Como todos sabem, o vitorioso esquema de marketing político de Sérgio Cabral era basicamente montado em cima da farsa das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) e jamais teria obtido tanto sucesso se não tivesse a cumplicidade direta do secretário de Segurança, delegado federal José Mariano Beltrame. Sem a parceria dele, jamais teria havido o acordo com os traficantes, que retiraram suas tropas das comunidades “pacificadas” sem disparar um só tiro e sem que a Polícia efetuasse uma só prisão.
Movida pelas generosas verbas publicitárias do governo estadual, a mídia deu a maior força à farsa das UPPs e jamais procurou realmente apurar o que existia por trás dessa espantosa pacificação das favelas do Rio, que de uma hora para outra se transformaram em pontos turísticos, vejam a que ponto de insanidade chegamos.
LIBERANDO GERAL – Para conseguir o falso milagre, Cabral e Beltrame se acertaram com os chefões do tráfico, que passou a ser realizado mais discretamente e de preferência pelo sistema “delivery”, através dos motoboys que operam nas comunidades.
É claro que jamais se poderia imaginar que um delegado da Polícia Federal pudesse participar desse tipo de trama criminosa. Achava-se que a política de pacificação tinha realmente dado certo, pois nem mesmo os serviços de inteligência da Polícia Federal e das Forças Armadas foram capazes de detectar a armação ou , ao menos, levantar suspeitas sobre o estranho sucesso da iniciativa.
UM FALSO HERÓI – Em plena euforia das UPPs, já havia indicações de que Beltrame era um falso herói. Em dezembro de 2009 já denunciamos aqui no blog a armação da dupla Cabral/Beltrame, mas as denúncias eram recebidas como se fossem mais uma “teoria conspiratória”, porque outros governadores se animavam e até o governo Lula já falava em adotar as UPPs nacionalmente, era só que faltava.
Aos poucos, porém, o castelo começou a desmoronar, e em 22 de março de 2012 a Associação dos Delegados de Polícia (Adepol), fez uma representação à Comissão de Ética do governo Cabral, pedindo a exoneração de Beltrame por improbidade administrativa. A Adepol anexou provas de que Beltrame fora nomeado delegado federal irregularmente, no concurso público promovido em 1993, porque o prazo de validade já estava vencido. Além disso, Beltrame tinha sido classificado apenas em 896° lugar para um concurso cujo edital previa o preenchimento de apenas 200 vagas, e perdera todas as suas ações individuais, que já se encontram transitadas em julgado, inclusive no Supremo.
CADA VEZ MAIS IDOLATRADO – A denúncia da Adepol era procedente, mas não aconteceu nada. Pelo contrário, Beltrame continuou a ser cada vez mais idolatrado pelo falso sucesso das UPPs. Se tivesse se candidatado a deputado ou senador, seria eleito facilmente, mas tudo ia bem e preferiu esperar para sair candidato ao governo estadual.
Logo em seguida, veio à tona que Beltrame estava acumulando as elevadas remunerações de delegado sênior da Polícia Federal e secretário de Segurança. Embolsava mensalmente mais de R$ 60 mil reais, muito acima do teto do Supremo. Mas também não aconteceu nada. Afinal, tratava-se do Beltrame, que passara a ser tratado como um semideus pela mídia.
MAIS DENÚNCIAS – Embriagado pelo sucesso, Beltrame entrou de cabeça na corrupção e assinou contratos com o grupo Júlio Simões, passando a pagar R$ 3,3 mil mensais pela manutenção de cada carro da PM. O Ministério Público investigou a negociata e o juiz da 7ª Vara de Fazenda Pública, Marcelo Evaristo da Silva, transformou o ex-secretário em réu numa ação de improbidade que pede a devolução de quase 135 milhões de reais aos cofres públicos, acrescida de correção monetária.
Também aparecem como réus o governo estadual e duas empresas de Júlio Simões: a CS Brasil Transporte de Passageiros e Serviços e a JSL S.A, esta última acusada de fraude em licitações para a aquisição de viaturas da PM também na Bahia, que em 2009 resultou na Operação Nêmesis da Polícia Federal, com prisão de três coronéis, entre eles o ex-comandante geral da PM baiana. Ou seja, Beltrame operava em boa companhia, digamos assim.
Detalhe importante: no Tribunal de Justiça do Rio tramitam outras duas ações distintas, relacionadas a seis diferentes contratos feitos por órgãos do governo Cabral com o grupo Júlio Simões. Todos de compra e revisão de viaturas, que somados chegam a 1,2 bilhão de reais. Uma verdadeira festa da corrupção.
CAI A MÁSCARA – No convívio com a famosa turma do guardanapo, Beltrame também apossou a viver como novo rico e até mandava os dois filhos “al mare” no luxuoso iate de Cabral, conforme já mostramos aqui na TI. Na certeza da impunidade, passou a morar no Edificio Courchevel, na Rua Redentor, 230, em Ipanema, um luxuoso apartamento do empresário Fernando Magalhães Pinto, principal operador da lavagem de dinheiro de Sérgio Cabral e Adriana Ancelmo,
Fernand0 Magalhães Pinto é réu no mesmo processo criminal de Cabral, pediu para fazer delação premiada e prestou uma série de reveladores depoimentos. Acaba de ser libertado, porque seu acordo foi homologado. Entregou tudo que sabe sobre o casal 20 da corrupção no Rio de Janeiro e não esqueceu de abordar seu íntimo relacionamento com José Mariano Beltrame, que ficou como 896º colocado no concurso para delegado da Polícia Federal, mas conseguiu o milagre de ser nomeado, e 20 anos depois conseguiria outro milagre na fraude da pacificação das favelas do Rio.
12 de janeiro de 2017
Carlos Newton
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