Delicada - talvez seja esse o adjetivo mais adequado para qualificar a situação da Ucrânia. O país ainda sofre as acomodações ditadas pelo fim da União Soviética e a redistribuição de forças antes concentradas na potência comunista. Independente desde 1991, a república semipresidencial com divisão de poderes mantém laços estreitos com Moscou que vão além do fato de ser rota de gasodutos e abrigar base militar estratégica do Kremlin.
Um deles: a divisão da população. Parte significativa dos 44,6 milhões de ucranianos se sente russa em razão da nacionalidade dos antecedentes ou de anexações recentes. O outro: a dependência energética. Kiev compra de Moscou mais da metade do gás que utiliza. Essa fragilidade, aliás, foi determinante no afastamento da Ucrânia e da União Europeia (UE) - estopim da crise que eclodiu em novembro de 2013 e ameaça a unidade do país.
Estrangulado por profunda crise financeira, com reservas cambiais em colapso e o deficit público que abocanha quase 6% do PIB, o então presidente Victor Yanukovich recebeu de bom grado a proposta de Vladimir Putin - reduzir em um terço o preço do combustível vendido ao vizinho. Em troca, teria de dar prioridade às relações com a Rússia, fato que levou à recusa da assinatura de acordo com a UE.
Milhares de pessoas foram às ruas em protesto contra a decisão. O governo reagiu com violência. Em fevereiro, 82 pessoas morreram. O presidente deixou o poder, destituído pelo parlamento. Mas a instabilidade continuou. É que a Rússia e parte da população simpática a Moscou, especialmente da Crimeia, consideraram golpe a saída de Yanukovich.
A situação se agrava. Vladimir Putin obteve autorização do congresso para intervir na Ucrânia. O objetivo: proteger cidadãos e militares russos que trabalham em bases na região. O presidente interino da Ucrânia, Oleksander Turchinov, decretou a Ucrânia área de exclusão aérea e convocou reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU.
Vozes da comunidade internacional se fizeram ouvir. Barack Obama, com discurso que lembrou a guerra fria, acusou Putin de violar a lei internacional e o exortou a respeitar a integridade territorial ucraniana. O secretário de Estado americano, John Kerry, ameaçou retirar a Rússia do G8, o bloco dos países mais industrializados, caso o conflito continue. Autoridades da União Europeia manifestaram preocupação com a possibilidade de intervenção militar no país. Milhares de pessoas participam de atos em Kiev.
Há muitos interesses em jogo capazes de inflamar ainda mais os ânimos. O risco de guerra civil existe. A opção pelas armas, porém, deve ser descartada. Em vez de balas e mísseis, a munição da contenda tem de ser o diálogo. As partes, incluída a Rússia, devem sentar-se à mesa de negociações para levar a estabilidade ao país, o que inclui, necessariamente, a escolha de governo honesto, responsável e disposto a promover reformas. Eleições estão marcadas para maio.
04 de março de 2014
Editorial Correio Braziliense
Um deles: a divisão da população. Parte significativa dos 44,6 milhões de ucranianos se sente russa em razão da nacionalidade dos antecedentes ou de anexações recentes. O outro: a dependência energética. Kiev compra de Moscou mais da metade do gás que utiliza. Essa fragilidade, aliás, foi determinante no afastamento da Ucrânia e da União Europeia (UE) - estopim da crise que eclodiu em novembro de 2013 e ameaça a unidade do país.
Estrangulado por profunda crise financeira, com reservas cambiais em colapso e o deficit público que abocanha quase 6% do PIB, o então presidente Victor Yanukovich recebeu de bom grado a proposta de Vladimir Putin - reduzir em um terço o preço do combustível vendido ao vizinho. Em troca, teria de dar prioridade às relações com a Rússia, fato que levou à recusa da assinatura de acordo com a UE.
Milhares de pessoas foram às ruas em protesto contra a decisão. O governo reagiu com violência. Em fevereiro, 82 pessoas morreram. O presidente deixou o poder, destituído pelo parlamento. Mas a instabilidade continuou. É que a Rússia e parte da população simpática a Moscou, especialmente da Crimeia, consideraram golpe a saída de Yanukovich.
A situação se agrava. Vladimir Putin obteve autorização do congresso para intervir na Ucrânia. O objetivo: proteger cidadãos e militares russos que trabalham em bases na região. O presidente interino da Ucrânia, Oleksander Turchinov, decretou a Ucrânia área de exclusão aérea e convocou reunião de emergência do Conselho de Segurança da ONU.
Vozes da comunidade internacional se fizeram ouvir. Barack Obama, com discurso que lembrou a guerra fria, acusou Putin de violar a lei internacional e o exortou a respeitar a integridade territorial ucraniana. O secretário de Estado americano, John Kerry, ameaçou retirar a Rússia do G8, o bloco dos países mais industrializados, caso o conflito continue. Autoridades da União Europeia manifestaram preocupação com a possibilidade de intervenção militar no país. Milhares de pessoas participam de atos em Kiev.
Há muitos interesses em jogo capazes de inflamar ainda mais os ânimos. O risco de guerra civil existe. A opção pelas armas, porém, deve ser descartada. Em vez de balas e mísseis, a munição da contenda tem de ser o diálogo. As partes, incluída a Rússia, devem sentar-se à mesa de negociações para levar a estabilidade ao país, o que inclui, necessariamente, a escolha de governo honesto, responsável e disposto a promover reformas. Eleições estão marcadas para maio.
04 de março de 2014
Editorial Correio Braziliense
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