Por muito tempo, até meados da década de 1970, Silvio Santos escondeu do público que era casado com Maria Aparecida Vieira e tinha duas filhas, Cintia e Silvia. Também mentia sobre a sua idade, achando que o mistério em relação à vida pessoal era um ingrediente importante na imagem que projetava.
Num famoso depoimento, em seu próprio auditório, em fevereiro de 1988, Silvio se penitenciou publicamente: “Quando me lembro da minha mulher que morreu, e quando me lembro que eu dizia que era solteiro… Quando eu me lembro que eu escondia as minhas filhas pra poder ser um galã, para poder ser o herói…. Quando eu falo com a minha consciência, eu acho que é uma das coisas imperdoáveis que eu fiz, diante da minha imaturidade”.
Sumido dos palcos por quatro semanas, Silvio estava emocionado. Havia acabado de retornar dos Estados Unidos, onde passou por uma bateria de exames médicos e tratou de um problema nas cordas vocais. Anunciou que pretendia deixar os palcos em 1990.
CANDIDATURA – Com muita sinceridade, observou: “O povo tem admiração por mim, se preocupa com a minha saúde. Então, eu me perguntei: o que eu faço por este povo? Nada. Palhaçada aos domingos. Será que um homem com 57 anos, com maturidade, com inteligência, não pode fazer mais alguma coisa por este povo? Será que esse homem que tem uma rede de televisão não pode dar um pouco mais a este povo que o circo, no bom sentido?”.
E, refletindo sobre o que faria com tempo livre depois que deixasse os palcos, disse: “Deus queira que eu não entre na política e comece a fazer comício e a subir em palanque. Se entrar em mim o demônio da política, eu vou ter condições de exorcizá-lo”.
Duas semanas depois destas declarações de impacto, como bem lembra Fernando Morgado no recém-lançado “Silvio Santos, a Trajetória do Mito” (Matrix, 208 págs., R$ 39,90), o apresentador se filiou ao PFL.
FEZ TUDO ERRADO – Foi o início de uma das mais desastradas aventuras pela política de uma celebridade brasileira. No intervalo de cinco anos, tentou ser candidato a prefeito de São Paulo (duas vezes), presidente da República e governador do Estado. Por completa inabilidade e excesso de sinceridade, fez tudo errado e nunca conseguiu ver o seu nome numa cédula eleitoral.
Desistiu de ser candidato, mas nunca perdeu o hábito de bajular políticos. O livro de Morgado lembra dos seus elogios a João Figueiredo (“um sujeito firme”), Jânio Quadros (“um gênio”), Collor (“é boa-pinta e fala bem”) e Fernando Henrique (“o melhor presidente que o Brasil já teve, comparável a Juscelino Kubitschek”).
O livro também lembra que Silvio pediu ajuda a Collor no início dos anos 1990 (“Ele me socorreu num momento em que os bancos, diante da minha situação, queriam cobrar juros exorbitantes”) e a Lula, em 2010, quando tornou-se público o rombo no Banco PanAmericano.
MENSAGENS ALARMISTAS – Em caso de novas edições do livro, Morgado terá que atualizar o capítulo sobre política. Agora em abril, Silvio Santos deu sinais do seu apreço por Temer. Não falou nada em público, mas atendeu a um pedido do presidente, feito no salão do cabeleireiro Jassa, como noticiou o “Painel”, da Folha, para defender a proposta de reforma da Previdência.
Desde então, o SBT tem exibido mensagens institucionais alarmistas, como: “Você sabe que se não for feita a reforma da Previdência, você pode deixar de receber o seu salário?” É Silvio cumprindo a sua promessa, feita em 1988, de ir além das palhaçadas de domingo.
09 de maio de 2017
Mauricio Stycer
Folha
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