Rolezinho não é fenômeno político ou social, não é novidade. É um modismo da estação selvagem
Que me perdoem a ministra sem-noção, os policiais truculentos, os sem-teto oportunistas, os lojistas apavorados, os esquerdistas e os fascistas, que tal baixar a bola e parar com a histeria? Antes que realmente se dê motivo para vandalismo?
Um rolezão estava programado para este domingo no Shopping Leblon, no Rio de Janeiro, mas foi proibido por uma juíza. Oito mil jovens tinham confirmado pelas redes sociais que iriam a esse centro comercial de luxo, num dos metros quadrados mais caros do Brasil.
Eles curtem grifes, zoação, funk e beijaços. E detestam política (não há como culpá-los, não é, Roseana e Renan, a dupla caipira RR?). Pardos e mestiços, como a maioria dos brasileiros, e não brancos ou negros, eles parecem clones do Neymar sem brincos de brilhante.
Detesto shopping e multidão. Abomino a ânsia do consumo. Prefiro as ruas, mesmo com pedrinhas portuguesas. Entendo quem goste de shopping, e são consumidores de todas as classes sociais – especialmente em tempos de liquidação. Não dou rolezinho em shopping. Não como em shopping. Quando vou a um cinema ou teatro em shopping, subo de elevador para não rolar pelos corredores de vitrines, escadas rolantes e praças de alimentação. Minha praça é outra, tem árvore, vento, flores e banquinhos, seja no Rio, Londres ou Paris. Mais na Europa, admito, porque as praças brasileiras são maltratadas pelos prefeitos e pela população.
Evitar shoppings não me livra do rolezão do verão. As grandes cidades, especialmente as litorâneas, se tornam palco de um imenso rolezão – festivo ou agressivo – quando as temperaturas alcançam 40 graus e o Carnaval se aproxima. Quem viu as fotos do mar e da areia em Ipanema nos últimos fins de semana, quem testemunhou os arrastões... Quem caminha ou vai à praia no Rio na estação selvagem é personagem do rolezão. Está no calendário. Acontece antes de os blocos carnavalescos assaltarem (no bom sentido) as ruas e avenidas cariocas. Estamos todos misturados. Favelados, periféricos, suburbanos, playboys, peruas, gostosos, gostosas, atletas, atores, artistas, idosos, bebês.
Corre-corre dá medo? Dá, muito. Quando passo por um grupo grande e barulhento de pivetes, guardo meu iPhone. Preconceito ou realismo? Neste verão sem policiamento ostensivo (os policiais estão todos nas UPPs), o que tem de garoto roubando o celular direto do seu ouvido, no meio da conversa, seja você gringo ou local... Recordo um filme colombiano de 2000, La virgen de los sicarios (A virgem dos assassinos), baseado no romance homônimo de Fernando Vallejo. O filme, com roteiro do escritor, retrata sua cidade natal, Medellín, tomada por furtos e assaltos de adolescentes.
Nos rolezinhos dos shoppings, está cheio de gente mal-educada? Está. Acontece em todo lugar e com todas as classes sociais. Dos riquinhos e fortinhos aos pobrinhos e magrinhos, dos héteros aos gays, dos ambulantes aos quiosqueiros, dos flanelinhas aos motoristas de ônibus e de possantes. Como o brasileiro, em geral, é mal-educado! Socorro. Confunde extroversão com barulho. Espaço público de convívio social significa “espaço onde só se conversa aos gritos” e onde gente fura fila sempre que pode.
Não me venham classificar rolezinho como fenômeno político ou social... Ou, pior, como alguma “novidade”, positiva ou negativa. Enxergo como mais um factoide de verão abaixo do Equador, igual a tantos outros. Como o toplessaço que não colou por preconceito. Quanta hipocrisia numa sociedade hipersexualizada de bunda de fora.
A bagunça mudou de cenário porque está quente do lado de fora e, nos shoppings, o ar-condicionado funciona. Eles vão lá se divertir, “catar mulher”, provocar, conseguir seus 15 minutos de fama, fugir de policial, beijar como nos blocos. Não deram a sorte de entrar na casa do BBB. Recusam-se a ser eliminados. Torcem para o circo pegar fogo e, assim, aparecer na televisão, na primeira página dos jornais e na capa das revistas.
Anônimos e invisíveis, ganham aura de black bloc, experimentam o poder de arregimentar multidões nas redes sociais. Causam furor, torcidas pró e contra. Nunca sonharam tão alto. Só mesmo num país em que a ministra da Igualdade Racial, Luiza Bairros, incita ao racismo, dizendo que os problemas com os rolezinhos são “derivados da reação de pessoas brancas”. Santa ignorância. A escola é do Lula. Ele disse em 2009 que a crise era causada por “gente branca de olhos azuis”.
Os jovens dos rolezões são ajudados pela burrice dos policiais, prefeitos e governadores, que os transformam em mitos e inflam seus egos. Bombas de gás? Multa de R$ 10 mil? Se os policiais fardados são incapazes de evitar furtos de um bando de moleques sem apelar para a brutalidade ou a ignorância, estão eliminados do BBB – deu para entender, brothers?
19 de janeiro de 2014
Ruth de Aquino, Revista Época
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