As recentes declarações do ministro Carlos Alberto Reis de Paula ao jornal “Valor Econômico” trouxeram as cotas raciais mais uma vez para o centro do debate. Presidente da maior instância trabalhista do país, o Tribunal Superior do Trabalho (TST), Reis de Paula defende a aplicação de cotas raciais em todos os ambientes de trabalho – inclusive em empresas privadas – como forma de sanar a desigualdade entre pretos e brancos no mercado brasileiro.
O ministro acredita ainda que o Judiciário deve atuar mais na mobilização da sociedade em prol de avanços nas relações de trabalho.
Para o sociólogo e especialista no tema, Demétrio Magnoli, a opinião do presidente do TST reflete um consenso da elite política brasileira, que não enfrenta oposição às classificações raciais na vida do cidadão brasileiro.
Magnoli reafirma a inconstitucionalidade da questão e critica o que chama de “negociação de direitos em função da raça”. Leia a entrevista.
Instituto Millenium – Em entrevista ao jornal “Valor Econômico”, o presidente do TST, ministro Carlos Alberto Reis de Paula, se mostra favorável à ampliação das cotas raciais. No órgão já há uma regulamentação que fixa cotas para negros em 10% para a terceirização de serviços. O ministro defende a ampliação das cotas para todos os ambientes de trabalho, inclusive nas empresas privadas, como meio de fomentar a igualdade. Como o senhor avalia a opinião do ministro?
Demétrio Magnoli – Eu lamento, mas não me surpreendo com a posição do ministro. A reprodução de cotas raciais no Brasil não teve reação por parte do nosso sistema. Nenhum partido relevante ou liderança política se posicionou contra. O que o ministro faz, além de provavelmente expressar uma opinião própria, é revelar um consenso da nossa elite política, que é muito diferente de um consenso nacional. Ao considerar legais as cotas raciais, o Supremo Tribunal Federal (STF) abriu o caminho para a extensão das cotas para todo o mercado de trabalho.
Imil – Hoje o cidadão é obrigado a declarar a qual “raça” pertence no formulário de declaração do Imposto de Renda e até na hora de preencher o Currículo Lattes…
Magnoli – Veja bem, as políticas de preferências raciais não visam, como fica cada vez mais claro, oferecer oportunidades para pessoas menos favorecidas. Se fosse por isso, se proporia cotas sociais, por renda etc. As cotas raciais são adotadas para promover uma pedagogia da raça, ou seja, impor compulsoriamente aos brasileiros a classificação racial de cada um. As pessoas começam a se identificar de acordo com a cor da pele e não apenas com a cidadania brasileira. Essa é a função das politicas raciais, a negociação de direitos em função da raça. Isso tende a crescer no país.
Imil – Na defesa das cotas, o ministro citou o artigo 170 da Constituição para destacar que as ações afirmativas estão respaldas pela Constituição. Ele é favorável a cotas em todos os ambientes de trabalho. Isso não seria inconstitucional?
Magnoli – Claro! A Constituição diz que todos os cidadãos são iguais perante a lei
independentemente de raça, gênero, orientação politica etc. No entanto, a letra da Constituição foi violada pelo STF com base em considerações puramente ideológicas. É ativismo judicial. O Supremo rasgou a Carta Magna para atender uma demanda ideológica sem enfrentar uma oposição política forte.
Imil – Na mesma entrevista, o ministro afirma que o poder Judiciário deve ser mais atuante no sentido de organizar mobilizações junto à sociedade. O Estado de Direito comporta essa espécie de ativismo?
Magnoli - O ministro propõe que o Judiciário se torne um partido político, que faça as leis por meio de decisões de tribunais. Além disso, quer que o judiciário tenha um programa político independente de provocações. Isso é ilegal, mas muita coisa ilegal acontece no Brasil.
Imil – É difícil encontramos uma liderança que bata de frente com a cultura racial que está sendo criada no país, já que, por exemplo, grande parte da população brasileira é “beneficiada” pelas cotas raciais e pode vir a votar a favor desse tipo de política? É um peso eleitoral que desafia os políticos?
Magnoli – Sua premissa é especulativa e errada. Nas poucas pesquisas que foram feitas com o grande público sobre cotas raciais, verificou-se no Rio de Janeiro uma majoritária oposição às cotas raciais por pessoas de todas as cores de pele. A oposição às cotas dos que se autodeclaram pretos e pardos foi similar, até um pouco maior, que a dos brancos. As cotas não são uma decisão popular.
É evidente que isso depende das perguntas que são feitas nas pesquisas, pois elas orientam respostas. Se a pergunta for, por exemplo, se “cotas raciais visam a oferecer direitos para quem é pobre”, se a pergunta levar as pessoas a acreditarem que raça e renda são a mesma coisa, vai haver resultado favorável. Mas quando as pessoas são indagadas com perguntas mais objetivas, as respostas são contrárias. Apesar de mais de uma década de pedagogia racial, os brasileiros resistem à ideia de negociaram seus direitos à base da raça. Não sei até quando vão resistir. O grande perigo é a introdução do racismo como um fenômeno da consciência popular. Existe racismo no Brasil, como em todo lugar do mundo, mas ele não é um fenômeno de massas, da consciência popular.
13 de janeiro de 2014
imil
O ministro acredita ainda que o Judiciário deve atuar mais na mobilização da sociedade em prol de avanços nas relações de trabalho.
Para o sociólogo e especialista no tema, Demétrio Magnoli, a opinião do presidente do TST reflete um consenso da elite política brasileira, que não enfrenta oposição às classificações raciais na vida do cidadão brasileiro.
Magnoli reafirma a inconstitucionalidade da questão e critica o que chama de “negociação de direitos em função da raça”. Leia a entrevista.
Instituto Millenium – Em entrevista ao jornal “Valor Econômico”, o presidente do TST, ministro Carlos Alberto Reis de Paula, se mostra favorável à ampliação das cotas raciais. No órgão já há uma regulamentação que fixa cotas para negros em 10% para a terceirização de serviços. O ministro defende a ampliação das cotas para todos os ambientes de trabalho, inclusive nas empresas privadas, como meio de fomentar a igualdade. Como o senhor avalia a opinião do ministro?
Demétrio Magnoli – Eu lamento, mas não me surpreendo com a posição do ministro. A reprodução de cotas raciais no Brasil não teve reação por parte do nosso sistema. Nenhum partido relevante ou liderança política se posicionou contra. O que o ministro faz, além de provavelmente expressar uma opinião própria, é revelar um consenso da nossa elite política, que é muito diferente de um consenso nacional. Ao considerar legais as cotas raciais, o Supremo Tribunal Federal (STF) abriu o caminho para a extensão das cotas para todo o mercado de trabalho.
Imil – Hoje o cidadão é obrigado a declarar a qual “raça” pertence no formulário de declaração do Imposto de Renda e até na hora de preencher o Currículo Lattes…
Magnoli – Veja bem, as políticas de preferências raciais não visam, como fica cada vez mais claro, oferecer oportunidades para pessoas menos favorecidas. Se fosse por isso, se proporia cotas sociais, por renda etc. As cotas raciais são adotadas para promover uma pedagogia da raça, ou seja, impor compulsoriamente aos brasileiros a classificação racial de cada um. As pessoas começam a se identificar de acordo com a cor da pele e não apenas com a cidadania brasileira. Essa é a função das politicas raciais, a negociação de direitos em função da raça. Isso tende a crescer no país.
Imil – Na defesa das cotas, o ministro citou o artigo 170 da Constituição para destacar que as ações afirmativas estão respaldas pela Constituição. Ele é favorável a cotas em todos os ambientes de trabalho. Isso não seria inconstitucional?
Magnoli – Claro! A Constituição diz que todos os cidadãos são iguais perante a lei
independentemente de raça, gênero, orientação politica etc. No entanto, a letra da Constituição foi violada pelo STF com base em considerações puramente ideológicas. É ativismo judicial. O Supremo rasgou a Carta Magna para atender uma demanda ideológica sem enfrentar uma oposição política forte.
Imil – Na mesma entrevista, o ministro afirma que o poder Judiciário deve ser mais atuante no sentido de organizar mobilizações junto à sociedade. O Estado de Direito comporta essa espécie de ativismo?
Magnoli - O ministro propõe que o Judiciário se torne um partido político, que faça as leis por meio de decisões de tribunais. Além disso, quer que o judiciário tenha um programa político independente de provocações. Isso é ilegal, mas muita coisa ilegal acontece no Brasil.
Imil – É difícil encontramos uma liderança que bata de frente com a cultura racial que está sendo criada no país, já que, por exemplo, grande parte da população brasileira é “beneficiada” pelas cotas raciais e pode vir a votar a favor desse tipo de política? É um peso eleitoral que desafia os políticos?
Magnoli – Sua premissa é especulativa e errada. Nas poucas pesquisas que foram feitas com o grande público sobre cotas raciais, verificou-se no Rio de Janeiro uma majoritária oposição às cotas raciais por pessoas de todas as cores de pele. A oposição às cotas dos que se autodeclaram pretos e pardos foi similar, até um pouco maior, que a dos brancos. As cotas não são uma decisão popular.
É evidente que isso depende das perguntas que são feitas nas pesquisas, pois elas orientam respostas. Se a pergunta for, por exemplo, se “cotas raciais visam a oferecer direitos para quem é pobre”, se a pergunta levar as pessoas a acreditarem que raça e renda são a mesma coisa, vai haver resultado favorável. Mas quando as pessoas são indagadas com perguntas mais objetivas, as respostas são contrárias. Apesar de mais de uma década de pedagogia racial, os brasileiros resistem à ideia de negociaram seus direitos à base da raça. Não sei até quando vão resistir. O grande perigo é a introdução do racismo como um fenômeno da consciência popular. Existe racismo no Brasil, como em todo lugar do mundo, mas ele não é um fenômeno de massas, da consciência popular.
13 de janeiro de 2014
imil
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