Um detalhe chamou a minha atenção durante a declaração de guerra de Lula aos inimigos no dia em que teve que se explicar à PolíciaFederal. Atrás do ex-presidente, destacavam-se duas jovens. Uma delas vestia a camiseta da UNE. A outra, a de uma entidade de estudantes secundaristas - acredito que seja a Ubes.
Lula convocou a tropa de choque para enfrentar o que seus partidários chamam de "golpe e perseguição". Pediu ajuda à CUT, ao MST, ao PT e ao PCdoB para uma cruzada contra a direita e os conservadores - na avaliação do petismo, quem não está com ele se enquadra em um desses dois grupos. UNE e Ubes não estavam na lista. Mas não era necessário citá-las. As duas entidades já se apresentaram para a empreitada. Em nota divulgada no site, a UNE afirma, timidamente, reconhecer a importância das investigações da Justiça, mas sai em defesa de Lula, atacando desde a PF até a imprensa.
Houve um tempo em que gritar "a UNE somos nós, nossa força, nossa voz" era motivo de orgulho. Mesmo sem militar no movimento estudantil, eu sabia da importância dele para o país e para todos os que repudiavam a ditadura militar - e na época em que os militares estavam no poder, é bom lembrar.
Mas o movimento se perdeu no tempo. Ficou deslumbrado com a chegada do PT ao poder, acreditando que a esquerda, enfim, ditaria novos rumos do país. A UNE acabou estatizada. Hoje, ataca instituições republicanas para defender as efêmeras benesses que recebe do Estado. Faltam lideranças e bom senso. Sobra oportunismo.
Ao cerrar fileiras com o governo, a UNE se esqueceu totalmente da educação no país. Seus diretores poucos se importam com a falta de rumos da "Pátria educadora", que deixou universidades à míngua e à beira do colapso. Não há passeatas, protestos ou mobilizações contra o Estado. Muitos podem argumentar que a pauta da UNE sempre excedeu as reivindicações pela melhoria do ensino.
Mas, ao defender veementemente Lula contra a Lava-Jato, a UNE dá o salto mais questionável e perigoso de sua história recente. A entidade que nasceu com a democracia no DNA prefere ficar hoje ao lado do investigado e não do da Justiça, sem esperar o fim das investigações de denúncias que são graves e merecem ser apuradas, explicadas. O Brasil trava sua maior guerra à corrupção e aos malfeitos.
No entanto, muitos tentam transformar o atual momento brasileiro numa luta ideológica e de classes. Acreditar nisso é flertar com o autoritarismo. E a UNE, por representar (ou tentar fazê-lo) nossos estudantes, não tem o direito de fazer escolhas tão açodadas.
10 de março de 2016
marcelo agner, Correio Braziliense
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