"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 19 de janeiro de 2014

O NINHO VAZIO

 

Uma amiga está triste porque sua filha se mudou para Nova York. Foi estudar na Universidade Columbia e não deve voltar tão cedo. O filho mais velho, também há pouco, foi trabalhar em outra cidade. Os dois moravam com ela. De repente, minha amiga ficou sozinha em casa. Está passando pela “síndrome do ninho vazio”, uma figura da psicologia para definir a depressão que se apossa de alguns pais –ou, quase sempre, mães– quando seus filhos vão à vida.
 
Passarinho 1
LOLA&LOLITA
Estava pensando nisso quando, pouco antes do Natal, percebi certos movimentos alados no terraço. Uma rolinha ia e vinha, com matinhos no bico, e pousava numa viga alta do caramanchão. Mesmo à distância, constatei que estava construindo um ninho. No Natal, o ninho ficou pronto. Ela sossegou e sentou-se nele pelos dias seguintes. Batizei-a de Lola, a Rola, e saboreei a expectativa de, em breve, ser avô.
 
Não entendo de passarinhos, mas calculei que, por sua circunspecção no ninho, Lola devia estar sentada sobre três ou quatro ovos –e, se assim fosse, merecia respeito pelo que lhe devia ter custado botá-los para fora. Mas Silvania, minha funcionária, aproveitou-se da temporária ausência de Lola –numa das poucas vezes em que ela saiu, certamente para ir às compras–, subiu a um banquinho, espiou o conteúdo do ninho e me informou de que eu era avô de um único ovo.
 
Bem, não sejamos soberbos, um já estava bom. Dias depois, constatamos que, em certos momentos, o rabo e a cabecinha para fora do ninho eram menores. O bebê nascera. Dei-lhe o nome de Lolita, a Rolita, e esperei que ela e sua mãe nos brindassem com algumas piruetas, mesmo desajeitadas, como parte do aprendizado aéreo de Lolita.
Que nada. Ontem, Lola, a Rola, e Lolita, a Rolita, foram embora bem cedo. E sem se despedir. Agora entendo a síndrome do ninho vazio.
 
Interligne 18b
 
Ruy Castro (1948-) é escritor e jornalista. O texto acima transcrito foi publicado pela Folha de São Paulo em 17 jan° 2014.
in Brasil de longe

Nenhum comentário:

Postar um comentário