 mil veículos. Uma das principais apostas da Caoa, a linha de produção do ix35 foi inaugurada em 17 de outubro de 2013, com a participação de Pimentel.
Na ocasião, o fundador da Caoa, Carlos Alberto de Oliveira Andrade, deixou claro qual era a importância da relação com o governo. “O Inovar Auto é que viabilizou esse nosso investimento de mais de R$ 600 milhões”, afirmou Andrade. É nesse ponto da cronologia que entram as notas fiscais a que Época teve acesso.
NOTAS FISCAIS
De acordo com elas, a Caoa repassou R$ 2,21 milhões às duas empresas de Bené, Bridge e BRO, entre outubro de 2013 e junho de 2014. Um desses depósitos, no valor de R$ 240 mil, foi realizado no dia 22 de outubro, cinco dias depois do discurso de Carlos Alberto e da visita de Pimentel à fábrica.
Um dos fatores a despertar a curiosidade era a natureza dos serviços prestados, sempre extremamente vaga. De acordo com uma das notas fiscais obtidas pela reportagem, “estudo de processo produtivo usando como meio de pesquisa a internet”. O que significa isso? Procurar no Google? Talvez algo mais, pelo preço: R$ 265 mil. Outra nota segue a mesma lógica. “Estudo e planejamento de ações usando ferramentas tecnológicas existentes no mercado.”
Bené, denunciado na quinta-feira, dia 30, pelo Ministério Público Federal por desvio de R$ 2,9 milhões em 14 contratos irregulares para a realização de eventos do Ministério das Cidades no período de 2007 e 2009, agora se revela um expert no uso de “ferramentas tecnológicas”. Segundo a Caoa, foram as empresas – de mesmo dono, vale dizer – que “ofereceram propostas de prestação de serviços, como é usual no mercado”.
SEM COMPROVANTE
A Caoa não mostrou qualquer comprovante dos serviços prestados. A montadora afirma ainda que foram feitos estudos mercadológicos e estratégias comerciais no setor automobilístico.
Tanto Bridge quanto BRO, constatou a PF, são empresas de fachada. A BRO tem como sócios Bené e seu filho Paulo, de 21 anos. A empresa divide endereço com outras firmas do empresário, todas na lista de investigadas no inquérito da Operação Acrônimo. Bené é suspeito de fazer “confusão patrimonial” e ser o operador de Pimentel. Assim escreveu a PF: “Fernando Pimentel seria o chefe da organização criminosa operada financeiramente por Benedito, grupo criminoso especializado em lavagem de capitais oriundos de desvio de recursos públicos e aplicação de parte dos valores branqueados em campanhas. Pimentel teria recebido diretamente vantagem ilícita em razão do cargo então ocupado”.
CORRUPÇÃO NO BNDES
Os repasses para a Bridge e BRO são o terceiro indício para uma mesma suspeita da PF: os incentivos do BNDES e do Ministério do Desenvolvimento podem ter sido facilitados por repasses a Fernando Pimentel. A mulher de Pimentel, Carolina Oliveira, é uma das principais suspeitas, junto com Bené. Ela recebeu R$ 236 mil da Pepper, que prestou serviços ao BNDES. E recebeu outros R$ 2,5 milhões do consultor Mário Rosa, que prestava serviço a empresas que receberam financiamentos do BNDES. Agora, ÉpocaA revela um novo caminho do dinheiro, por meio de Bené. O empresário, aliás, já era investigado por lavagem, depois de ter sido pego com R$ 113 mil em seu avião, durante a eleição do ano passado. Também é denunciado pelos desvios nos contratos com o Ministério das Cidades. Faltava, contudo, desvendar como Bené ganhava dinheiro ligado à atuação de Pimentel no governo. Os documentos revelados por Época fornecem novas pistas nesse sentido. O caso, em razão de Pimentel ser governador, é investigado no Superior Tribunal de Justiça.
02 de agosto de 2015
Filipe Coutinho e Murilo Ramos
Época
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