Economia mundial um tico melhor em 2015 decerto não atrapalha, mas a bola está com o Brasil
O ANO QUE VEM será muito difícil para a economia brasileira, parece se tratar de quase um consenso. Curiosamente, a estimativa mediana de crescimento do PIB para 2015 é de 1,5%, muito fraquinho, decerto, mas superior ao 1% previsto para este 2014.
Dada a incerteza sobre qual será o próximo governo e o que será feito da política econômica, a previsão para o ano que vem não vale nem como ficção científica nível "C".
O resto do mundo, em especial as elites burocráticas do mundo rico, insiste porém que 2015 será enfim um ano, vá lá, bom. Ano de "volta à normalidade", medíocre que seja em termos de crescimento, e não importa que o couro dos mais pobres continue a ser esfolado nessa recuperação sempre mais ou menos frustrada, desde 2009. Vai rolar? A "retomada" euroamericana daria uma mãozinha ao Brasil?
Previa-se neste ano que os EUA crescessem 3%, excelente para um país tão rico. Deve crescer uns 2%, ainda ótimo, mas não é disso que se trata aqui. A Europa do euro sairia da recessão, crescendo pouco mais de 1%. Mas embica para pouco menos que isso.
No ano que vem, os Estados Unidos chegariam aos 3%, a eurozona iria a 1,5%, o Japão repetiria algo em torno de 1,7%, assim como a China repetiria seus 7,5%.
Nada mal. Nada muito bom, no que nos diz respeito. O efeito direto do crescimento da economia mundial no Brasil já é pequeno, pois o país negocia pouco com o exterior. A variação do PIB das economias maiores tende a fazer ainda menos efeito devido a problemas domésticos, brasileiros, e ao tipo de crescimento que virá no curto prazo.
Não haverá valorização anormal dos nossos produtos dominantes de exportação --comida e minério. Para piorar, a economia brasileira permanece inflacionada num mundo que, em parte, namora a deflação.
Ou seja, não vamos ganhar mercados em produtos manufaturados, pelo contrário. China e companhia avançam nos nossos clientes. Nossos custos altos e câmbio valorizado reduzem o interesse pelos nossos produtos (importamos mais, de resto). A Europa está com uma gigantesca sobra na capacidade de sua indústria (como não tem demanda lá, consumo, a Europa faz "xepa" dos seus produtos).
Pode-se argumentar que, pelo menos, pior do que agora não vai ficar. Pode ser, a princípio. Ainda há os riscos da transição.
Como se está cansado de saber, haverá mudança na política monetária americana (grosso modo, taxas de juros mais altas). Mudanças desse tipo sempre causaram algum tumulto financeiro mundial ou pelo menos efeitos colaterais em países mais frágeis (com inflação e déficit externo desconfortáveis).
Como se está cansado de especular, a crise europeia não acabou, por qualquer critério que se empregue, mas há o risco de aparecer outro entulho crítico, o de deflação.
Isto é o caso de uma economia tão fria, já com juro zero, com tanto desemprego de trabalho e de capital, com baixíssimo investimento e corte de gasto público, que passa a esfriar ainda mais.
Não quer dizer que estejamos fritos. Caso não sobrevenham tumultos financeiros maiores nos EUA e na Europa, o cenário externo tende a ser meio neutro. Como quase sempre, a bola está conosco.
18 de julho de 2014
Vinicius Torres Freire, Folha de SP
O ANO QUE VEM será muito difícil para a economia brasileira, parece se tratar de quase um consenso. Curiosamente, a estimativa mediana de crescimento do PIB para 2015 é de 1,5%, muito fraquinho, decerto, mas superior ao 1% previsto para este 2014.
Dada a incerteza sobre qual será o próximo governo e o que será feito da política econômica, a previsão para o ano que vem não vale nem como ficção científica nível "C".
O resto do mundo, em especial as elites burocráticas do mundo rico, insiste porém que 2015 será enfim um ano, vá lá, bom. Ano de "volta à normalidade", medíocre que seja em termos de crescimento, e não importa que o couro dos mais pobres continue a ser esfolado nessa recuperação sempre mais ou menos frustrada, desde 2009. Vai rolar? A "retomada" euroamericana daria uma mãozinha ao Brasil?
Previa-se neste ano que os EUA crescessem 3%, excelente para um país tão rico. Deve crescer uns 2%, ainda ótimo, mas não é disso que se trata aqui. A Europa do euro sairia da recessão, crescendo pouco mais de 1%. Mas embica para pouco menos que isso.
No ano que vem, os Estados Unidos chegariam aos 3%, a eurozona iria a 1,5%, o Japão repetiria algo em torno de 1,7%, assim como a China repetiria seus 7,5%.
Nada mal. Nada muito bom, no que nos diz respeito. O efeito direto do crescimento da economia mundial no Brasil já é pequeno, pois o país negocia pouco com o exterior. A variação do PIB das economias maiores tende a fazer ainda menos efeito devido a problemas domésticos, brasileiros, e ao tipo de crescimento que virá no curto prazo.
Não haverá valorização anormal dos nossos produtos dominantes de exportação --comida e minério. Para piorar, a economia brasileira permanece inflacionada num mundo que, em parte, namora a deflação.
Ou seja, não vamos ganhar mercados em produtos manufaturados, pelo contrário. China e companhia avançam nos nossos clientes. Nossos custos altos e câmbio valorizado reduzem o interesse pelos nossos produtos (importamos mais, de resto). A Europa está com uma gigantesca sobra na capacidade de sua indústria (como não tem demanda lá, consumo, a Europa faz "xepa" dos seus produtos).
Pode-se argumentar que, pelo menos, pior do que agora não vai ficar. Pode ser, a princípio. Ainda há os riscos da transição.
Como se está cansado de saber, haverá mudança na política monetária americana (grosso modo, taxas de juros mais altas). Mudanças desse tipo sempre causaram algum tumulto financeiro mundial ou pelo menos efeitos colaterais em países mais frágeis (com inflação e déficit externo desconfortáveis).
Como se está cansado de especular, a crise europeia não acabou, por qualquer critério que se empregue, mas há o risco de aparecer outro entulho crítico, o de deflação.
Isto é o caso de uma economia tão fria, já com juro zero, com tanto desemprego de trabalho e de capital, com baixíssimo investimento e corte de gasto público, que passa a esfriar ainda mais.
Não quer dizer que estejamos fritos. Caso não sobrevenham tumultos financeiros maiores nos EUA e na Europa, o cenário externo tende a ser meio neutro. Como quase sempre, a bola está conosco.
18 de julho de 2014
Vinicius Torres Freire, Folha de SP
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