O Brasil se tornou o país das aberrações. A começar pelos juros. Não bastasse o Banco Central ter elevado a taxa básica da economia (Selic) para 14,25% ao ano, o nível mais alto desde 2006, parte do mercado financeiro voltou a cogitar a possibilidade de o Comitê de Política Monetária (Copom) promover novo aumento em setembro próximo. Motivo: enfrentar a pressão da inflação provocada pela disparada do dólar. O aumento da Selic, destacam os analistas, deve ser de pelo menos 0,25 ponto percentual, independentemente de o Produto Interno Bruto (PIB) estar se decompondo, podendo fechar 2015 com queda de 3%, algo sem precedente em um quarto de século.
Levantamento realizado pelo Itaú Unibanco mostra o quanto o Brasil está distante da realidade mundial quando o assunto são os juros. Em julho, de 31 nações analisadas pela instituição, somente o país e a África do Sul elevaram as taxas que servem de parâmetro para a formação do custo do dinheiro. Cinco promoveram cortes nos juros — Suécia, Canadá, Hungria, Nova Zelândia e Rússia — e o restante manteve a política monetária inalterada.
BANCO CENTRAL AFROUXOU
Segundo os economistas do Itaú, desde o fim do ano passado, nenhum país manteve uma postura tão contracionista quanto o Brasil. Todo esse arrocho tem explicação. Durante os primeiros quatro anos do governo Dilma Rousseff, o BC de Alexandre Tombini menosprezou a força da inflação. Mesmo com os reajustes se disseminando, a opção foi por uma postura mais amena na condução da Selic. A autoridade monetária chegou ao ponto de levar a taxa básica para 7,25% ao ano, mesmo com o custo de vida se mantendo muito distante do centro da meta inflacionária, de 4,5%, que deveria perseguir.
O BC só começou a falar grosso em outubro do ano passado, depois que as urnas confirmaram o segundo mandato de Dilma. Mas já era tarde. Tanto que a instituição teve que adicionar à Selic a necessidade de recompor sua credibilidade. Se o BC não tivesse cedido às pressões políticas e agido quando era necessário, certamente os juros estariam em níveis bem menores hoje, talvez até caindo, para animar a atividade.
OUTRAS DISTORÇÕES
A aberração da Selic provoca outras distorções, como os juros cobrados dos consumidores. Não há, pelo menos em economias civilizadas, notícias sobre taxas de 372% ao ano no cartão de crédito nem de 241% no cheque especial. Com encargos nesses patamares, é impossível se falar em recuperação do consumo das famílias. O natural é esperar uma explosão da inadimplência, uma vez que a inflação persistentemente alta corroeu o poder de compra e o desemprego voltou com tudo.
Mas não é só. Enquanto o mundo dá claros sinais de recuperação — a perspectiva é de avanço médio de 3,3% neste ano —, a atividade no país derrete. Das maiores economias do planeta, somente o Brasil e a Rússia, que sofre por causa de um forte embargo imposto pelos Estados Unidos e a Europa, terão retração em 2015. Quando o quadro se restringe à América Latina, apenas duas economias contabilizarão queda: a brasileira e a venezuelana.
MALUQUICES DE DILMA
Esse é o retrato das maluquices que Dilma cometeu no primeiro mandato. Achando que poderia reinventar a roda, a petista recorreu à tal nova matriz econômica, que se mostrou um verdadeiro desastre com suas pedaladas e manobras fiscais. O estrago foi tão grande que, mesmo a presidente dizendo que mudou, que agora defende ajuste fiscal e combate à inflação, ninguém acredita nela. Tornou-se sinônimo de descrédito, o que só agrava o quadro atual.
A constatação mais dramática de tudo isso é que a não há reversão à vista. E a situação ainda pode piorar, com Dilma correndo o risco de perder o mandato. O Tribunal de Contas da União (TCU) está próximo de dar um parecer negativo às contas da presidente de 2014. Já o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) julgará se as campanhas da presidente foram financiadas com dinheiro oriundo da roubalheira na Petrobras.
Definitivamente, esse Brasil nada tem a ver com o país que sonhamos para nossos filhos.
07 de agosto de 2015
Vicente Nunes
Correio Braziliense
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