"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 14 de março de 2014

MAIS DUGUINISMO


 Artigos - Globalismo

Num post publicado esta semana na sua página do Facebook, o prof. Alexandre Duguin afirma: “Os americanos estão nas mãos de um grupo de terroristas extremistas. Estes não são verdadeiros americanos. Eles não compartilham dos reais e profundos valores americanos. Eles sacrificam a América aos interesses de uma oligarquia financeira internacional e global.”


É no mínimo estranho que ele agora diga isso, pois essa foi precisamente a tese que defendi no debate que tive com ele, e contra a qual ele esperneou o quanto pôde, insistindo na balela de que o globalismo é a expressão do interesse nacional americano.

O livro que transcreve o debate na íntegra levou o título de Os EUA e a Nova Ordem Mundial (Vide Editorial, 2012), precisamente porque esse era o ponto crucial da nossa divergência: a Nova Ordem Mundial é o poderio americano expandindo-se para dominar o mundo ou é, ao contrário, uma estratégia para demolir a nação americana e subjugá-la aos seus principais inimigos?

Ao ver finalmente a luz, o prof. Duguin poderia ao menos ter tido a gentileza de reconhecer que não a enxergou por iniciativa própria, mas que foi levado a isso a contragosto, pelas razões mais fortes do seu adversário.

Mas ele teve motivos bem sérios para infringir tão patentemente as regras da concorrência intelectual. Ao contrário deste articulista, o prof. Duguin não é um escritor independente,  empenhado tão-somente em tentar orientar-se na confusão do mundo. É um ideólogo e um líder, o condutor de um movimento político mundial apoiado e subsidiado pelo governo russo. O objetivo desse movimento é declaradamente destruir a aliança EUA-Inglaterra-Israel e impor o domínio russo a todo o planeta, sob as vestes de um hipotético e simbólico “Império Eurasiano”.

É por isso que o prof. Duguin, ao endossar finalmente as palavras de que discordava, não pode confessar de quem as ouviu. Se o fizesse, teria de lhes dar o sentido que tinham na emissão originária. Mas, em vez disso, ele quer usá-las para os seus próprios fins, que continuam incompatíveis com as convicções do seu adversário. Noutros termos: se não conseguiu derrotar o oponente, vai tentar tirar proveito da vitória deste, fingindo que foi sua própria.

Para isso ele tira, das palavras que repete, uma conclusão que, parecendo imitar, na verdade inverte a que elas impunham originalmente. As forças anti-americanas que dominam a América, prossegue ele, “subsidiam o wahabbismo, o terrorismo, Israel, os neonazistas ucranianos e os trotsquistas”.
Vamos por partes.

(1) Wahabbis são a classe dominante da Arábia Saudita. Ninguém os subsidia. Eles é que subsidiaram a carreira de Barack Hussein Obama, compraram boa parte da grande mídia norte-americana e hoje são praticamente os donos de metade da cidade de Nova York. É o presidente americano que se prosterna ante o rei saudita, e não ao inverso. Os Wahabbis são parte integrante da elite anti-americana que hoje persegue e marginaliza os cristãos e favorece a ascensão islâmica por todos os meios possíveis e imagináveis.

(2) É verdade que essa elite financia os trotsquistas, mas não só eles: financia toda sorte de movimentos esquerdistas e anti-americanos, inclusive aqueles que o “eurasianismo” procura agora seduzir para disputar com os globalistas quem destrói mais depressa os EUA.

(3) Também é verdade que a elite globalista financia movimentos terroristas, mas entre estes se incluem aqueles que têm excelentes relações com a Rússia, como por exemplo o Hamas.  Onde quer que se prenda um terrorista islâmico, ele tem invariavelmente na mão uma arma russa, às vezes chinesa.

(4) Os americanos obviamente apóiam a rebelião ucraniana, mas até agora não surgiu nenhuma prova razoável de que os tais “grupos neonazistas” tenham sido criados ou subsidiados pela CIA. Ao contrário, criar esses grupos, infiltrá-los em nações adversárias e em seguida choramingar que só está se defendendo contra uma agressão nazista é uma velha e clássica especialidade da KGB e dos serviços secretos dos antigos “países satélites”. O tempo dirá de onde surgiram os neonazistas ucranianos. Por enquanto, o que não faz sentido é acreditar, a priori, na propaganda russa.
 
(5) E Israel? Nos EUA até as crianças sabem que a política globalista da dupla Obama-Kerry é isolar Israel e dar mão forte aos palestinos. Quem luta para restaurar a aliança EUA-Israel são justamente os cristãos conservadores apegados aos “reais e profundos valores americanos”, hoje tão achincalhados pelo establishment.
 
Em suma: na sua luta pelo domínio do mundo, os globalistas ocidentais e o “Império Eurasiano” estão de pleno acordo num ponto: querem tirar do caminho a América e Israel.
 
Para o apóstolo do eurasianismo, dá na mesma fazer isso culpando a nação americana pelos desvarios dos globalistas que a exploram, ou, ao contrário, fingir protegê-la deles para com isso jogá-la contra Israel.
 
***
Talvez não seja coincidência: ao mesmo tempo que o prof. Duguin usurpa minhas palavras para lhes dar um uso que não aprovo, devotos duguinistas se empenham numa campanha insana de “character assassination”, contra mim, alardeando, no site de um tal “Institute for Eurasian Studies”, que sou um perigosíssimo “agente islamo-sionista-maçom” (alguém pode me dizer o que é isso?), empenhado em destruir a Igreja Católica e “fomentar uma guerra civil no Brasil”. A melhor coisa a fazer comigo, concluem singelamente, seria condenar-me à morte por “crime de sedição e lesa-pátria”...

14 de março de 2014
Olavo de Carvalho

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