"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 18 de julho de 2014

BRICS ENGROSSAM A VOZ

Com banco e 'mini-FMI', grupo dá um passo para ir além da retórica na disputa de poder. Bom?

OS BRICS deixaram de ser mera conversa fiada desde ontem, quando criaram o Novo Banco de Desenvolvimento (NBD) e uma espécie de "mini-FMI", o Acordo de Reservas de Contingência.

Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul pingaram dinheiro na mesa a fim de dar alguma substância e marca política a sua ação conjunta, mas quase retórica, contra o predomínio americano e europeu.

Se isso vai resultar em algum benefício para o Brasil, são outros quinhentos. Mas o bonde andou.

O dinheiro é pouco. O capital inicial para valer do NBD é de US$ 10 bilhões. Com apenas esse capital, mas se comportando como um banco multilateral mais agressivo, o NBD pode emprestar uns US$ 40 bilhões em uma década. Em tese, o dinheiro vai para a infraestrutura de países ainda mais pobres que nós.

O BNDES, por exemplo, tem ativos de US$ 334 bilhões, mais que os US$ 324 bilhões do Banco Mundial.

O Banco de Desenvolvimento da China tem o equivalente a US$ 1,2 trilhão em empréstimos, um quarto disso, estima-se, em empréstimos externos --sim, a China vem alugando e comprando boa parte do mundo pobre.

Aliás, para a China tudo isso é troco. O que os chineses estão dizendo para o mundo rico é: "Olhem a minha turma, com o fortão aí do quintal de vocês (Brasil). E vai ficar ainda maior".

O capital pingado pelos Brics é troco perto das reservas internacionais desses países (dinheiro em moeda forte, "dólar", guardado como seguro). A China tem US$ 3,8 trilhões em reservas. A Rússia, US$ 467 bilhões. O Brasil, US$ 368 bilhões. A Índia, US$ 321 bilhões.

O "mini-FMI" dos Brics teria US$ 100 bilhões, um fundo que poderia ser parcialmente sacado em caso de crise de financiamento externo. Não é lá grande dinheiro para as economias dos Brics, com exceção da África do Sul. Na verdade, mesmo o FMI não tem fundos para lidar com o tamanho dos desastres financeiros mundiais.

Note-se de passagem certa ironia ridícula nisso de o governo do Brasil criar um banco para se ajudar em caso de problema financeiro que, em parte, esse governo mesmo cria.

Esse sisteminha financeiro Brics pode, claro, se transformar em seguro para outros países, tomando parte do lugar do FMI e Banco Mundial, dominados por EUA e Europa.

Os Brics dizem que as contrapartidas exigidas não seriam aquelas do FMI. No entanto, qualquer instituição financeira precisa receber seus empréstimos de volta e tem de exigir garantias. Como os Brics vão fazer essa "nova política" financeira?

É fato que o FMI demonstrou incompetência criminosa e terminal nas crises de 1997 a 2008. Cobrindo-se de ridículo atroz, o Fundo dizia que o mundo seguia risonho e franco até a coisa explodir nas suas fuças. Pior, as contrapartidas que o FMI exigia para "socorrer" países causaram dano econômico e desastres políticos e humanitários.

As crises causadas pela finança mundializada e bucaneira foram um dos fatores que levaram os países de fora do centro do mundo a acumular imensas reservas financeiras a fim de se defender do caos.

Com PIBs ainda maiores, Brics e outros blocos agora começam a partir para o ataque no jogo da política financeira mundial.

 
18 de julho de 2014
Vinicius Torres Freire, Folha de SP

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